domingo, 9 de fevereiro de 2020

Marcos Lisboa A ver navios, FSP

Lenta recuperação econômica surpreende esquerda e direita

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A lenta recuperação da economia surpreende a esquerda e a direita. Um lado acreditava que sem a expansão dos gastos públicos não haveria retomada da atividade e do emprego. O governo afirmava que bastaria aprovar a reforma da Previdência para o país ser inundado por mais de U$ 100 bilhões em investimento estrangeiro e a economia voltar a crescer vigorosamente.
Ambos estavam errados.
A reforma da Previdência foi aprovada há mais de três meses, bem antes da crise na China, e não houve o propagado aumento de investimento estrangeiro.
Na contramão da crença à esquerda, o ajuste fiscal permitiu a continuação da queda da taxa de juros, iniciada no governo Temer, e o fim da grave recessão construída pela gestão Dilma. O resultado é a retomada, ainda que titubeante, da economia.
Para frustração da direita, a política econômica, até agora, apenas reduziu a taxa de crescimento da despesa do governo, porém foi insuficiente para zerar o déficit primário, como prometeram alguns em momentos de euforia.
A austeridade não é um dogma dos economistas liberais. A expansão do gasto público pode auxiliar a economia, mas não quando o crescimento da dívida ameaça sair de controle.
O ministro da Economia, Paulo Guedes - Divulgação/ME
A sutiliza dos remédios que devem ser administrados em doses certas e nas circunstâncias adequadas parece surpreender os viúvos do PT, que preferem tratar temas de política econômica como um jogo de futebol, em que alguns sempre defendem o ajuste fiscal, enquanto outros bradam a relevância da intervenção estatal.
Curiosamente, esquerda e direita igualmente superestimam a importância da taxa de juros e parecem ignorar a relevância do ambiente de negócios para o crescimento sustentado.
Enquanto isso, o Brasil continua a afastar os investidores em razão da incerteza sobre a política para o meio ambiente, das frequentes alterações nas normas tributárias, das fragilidades do marco regulatório e da insegurança jurídica, incluindo um Supremo que parece não saber bem o seu papel em uma democracia.
Em meio à balbúrdia, fica preservada a burocracia desnecessária construída pela gestão petista, como a PPSA, empresa estatal criada para fazer a gestão dos contratos de partilha em que a Petrobras entrega barris de petróleo ao Tesouro em troca da exploração do pré-sal.
Não seria mais fácil, e barato, a Petrobras simplesmente pagar em dinheiro?
O governo, em vez de extinguir a PPSA, aprovou recentemente a capitalização de outra estatal para construir navios, a Emgepron, além de ter decepcionado quem esperava uma agenda relevante de privatizações.
Pelo andar da carruagem, a agenda liberal está a ver navios no Brasil.
Marcos Lisboa
Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005) e doutor em economia.
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Hélio Schwartsman Nunca é o bastante, FSP

O cérebro do adolescente é mais vulnerável às drogas que o do adulto

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O primeiro porre foi aos 13 anos, e depois vieram a maconha, a cocaína e várias outras drogas —diariamente e em quantidades industriais. Abandonou a escola, afastou-se da família e viveu nas ruas.
Essa é a história de Judith Grisel. Como 90% das pessoas com um currículo semelhante, ela poderia ter se dado mal, isto é, não ter conseguido manter-se longe de drogas por períodos significativos e ter morrido precocemente.
A história de Grisel, contudo, não é típica. Aos 23, ela largou as drogas, retomou os estudos e se tornou neurocientista, especializando-se em dependência química. Após décadas de sobriedade e uma bela carreira acadêmica, publicou "Never Enough" (nunca é o bastante), uma interessante combinação de livro de memórias e de ciência.
A mensagem de Grisel para os que sonham com um tratamento eficaz contra o vício não é das mais otimistas, já que, para ela, a dependência é apenas o resultado do funcionamento normal do cérebro. O conceito-chave é o de homeostase. O cérebro responde a estímulos ambientais desencadeando processos que visam ao equilíbrio. Se uma substância que nos deixa muito excitados é introduzida, o cérebro liberará neurotransmissores que derrubam essa excitação.
O processo compensatório tende a ser mais robusto que o estímulo, de modo que são necessárias doses cada vez maiores para obter o mesmo efeito da droga (tolerância). Pior, se a dose não vem, o corpo sente os efeitos desagradáveis provocados pelo processo compensatório (abstinência). E, como o cérebro é essencialmente um órgão antecipatório, bastam pequenos sinais associados ao uso da droga para produzir a fissura (craving).
O que faz com que algumas pessoas se tornem dependentes e outras não é um complexo "blend" de predisposições genéticas e fatores ambientais, com destaque para a exposição precoce. O cérebro de adolescentes é bem mais vulnerável que o de adultos.
Hélio Schwartsman