domingo, 9 de fevereiro de 2020

Instalação de sistema solar em telhados triplica no Brasil em 2019, FSP

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SÃO PAULO
​​A instalação de sistemas de produção de energia pela luz do sol nos telhados brasileiros triplicou em 2019 em relação ao ano anterior segundo dados da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica).
Enquanto, em 2018, foram acrescidas 30 mil instalações nas próprias unidades consumidoras do sistema elétrico brasileiro, em 2019 esse número chegou a 95,3 mil. Com esses novos equipamentos, hoje no país funcionam 145,3 mil estruturas que produzem a própria energia por meio da GD (geração distribuída) fotovoltaica.
O número é referente apenas à produção local de energia solar (quando a geração é próxima ao lugar de consumo). Ao analisar toda a GD, incluindo a produção compartilhada e remota, o total de instalações feitas só no ano passado chega a 113,2 mil. Se somar tudo que há em funcionamento no país de energia solar pela geração distribuída, independente do ano de instalação, chega-se ao total de 171 mil sistemas.
Para Rodrigo Sauaia, presidente da Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica), o aumento de informações sobre o assunto, o preço mais baixo e o peso da conta de luz impulsionaram esse avanço.
"Reajustes pesados que fazem com que a conta de luz fique cada vez mais cara, a tecnologia se tornando mais acessível e o consumidor tendo mais familiaridade com o que é a energia solar fotovoltaica têm ajudado as pessoas a decidirem por adotar [esse tipo de sistema]", disse.
Apesar do crescimento no ano passado, ele afirmou que o número ainda é muito pequeno, indicando a incipiência do país em relação à geração de energia solar.

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"Hoje todo o mercado tem 84,8 milhões de unidades consumidoras. Esse é o nosso potencial, número máximo de unidades que poderiam gerar sua própria energia. Então 171 mil é 0,2% disso, o que quer dizer que a ainda nem começamos", disse.
Sauaia compara o peso da produção de energia fotovoltaica brasileira a de outros países quando apresenta esse número. Segundo ele, enquanto o Brasil tem aproximadamente 2,4 GW de capacidade instalada (somando geração nas casas, fazendas e também grandes usinas solares), países menos populosos e menores, como Japão e Alemanha, têm algo em torno de 56 GW e 45 GW, respectivamente.
Dados do instituto Fraunhofer ISE mostram que hoje, na Alemanha, há 1,7 milhões de estruturas de geração fotovoltaica instaladas por lá. Dessas, 1 milhão são referentes a pequenos arranjos solares feitos em residências.
"Mesmo que tenhamos avançado, se nos compararmos a esses outros países, o Brasil está uma década atrasado", afirmou o chefe da Absolar.
Por ainda ter um grande potencial de crescimento, Sauaia defende postergar mudanças nos incentivos dados a quem produz eletricidade por meio da luz solar no país. Para ele, a proposta da Aneel em alterar as regras das tarifas pode inviabilizar a expansão do segmento.
"Felizmente a regra está funcionando e está ajudando o Brasil a desenvolver [energia fotovoltaica]. Será que efetivamente é uma boa ideia mexer nisso agora, antes de o Brasil se tornar um país mais desenvolvido na energia solar? Será que não haverá um retrocesso?"
O diretor do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura), Adriano Pires, diz enxergar de outro modo. Para ele, "manter esse subsídio é que não faz sentido". Na sua avaliação, o Brasil, além de já contar com uma forte presença de fontes renováveis em sua matriz elétrica, não pode ser comparado com países de renda elevada.
"Temos que nos preocupar com saúde, segurança pública e educação. A matriz brasileira já é uma das mais limpas do mundo. Então tem que ter cuidado. Por que dar subsídio à energia solar, e não a outro setor da economia, em uma país com o nível de renda como o nosso?"
Ainda de acordo com dados do Fraunhofer ISE, hoje 47,3% da matriz elétrica da Alemanha é composta por energia renovável. No Brasil, dados do governo apontam para algo em torno de 83%.
Para além da discussão de tarifas, há a preocupação com os impactos que o crescimento da energia solar fotovoltaica pode trazer à matriz elétrica devido a sua geração variável.
Mesmo reconhecendo a importância do incentivo a uma energia limpa como a solar, Rodolfo Gomes, pesquisador do IEI Brasil (International Energy Initiative), disse que é preciso reconhecer suas limitações.
Ele lembra que esse tipo de geração é intermitente, uma vez que há produção durante o dia, quando há luz do sol, mas que é interrompida à noite. Na sua avaliação, isso pode trazer impactos ao sistema elétrico brasileiro.
"A medida que o sol vai se pondo, esses sistemas fotovoltaicos vão gerar naturalmente menos energia. A partir de então o consumo desses lugares vai puxar mais energia da rede, em um aumento muito rápido", disse.
"Para atender esse consumo crescente, vamos precisar de usinas que tenham uma flexibilidade de operação. Normalmente são as térmicas que conseguem atender essa demanda nessa velocidade."
Na avaliação de Rodrigo Pinto, pesquisador da Universidade da Califórnia, o cenário é outro. Ele disse não ver problema na baixa geração à noite, porque nesse período o consumo é menor, portanto, não haveria uma sobrecarga do sistema.
Além disso, para ele, o país ainda está longe de ter uma matriz elétrica com grande participação da energia solar, ao ponto de isso impactar sua estrutura em períodos sem sol. Quando esse momento chegar, o valor das baterias de armazenamento de energia será muito menor, afirmou o pesquisador.
"Até isso [de não ter energia à noite] ser um problema, o preço da bateria para armazenar energia em casa vai estar tão baixo, que o equipamento de geração distribuída já vai vir embutido com ela."

Vinicius Torres Freire A gasolina e o dólar estão caros?, FSP

País está mais pobre do que em 2010, mas certos preços apenas estão no lugar

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“Devolve meu dólar a R$ 1,99.” Houve gente que foi às ruas pedir a cabeça de Dilma Rousseff carregando cartazes que criticavam a desvalorização do real, alguns por chacota, outros a sério. Nas manifestações finais a favor do impeachment, o dólar andava pela casa dos R$ 3,50.
A cada vez que o real cai da escada, como agora, a chacota muda de lado. As fotos dos manifestantes de amarelo se tornam objeto de ridículo e de memes que escarnecem também do governo, antes de Michel Temer, agora de Jair Bolsonaro. 
O povo ainda faz troça de Eduardo Bolsonaro, republicando o tuíte em que o filho 03 recomendava “Não compre dólar agora!” em 14 de abril de 2016 (o dólar custava R$ 3,51).
É a conversa comum sobre economia no mundo real das redes sociais, feita de ódio ou deboche do preço do tomate, do bife, da gasolina ou do dólar. Graças à demagogia agressiva de Bolsonaro, os combustíveis voltaram a ser motivo de “tretas”, piadas e ódios.
A gasolina está cara? Flutua em torno da média de R$ 4,41 desde janeiro de 2018. Custava R$ 4,58 na última semana de janeiro, segundo pesquisa semanal da Agência Nacional do Petróleo (esses valores são médias nacionais). Subiu uns 5% em um ano, um pouco mais do que os salários.
O salto grande de preços mais recente ocorreu no final de 2017. Em três anos, a gasolina subiu 23%; o salário médio, 14%. A inflação média foi de uns 11%. Na percepção e no bolso do povo mediano, a gasolina está cara.
O dólar está caro? Embora uma variação abrupta do preço da moeda americana possa ser importante, é tristemente tolo dizer que o dólar “bate recordes”, como a gente lê por aí (dizer que o recorde é “nominal” apenas lambuza a tolice de ridículo).
Feitas as contas relevantes, em termos reais o dólar está onde esteve entre mais ou menos 2007 e 2009 (para ser específico, trata-se aqui de taxas de câmbio real). Entre 2010 e 2014, a moeda brasileira ficaria loucamente forte, em parte por causa da política econômica dos países centrais em crise braba, em parte devido às barbaridades da política econômica brasileira. 
Foi a época do Bolsa Miami (gastos no exterior) e de alguma farra de importados. Foi também uma paulada extra na indústria brasileira, que desde 2010 parou de crescer.
O dólar nominal de janeiro de 2020 ficou 11% mais caro que o de um ano antes (30% em relação a janeiro de 2018). Suscita uma sensação de empobrecimento, em parte correta, embora de um ano para cá os gastos dos brasileiros em viagens no exterior tenham ficado praticamente na mesma. 
O preço dos combustíveis, claro, sobe também com a alta do dólar. No entanto, essa desvalorização recente do real não buliu com a inflação geral, convém notar.
E daí? Por qualquer critério, estamos na média mais pobres do que em 2010: neste país já caro (de tão ineficiente), a crise aumentou a penúria, óbvio. Quanto a esses preços que causam celeuma, há mais realismo, é duro dizer, é duro ouvir. 
Não há subsídio disfarçado no preço dos combustíveis. O dólar desvalorizado resulta de gasto público e inflação mais controlados, que contribuem para reduzir a taxa de juros (além da estagnação econômica).Bulir com esses preços, com tabelamentos e subsídios, não vai resolver nosso problema, apenas criar outros, como se fez em particular entre 2011 e 2014. Não resolve a falta de crescimento e de investimento, o emprego precário. É demagogia ou burrice ou as duas coisas.
 
Vinicius Torres Freire
Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).