terça-feira, 17 de março de 2020

País deveria estudar corredor estratégico em SP, porta de entrada e saída do agro, FSP

Agronegócio foi responsável por US$ 97 bilhões, ou 43%, das exportações em 2019

avanço do coronavírus pelo país terá um efeito muito forte sobre o agronegócio. Diferentemente de países como a China, que tem produtos industriais e não perecíveis para pôr no mercado externo, o Brasil dispõe de alimentos.

O governo e o setor do agronegócio têm de se preparar para um eventual avanço descontrolado do vírus, o que exigiria medidas draconianas, como já estão sendo sugeridas por alguns especialistas.

É melhor se prevenir, montando estratégias, do que aguardar. A China inicialmente isolou completamente algumas regiões do país.A morte dos animais, que não recebiam os insumos para a ração, e a necessidade humana por alimentos forçaram o país a criar corredores estratégicos.
A Tecnoshow Comigo, uma das principais feiras agrícolas do país, está suspensa devido à pandemia - Divulgação
É nesse sentido que o Brasil deveria começar a agir para estar pronto em caso de um agravamento da doença.
O agronegócio foi responsável por US$ 97 bilhões das exportações em 2019, o que representou 43% das divisas obtidas pelo Brasil no ano.
Tomando como base os principais produtos, o setor agropecuário movimentará R$ 683 bilhões dentro das porteiras neste ano, segundo o Ministério da Agricultura. No setor de lavouras, serão R$ 448 bilhões. No de pecuária, R$ 235 bilhões.
A circulação dessas mercadorias produzidas no país é importante. O principal parceiro comercial do Brasil, a China, já tem um impacto menor do vírus e eleva a demanda por alimentos. As exportações brasileiras de soja, mesmo com o acordo China e EUA, estão aceleradas neste início de ano.
O ritmo é intenso também nas vendas de proteínas. Os chineses estão importando volumes próximos aos de dezembro, um mês histórico para indústria nacional exportadora. É o que mostram os dados da Secex desta segunda-feira (16).
Leve-se em consideração apenas o caso do principal produtor brasileiro de grãos e de carne: Mato Grosso.
Um eventual fechamento das fronteiras de São Paulo, por exemplo, o estado mais afetado pelo coronavírus no momento, deixaria produtores mato-grossenses isolados, se não houver um corredor estratégico de passagem.
A importância de Mato Grosso é grande no cenário nacional, mas a de São Paulo não é menos importante. O estado é a porta de saída e de entrada do agronegócio brasileiro e um dos principias consumidores.
Em 2019, 41% dos 20 milhões de toneladas de soja exportados por Mato Grosso saíram pelo porto de Santos. Parte, embora pequena, saiu por portos do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, rotas que teriam também uma passagem por São Paulo.
Uma eventual dificuldade no escoamento de grãos por São Paulo traria uma situação dramática para os mato-grossenses. Não há armazéns suficientes para guardar a soja, principalmente em um momento em que está chegando o milho safrinha.
Serão colhidos 32 milhões de toneladas do cereal no estado. Em 2019, saíram de Mato Grosso 24 milhões de toneladas.
Maior produtor de carne do país, o estado também teria dificuldades para escoar suas proteínas, caso haja um agravamento da doença e a necessidade de medidas drásticas nas comunicações entre os estados.
Neste ano, 93% das exportações de carne bovina de Mato Grosso passaram pelo Sudeste e pelo Sul. Os problemas, porém, não se restringiriam às exportações, mas também às importações de adubo, de insumos químicos e até de trigo, produtos que, em grande parte, entram por São Paulo.
Este é o período de menor entrega de adubos pelas indústrias. O ritmo começa a acelerar a partir de junho. Um atraso na entrega, porém, mesmo em pequena quantidade, colocaria as indústrias em dificuldade. Elas não têm armazéns para estocar o produto.
A ministra da Agricultura, Teresa Cristina, diz que "não está no horizonte serem fechadas as fronteiras paulistas. Não há projeto para isso". O assunto coronavírus, porém, é assunto diário no ministério.
Segundo ela, foi montado um gabinete de acompanhamento, que se atualiza sobre as novas ocorrências diariamente. Uma das preocupações é o monitoramento do abastecimento no país. O ministério está em contato com centrais de abastecimento e supermercados continuamente.
Neste momento, não há risco de desabastecimento, afirma ela.
"Alguns efeitos o coronavírus trará ao país, como mostram as ocorrências no resto do mundo, mas não há motivo para pânico, e o agronegócio vai bem." Os preços não caíram, e as exportações do setor, principalmente as destinadas à China, voltaram ao normal, afirma a ministra.
Vaivém das Commodities
A coluna é assinada pelo jornalista Mauro Zafalon, formado em jornalismo e ciências sociais, com MBA em derivativos na USP.

Joel Pinheiro da Fonseca- Chega! É hora de pensar em impeachment, FSP

Alguma chave virou em mim na semana passada, dia 9 de março, quando Bolsonaro afirmou ter provas de que a eleição que o elegeu teria sido fraudada. Até então, eu era contra sequer pensar em impeachment, apesar das muitas afrontas à democracia.
Afinal, o custo do impeachment para o país é muito alto. Além disso, com cerca de 30% de popularidade, trata-se na melhor das hipóteses de um sonho distante e, portanto, irrelevante. Mas ali, naquele momento, com a acusação grave e mentirosa à Justiça Eleitoral, algo deveria ter sido feito. Foi, para mim, a gota d’água. O copo transbordou.
Desde então, as indignidades de Bolsonaro só aumentaram: ele não só promoveu como participou de um protesto que pedia fechamento do Congresso e um novo AI-5, no meio de uma epidemia grave da qual ele é potencial vetor. Com seu mau exemplo, ainda desautorizou o trabalho competente do ministro da Saúde. Bolsonaro não só ataca a democracia como é um risco à saúde pública.
Bolsonaro próximo a manifestantes pró-governo em Brasília, no domingo (15), em transmissão pelo Facebook
Bolsonaro próximo a manifestantes pró-governo em Brasília, no domingo (15), em transmissão pelo Facebook - Reprodução
Para tirar fotos junto a fanáticos ignorantes, ele vai sorridente. Quando o dever chama, no entanto, Bolsonaro foge. Ausentou-se de videoconferência com líderes de países sul-americanos para discutir medidas de combate ao vírus. Se já fomos liderança continental, hoje estamos atrasados em relação aos nossos vizinhos.
Tampouco fez falta à reunião entre Maia, Alcolumbre, Mandetta, ministros do Supremo e outras autoridades. Não demonstra saber nada e nos faz passar vergonha perante o mundo. Para que serve o presidente?
Para piorar, há evidências preocupantes de que Bolsonaro acredita que a Covid-19 seja um plano chinês para prejudicar o Ocidente. Teorias da conspiração e pseudociência estão no posto mais alto da República. (Caso alguém tenha alguma suspeita: até agora, o saldo da Covid-19 para a China são 5 milhões de desempregados e redução brutal do consumo e das projeções para o PIB de 2020. Não é “histeria”.)
A confusão criada pelo presidente e seu entorno é tamanha que não temos sequer a resposta a uma pergunta simples e crucial: Bolsonaro está ou não está infectado pelo coronavírus?
Não é à toa que vozes públicas, outrora apoiadoras, estejam se arrependendo publicamente. É o caso de Francisco Razzo, filósofo conservador, em artigo para a Gazeta do Povo (“Por que me arrependo de ter votado em Bolsonaro”, 11/03). E também de Janaina Paschoal, em discurso nesta segunda-feira (16) na Assembleia Legislativa de São Paulo. No caso, ela não só se diz arrependida do apoio dado como defende o impeachment, no que tem razão.
É impossível derrubar um presidente ainda popular. A resistência seria grande demais. Além disso, o momento de crise pede toda a atenção do setor público. Não podemos nos dar ao luxo de paralisar a política por meses em meio à crise do coronavírus. Assim, por enquanto, o melhor é deixar o presidente esquecido, isolado, enquanto os adultos do Congresso e de alguns ministérios trabalham.
Ao final da crise, no entanto, caso a popularidade de Bolsonaro tenha caído devido aos problemas econômicos e à sua incompetência, que o Congresso faça logo seu trabalho.
Os crimes de responsabilidade se acumulam, com gravidade cada vez maior. As ilegalidades, as mentiras, os ataques, as indignidades, o caos, o golpismo, a covardia e a falta de liderança só vão piorar. O atual presidente é indigno do cargo, afronta nossas leis e coloca o país em risco. O Brasil é maior que Bolsonaro.
Joel Pinheiro da Fonseca
Economista, mestre em filosofia pela USP.