quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Reforma administrativa ou do Estado?, FSP

Quando o governo abriu mão de executar serviços, produziu resultados muito melhores

Acho ótimo que o governo e o Congresso coloquem em pauta a reforma administrativa. Nosso setor público quebrou. O governo deve investir 0,3% do PIB no ano que vem, e as despesas obrigatórias engessam 94% do Orçamento federal. E há um problema de qualidade nos serviços públicos, cuja conta é paga pelos mais pobres.
O Brasil andou na contramão nos anos 1980. Enquanto o mundo tratava de ajustar o Estado à globalização e modernizar a gestão pública, o Brasil apostou em um super Estado burocrático na Constituição de 1988. Oferecemos estabilidade rígida no emprego para os servidores, misturamos carreiras de Estado com carreiras comuns do serviço público, criamos a lei das licitações, engessamos os orçamentos e eliminamos qualquer espaço para a meritocracia na área pública.
Criamos um Estado competente para administrar amplos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família e o BPC, mas cronicamente incapaz de gerenciar uma escola ou um posto de saúde.
O resultado é conhecido. A classe média tratou de fugir dos serviços públicos e migrou para o setor privado. Escola particular, saúde e previdência privadas. Os mais pobres ficaram reféns do Estado e sua tragédia. Nas filas do SUS, na escola que não funciona. E não raro nas unidades socioeducativas, quando tudo dá errado.
O Estado, que era para produzir equidade, produziu o oposto: aumentou ainda mais o fosso da nossa desigualdade. Não porque “concentrou renda”, como anda na moda discursar, mas pela incapacidade de garantir oportunidades básicas minimamente iguais para todos.
Nos anos 1990, ensaiamos um ciclo virtuoso de reforma do Estado. Surgiu a figura das organizações sociais e a contratualização de serviços públicos. Aprovou-se a emenda 19 à Constituição, que, entre outras coisas, determinou a avaliação dos servidores públicos e a possibilidade da demissão por insuficiência de desempenho. Em 2000, veio a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Depois disso, andamos em marcha lenta. O modelo das organizações sociais pouco andou, na esfera federal, ainda que tenha avançado em muitos estados, a começar por São Paulo, com as OSs de saúde e cultura. A avaliação dos servidores nunca foi regulamentada pelo Congresso. Faz 20 anos, e não consta que o Supremo tenha se mexido para lidar com isso, sob o argumento da “omissão legislativa”.
PEC do Teto, no final de 2016, terminou por escancarar a falência do Estado brasileiro. Ou colocamos um artigo, na Constituição, que nos obriga a fazer reformas de verdade, ou afundamos de vez. É o ponto em que nos encontramos.
O risco é cair na ilusão de que basta uma reforma fiscal, que corte despesas, combata “privilégios”, mas mantenha intacta a lógica de um Estado estruturalmente ineficiente. Isso seria a cara de um país medíocre. O desafio é ir além: mexer na governança do Estado, na qualidade da oferta dos serviços públicos.
O país deu passos tímidos nesta direção com a lei de governança das estatais e, mais recentemente, a nova lei das agências reguladoras. O governo anuncia um amplo programa de privatizações e concessões de parques e presídios, o que é positivo, mesmo que tudo pareça ainda bastante incerto.
Não acho que deveríamos reinventar a roda neste tema. Há uma experiência brasileira em reforma do Estado, que sinaliza um caminho. Basta ir ao oeste do Paraná e observar a concessão do parque do Iguaçu, no entorno das Cataratas; visitar a periferia de Belo Horizonte e conhecer as escolas em modelo PPP; andar pelo antigo centro do Rio de Janeiro e fazer uma visita ao Museu do Amanhã, e depois dar um pulo na Floresta da Tijuca para conhecer o Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada). E quem sabe terminar a semana assistindo a um concerto da Osesp, na Sala São Paulo.
Os exemplos têm um ponto em comum: o governo abriu mão de executar serviços e terminou produzindo resultados muito melhores. O governo recuou, não abriu concurso, não inchou a máquina do Estado ou a previdência pública. Manteve seu perfil enxuto e sua função de inteligência, deixando de fazer o que a sociedade e o mercado podem fazer melhor.
Não há nenhum grande mistério aí. Basta um pouco de bom senso, disposição para aprender e não pensar o Brasil a partir dos interesses corporativos. No fundo é este o desafio da reforma do Estado, se é que desejamos pensar com alguma ousadia.
Fernando Schüler
Professor do Insper e curador do projeto Fronteiras do Pensamento. Foi diretor da Fundação Iberê Camargo.

Análise da Universidade Federal da Bahia também diz que óleo é da Venezuela, FSP

Franco Adailton
SALVADOR
O óleo que resultou nas manchas encontradas em mais de 130 localidades do litoral nordestino tem origem da Venezuela. É o que afirmou a pesquisadora Olívia Oliveira, em entrevista coletiva no Instituto de Geociências da UFBA (Universidade Federal da Bahia) na manhã desta quinta-feira (10).
O governo da Venezuela disse nesta quinta-feira que o país não é responsável pelo petróleo que atingiu praias do Nordeste do Brasil, após o ministro do Meio Ambiente dizer que as manchas de óleo provavelmente estão relacionadas a produto da Venezuela.  
De acordo com a professora, foram analisadas amostras coletadas nos litorais da Bahia e de Sergipe, numa parceria entre as universidades federais dos dois estados nordestinos e a Universidade Estadual de Feira de Santana (BA).
Todo o material coletado foi cadastrado no Lepetro, centro vinculado ao Instituto de Geociências da UFBA, com nove unidades laboratoriais nas áreas de geologia, química, microbiologia, geoquímica, petróleo e meio ambiente.
 
Foram selecionadas nove amostras, sete da costa sergipana e duas da baiana. Depois, feita a separação física e desidratação do material contaminante da areia e da água do mar. Em seguida, o óleo total foi injetado em cromatógrafos com detector de chamas para obtenção do fingerprint, ou seja, da impressão digital do material fóssil, em livre tradução.
“Os resultados das análises das amostras foram comparados com os resultados das análises de petróleo constantes na literatura e no banco de óleos do Lepetro, que possui amostras de diferentes bacias do Brasil e dos principais países produtores de petróleo.”
A divulgação da análise do material colhido por pesquisadores da UFBA corrobora a afirmação feita na quarta (9) pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, durante audiência na comissão de meio ambiente e desenvolvimento sustentável da Câmara, com base em estudo feito pela Petrobras.
Nesta quinta-feira (10),  governo da Venezuela disse que o país não é responsável pelo petróleo que atingiu praias do Nordeste do Brasil. Em comunicado conjunto, o Ministério do Petróleo e a empresa estatal de petróleo PDVSA disseram que não receberam nenhum relato de clientes ou subsidiárias sobre vazamentos de petróleo perto do Brasil e disseram que as acusações são infundadas.
“Os resultados encontrados indicam uma bacia petrolífera que representa um ambiente geológico de formação de um conjunto de rochas que geraram petróleo”, disse. “A indicação de similaridade com o petróleo produzido no país aqui citado fará referência apenas à região geográfica da referida origem geológica.”
A professora afirmou, no entanto, que o incidente que resultou no passivo ambiental deverá ser alvo de investigação dos órgãos competentes. “Nosso papel se configurou como uma contribuição científica à sociedade. É o que chamamos de geoquímica forense”, disse.
Ainda conforme a pesquisadora, o material analisado, por se tratar de petróleo cru, perdeu as características químicas por evaporação. “Já que sua viscosidade é alta, não podemos descartar a possibilidade de o material ser bunker, combustível de navio”, afirmou.
Segundo a professora, por meio dos resultados das análises dos biomarcadores e dos isótopos de carbono, “observou-se uma boa correlação do óleo coletado nas praias com um dos tipos de petróleo que é produzido na Venezuela”.
“Nenhum petróleo produzido no Brasil, com origem a partir da matéria orgânica marinha, apresenta distribuição dos biomarcadores e razão de isótopos de carbono similar aos resultados encontrados”, disse a pesquisadora.