sexta-feira, 26 de outubro de 2018

Biruta de Bolsonaro causa paralisia, Vinícius Torres Freire, FSP

Candidato descobre agora políticas públicas e amolda programa vago a pressões da realidade

Nos dois meses entre a eleição e a posse, sobra tempo para o presidente eleito virar do avesso suas falações de campanha. Foi o que fez Dilma Rousseff, com os resultados conhecidos.
Favorito para vencer no domingo (28), Jair Bolsonaro insinua-se como um caso particular desses revertérios. Não se sabe bem o que nele é avesso e direito, qual é o lado de dentro e o que está por fora de seu programa, ao menos no que diz respeito à economia.
O candidato Jair Bolsonaro (PSL) recebe camiseta do lutador de jiu-jítsu Robson Gracie (esq.) no Rio de Janeiro
O candidato Jair Bolsonaro (PSL) recebe camiseta do lutador de jiu-jítsu Robson Gracie (esq.) no Rio de Janeiro - Carl de Souza/AFP
A inversão dos planos de Dilma Rousseff provocou choque de confiança econômica e queimou seu prestígio, descréditos que minaram as bases políticas e os acordos sociais necessários para a implementação de qualquer programa. O resultado ruinosamente certeiro de sua reviravolta deveu-se à clareza do seu estelionato eleitoral.
É inverossímil que Bolsonaro possa repetir tal proeza, mas por motivos ruins. É implausível que o candidato do PSL, eventualmente eleito, declare-se adepto das políticas de Dilma 1 ou, mais condizente com sua carreira, do programa de Ernesto Geisel —sim, é sarcasmo.
Bolsonaro parece descobrir apenas agora o que talvez deva ou possa pensar sobre, por exemplo, política econômica ou relações internacionais. Está perdido entre seu miolo estatista e corporativista e a casca fina de liberalismo que vestiu a fim de inventar sua candidatura.
Quando negou a ideia de criação de uma CPMF, por exemplo, nem sabia do que estava tratando seu economista-chefe. Praticamente discutia com um meme, seu universo habitual de debates.
Mais recentemente, tem mudado de ideia a cada trombada com as pressões do mundo real. Há quem diga que se trata de uma estratégia esperta de desinformação ou de criação proposital de nevoeiro de guerra. A impressão que dá é a de um turista acidental no mundo das políticas públicas.
Nesta quinta-feira (25), disse que o Brasil não vai abandonar o Acordo de Paris, tratado de controle de gases de efeito estufa, que criticara e que havia sido denunciado por um ajudante de ordens, que o chamou de papelucho excrementício.
As ideias conspiratórias de seu círculo íntimo sobre acordos internacionais causaram péssima impressão em líderes informados do agronegócio, quase todos bolsonaristas.
A película liberal do candidato prevê a contenção do Estado, o que demanda reforma da Previdência e, no meme bolsonarista, caça aos marajás. No entanto, Bolsonaro diz que é preciso defender direitos adquiridos.
É preciso abrir a economia, base de qualquer conversa liberal, mas os capitães da indústria nacional impressionaram o capitão da extrema direita, pregando abertura mui lenta, gradual e segura, de preferência administrada pelo Ministério do Desenvolvimento e da Indústria, do qual Bolsonaro pretendia dar cabo.
Assim foi também com privatizações e investimentos estrangeiros. Os pilares da sabedoria liberal são abalroados pelos caminhões dos lobbies por direitos especiais e proteções.
Sabe-se lá o que será Bolsonaro, caso eleito. Sabe-se lá se será massa de modelar ou manobra de lobbies, se sua falta de informação e convicções econômicas é que determina a inconstância.
Embora, por definição, assim não possa cometer estelionato eleitoral, sua biruta de ideias também pode causar degradação, o efeito incremental de muitas incertezas localizadas e variadas. Não tende assim a causar um choque, de início, mas pode provocar paralisia por acumulação de dúvidas e descréditos.
 
Vinicius Torres Freire
Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Nem explicação nem arrependimento, Celso Ming ,OESP


A autocrítica precedida pela transformação da mente é essencial para uma virada eleitoral, mas o PT precisará superar a arrogância antes

Celso Ming, O Estado de S.Paulo
17 Outubro 2018 | 21h00
Uma das principais marcas deste final de campanha é a arrogância. E não é só do PT.
“Não dá para o PT pedir desculpas por ter ido para o segundo turno. O PT tem 30% dos votos deste país”, afirmou a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Ou seja, o PT não tem de dar satisfação a ninguém, ele se basta absolutamente, como se bastava absolutamente o Rei Sol.
Arrogância é isso. É considerar-se tão superior aos demais, social e moralmente, que não tem de fazer autocrítica. Não tem de começar por reconhecer “as besteiras que fez”, como advertiu terça-feira o ex-governador do Ceará Cid Gomes. A falta desse reconhecimento leva à prepotência e ao desprezo por quem não pensa igual.
Rei SOL
Luís XIV. O Rei Sol Foto: Marcos Müller
O candidato do PT, Fernando Haddad, foi menos prepotente do que Gleisi. No último domingo admitiu falhas graves: “Faltou controle interno nas estatais. Diretores ficaram soltos para promover a corrupção e enriquecer pessoalmente”.
Mas esse é reconhecimento apenas parcial. Não foi apenas perda de controle ou falta de comando sobre diretores de empresas estatais. O que se soube pelas revelações do mensalão e do petrolão foi que o PT no governo comandou vasta operação de aparelhamento das empresas estatais e das entidades de Estado. A partir daí, partiu para a “formação de quadrilhas”, encouraçadas contra qualquer iniciativa de compliance, e para a pilhagem das estatais, dos fundos de pensão e para o desvio de recursos públicos.
Grande parte dos bilhões assim “desapropriados” não se destinara apenas “à causa”, embora esse também tenha sido desvio criminoso. Também foi para enriquecimento pessoal, como Haddad admite. Outra parte foi desviada para ditaduras de países da África e da América Latina ou, durante determinado período, até mesmo para ajudar a financiar atividades das Farc, então comprometidas com operações de sequestro e assassinato de civis e com o jogo dos narcotraficantes.
Isso não tem nada a ver com simples perda de controle. Foi política deliberada, dentro do espírito stalinista de que o importante não é ganhar as eleições, mas tomar o poder, como o ex-ministro José Dirceu declarou ao jornal madrilenho El País.
A condução desastrosa da política macroeconômica foi o resultado de outras “besteiras” do governo PT. Levaram à recessão, ao desemprego, à deterioração das contas públicas, à disparada da dívida pública, às pedaladas e ao esvaziamento da indústria.
Por que a autocrítica precedida pelo que os antigos chamavam de metanoia, ou seja, precedida pela transformação da mente, é essencial para uma virada eleitoral? Porque, sem ela, a percepção da opinião pública e do eleitor é a de que tudo o que deu errado pode voltar a dar errado, com alta probabilidade de voltar piorado.
A arrogância e autoritarismo não são traços de caráter apenas de muitos dirigentes e militantes do PT. O capitão Bolsonaro corre o risco de enveredar pelo mesmo caminho, quando deixa portas abertas para o revanchismo e para arbitrariedades de todo calibre e alardeia, muito antes do fim do jogo, que já botou a mão na faixa. Mas essa análise fica para outro dia.

Melhor do que o esperado

A função do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) é antecipar o comportamento da atividade econômica (PIB), que não sai antes de 40 dias depois de fechado um trimestre. O IBC-Br de agosto surpreendeu pelo crescimento (0,47% em relação a julho). Esse bom desempenho sugere que o crescimento do terceiro trimestre pode ser maior do que o 0,2% projetado. As estatísticas setoriais mais recentes (do varejo e dos serviços) confirmam esse crescimento moderado da economia.
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Celso Ming - Voto e vísceras, OESP

Voto e vísceras

Eleitor continua pouco ligado ao conteúdo das propostas e dos programas de governo e falta debate consistente

Celso Ming, O Estado de S.Paulo
24 Outubro 2018 | 20h30
Também desta vez, conquistará o voto do eleitor aquele que conseguir trabalhar principalmente as emoções. A lógica e a racionalidade continuam sendo instrumentos indispensáveis de convencimento, mas não são o principal, pelo qual o eleitor fará sua opção. As pessoas votam guiadas pelas vísceras e não pela mente.
Haddad e Bolsonaro
Os presidenciáveis Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL)  Foto: Nelson ALMEIDA / AFP
Esta é a principal razão pela qual o eleitor continua pouco ligado ao conteúdo das propostas e dos programas de governo. Os próprios candidatos pouco se dão ao trabalho de elaborar e de debater propostas consistentes.
A do candidato Jair Bolsonaro (O Caminho da Prosperidade) é um amontoado de frases dispostas em arquivos de PowerPoint, que não aprofunda o que sugerem. Sobre a reforma da Previdência Social, por exemplo, há lá uma afirmação de que a solução consistirá em abandono do atual sistema de repartição, em que o trabalhador da ativa ajuda a pagar a aposentadoria de quem já se retirou do mercado, e pela adoção do sistema de capitalização, por meio do qual o trabalhador da ativa mais seu empregador contribuirão para uma conta de investimento do próprio trabalhador. Sua aposentadoria será baseada no saldo que estiver depositado em sua conta. Mas os grandes problemas desse sistema são ignorados. O programa não diz quem pagará as aposentadorias dos já retirados, uma conta que hoje ultrapassa os R$ 500 bilhões por ano.
O programa do PT já sofreu três ou quatro maquiagens e também continua vago e pouco convincente. Para evitar medidas impopulares, rejeita tanto a reforma da Previdência quanto a política de austeridade (teto dos gastos), inevitável diante da necessidade de conter o rombo fiscal. Afirma que tudo será naturalmente resolvido quando o crescimento econômico voltar. Mas ninguém fica sabendo como será reativado o crescimento econômico. Enfim, o programa do PT continua ruim.
Como nenhum dos dois candidatos à Presidência delineou o que pretende em matérias de políticas públicas, não há, também, como saber quais, afinal, serão as escolhas e até que ponto confiar na sua eficácia.
De todo modo, a grande fonte de incertezas consiste em saber até que ponto o vencedor poderá contar com uma sólida base parlamentar, não só para distribuir a conta imediata da crise entre a população, mas, também, para aprovar as reformas que deverão encontrar soluções aos problemas de longo prazo.
Do ponto de vista de quem tem um patrimônio familiar a administrar e está em busca de um porto seguro, a vitória de Jair Bolsonaro, hoje muito mais provável, não acabará com as incertezas. Durante uns dias, o mercado financeiro deverá comemorar a rejeição das escolhas do PT. Nessas condições, o retorno das barbeiragens do governo Dilma será uma hipótese descartada. Mas outras barbeiragens podem acontecer. Um vez encerrada a apuração deste domingo, será preciso saber como os problemas serão equacionados e, a partir daí, quem vai ganhar e quem vai perder com o novo jogo. E este equacionamento não será suficiente para afastar outros riscos, especialmente, o da eventualidade do agravamento da crise da economia mundial, num ambiente de deterioração fiscal, aumento dos juros, guerra comercial e de avanço dos partidos fascistas em todo o Ocidente.

» Sinal de reação

A Receita Federal divulgou nesta quarta-feira a arrecadação de tributos do mês de setembro. Este foi o 11º mês seguido de crescimento, já considerada a correção da inflação. O avanço de 6,21% em 2018 – ante janeiro a setembro de 2017 – foi influenciado pelos principais indicadores macroeconômicos, em especial os relacionados ao consumo, à produção industrial e às importações. No mês de setembro, o resultado foi impulsionado pela arrecadação de tributos cobrados das empresas, que cresceu 21,34%.