sábado, 27 de abril de 2019

A privatização dos presídios é uma saída para a crise carcerária? SIM, FSP

Nivaldo Cesar Restivo
As dificuldades enfrentadas nos sistemas prisionais exigem uma solução complexa e multidirecional. As concessões de unidades prisionais à iniciativa privada na modelagem de Parceria Público-Privada (PPP) ou no formato de cogestão despontam como uma alternativa eficaz para o sistema penitenciário.

Em São Paulo, trata-se de uma possibilidade real para o alcance da meta definida para o setor pelo governador João Doria (PSDB): expansão e modernização do sistema penitenciário paulista.

São várias as garantias de um incremento na prestação do serviço de custódia. Haverá desoneração dos cofres públicos, já que o estado não fará aporte de recursos na construção do presidio, permitindo ao governo destinar esses valores ao atendimento de outras necessidades da população. O investimento caberá ao concessionário e, por consequência, teremos construções mais rápidas, com mais vagas disponíveis em menos tempo.
 
Ao particular recairá a responsabilidade por todos os atendimentos remetidos aos presos. Dessa forma, será possível dar celeridade, por exemplo, às intervenções de saúde com médicos, dentistas e psicólogos. O resultado se revelará importante também à população local, uma vez que encaminhamentos de presos doentes a unidades de saúde diminuirão.

Além disso, a ressocialização será impulsionada por meio do binômio trabalho-educação, com a ampliação da oferta de postos destinados ao exercício de uma profissão, à capacitação profissional, à educação formal e à educação profissionalizante. 

Àqueles que insistem em afirmar ser mais caro manter um preso custodiado pelo particular, sugiro detida análise sobre todos os itens e valores que compõem o cálculo. O resultado vai surpreender. 

Ressalte-se que, em quaisquer dos modelos de concessão, o estado manterá completo domínio do estabelecimento prisional, posto que a Direção Geral e a Direção de Segurança e Disciplina serão ocupadas por funcionários da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), assim como eventuais intervenções para restabelecimento da ordem interna serão levadas a efeito por agentes públicos.

Da mesma forma, a vigilância e a escolta em deslocamentos externos serão realizadas por nossos profissionais. Essas são missões indelegáveis e, portanto, continuarão sob responsabilidade do ente público.

Ademais, estabeleceremos indicadores que medirão a qualidade do desempenho do concessionário, com o objetivo permanente de exigir sempre a melhor prestação de serviço. Com todas essas circunstâncias protegemos, na plenitude, as conquistas profissionais e o exercício das competências dos funcionários que integram as valorosas carreiras da SAP e que, indubitavelmente, têm grande responsabilidade na manutenção da segurança e tranquilidade do sistema prisional paulista.

Temos exemplos de gestão privada em unidades prisionais pelo Brasil. Conheci algumas delas e constatei que o modelo funciona. Queremos, ao mesmo tempo, com a concessão das unidades, que os detentos tenham cada vez mais oportunidades de trabalho e que gerem renda nos presídios.

Aqui em São Paulo, temos um governo caracterizado pela descentralização, participação, eficiência, transparência e inovação. Essas são as diretrizes.

Dizer que não funciona é a maneira mais cômoda de encerrar uma discussão, optando pela manutenção do que já temos. Significa continuar buscando "uma saída para a crise carcerária".
Nivaldo Cesar Restivo
Secretário da Administração Penitenciária do estado de São Paulo e ex-comandante-geral da Polícia Militar

    Valeu a pena?, FSP

    Cadeia não é o lugar nem para Lula, nem para Maluf, nem para Cabral

    O ex-presidente Lula ao chegar a prédio da PF em Curitiba (PR), em abril de 2018, para cumprir pena
    O ex-presidente Lula ao chegar a prédio da PF em Curitiba (PR), em abril de 2018, para cumprir pena - Heuler Andrey -7.abr.18 /AFP
    Se há uma área do direito que me é impenetrável, é a dosimetria das penas. Não posso, portanto, palpitar tecnicamente sobre a decisão do STJ de reduzir a temporada de Lula na prisão. Tenho para mim, porém, que a cadeia não é o lugar para Lula. Nem para Lula, nem para MalufCabral ou qualquer outro político que tenha se apropriado de recursos públicos, não importando sua coloração ideológica.
    Por que prendemos um criminoso? Há duas escolas principais. Para os retributivistas, o castigo tem valor intrínseco. Punimos o delinquente porque é a coisa certa a fazer. O problema com o retributivismo é que ele não para conceitualmente em pé sem recurso a ideias exóticas como a de um universo justo ou de um papai do céu.
    Intuitivamente, somos todos retributivistas. O desejo de ver sofrer quem tenha infringido normas é a forma que a evolução encontrou de promover a sociabilidade nos grupos, mas aí já estamos falando do valor instrumental da punição, o que nos leva à segunda escola.
    Para os consequencialistas, corrente em que me incluo, a cadeia tem tripla função: apartar da sociedade elementos que a ponham em perigo, evitar a continuidade do delito e atuar como um elemento de dissuasão, desencorajando outros atores de repetir o comportamento antissocial.
    Como corruptos não representam um risco físico à sociedade, não faz muito sentido segregá-los do grupo. As outras duas funções, a interrupção do crime e a dissuasão, podem ser obtidas por meios menos drásticos e mais baratos do que a prisão. Banir os corruptos da vida pública e garantir que eles saiam da aventura mais pobres do que entraram são um bom ponto de partida. Poderíamos acrescentar outras restrições de direitos, mas elas nem são necessárias.
    Sei que parece pouco, mas nossos ancestrais também ficaram com essa sensação quando trocaram as execuções em praça pública pela cadeia. No entanto, valeu a pena.

    De Jânio a Bolsonaro, Opinião FSP

    Atual presidente por vezes parece inspirar-se em seu excêntrico antecessor

    Jair Bolsonaro durante cerimônia de assinatura de decreto que põe fim ao horário de verão
    Jair Bolsonaro durante cerimônia de assinatura de decreto que põe fim ao horário de verão - Pedro Ladeira/Folhapress
    No dia 3 de outubro de 1960, Jânio Quadros elegeu-se presidente com a promessa de varrer a corrupção e moralizar os costumes no Brasil.
    Nos sete meses em que se manteve no poder, antes da renúncia, encontrou tempo para vetar a realização de corridas de cavalo nos dias de semana, as brigas de galo, a comercialização de lança-perfume no Carnaval e o uso de trajes de banho considerados indecorosos em concursos de misses.
    Passadas mais de cinco décadas, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) por vezes parece inspirar-se em seu excêntrico antecessor para cumprir o intento de promover um governo conservador nos costumes.
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    Além de iniciativas polêmicas na esfera ministerial, o próprio mandatário coleciona declarações e atitudes extravagantes, não raro a alimentar preconceitos e incentivar a discriminação de minorias.
    Dois casos recentes ilustram esse comportamento —a retirada do ar de um comercial do Banco do Brasil, voltado para o público jovem, com ênfase na diversidade racial e sexual, e a chocantedeclaração acerca do turismo de gays no Brasil.
    No primeiro episódio, Bolsonaro, contrariado ao assistir à peça, determinou que a instituição financeira interrompesse a veiculação e demitisse o diretor de marketing.
    A deliberação personalista por pouco não se transformou em novo protocolo governamental. Anunciou-se que as empresas estatais passariam a ser obrigadas a submeter suas campanhas mercadológicas à avaliação da Secretaria de Comunicação Social.
    A ideia da centralização, que fazia lembrar regimes autoritários, acabou suspensa porque se constatou que estava em desacordo com a legislação —ao menos foi essa a explicação oficial para o recuo.
    Evitou-se, de todo modo, um vexame maior. Cabe perguntar que orientação a Secom seguiria a esse respeito. Seria providenciado um manual para estabelecer o que pode ou não ir ao ar?
    Já a manifestação sobre o turismo de homossexuais quase dispensa comentários. Em café da manhã com jornalistas, na quinta-feira (25), o presidente afirmou que “o Brasil não pode ser um país do mundo gay, de turismo gay”, porque aqui “temos famílias”.
    Seria aceitável, conforme deu a entender, que heterossexuais viessem ao país com a intenção de manter relações com mulheres. Como se nota, é tênue a divisa entre a vulgaridade inconsequente e o estímulo abjeto à intolerância.