domingo, 9 de dezembro de 2012

O que procura o mercado de trabalho - JOSÉ PASTORE


CORREIO BRAZILIENSE - 09/12


Já foi o tempo em que as empresas contratavam com base em diploma e recomendações. Nos dias atuais, as exigências vão muito além disso. As empresas querem capacidade de resposta, buscam bom-senso, lógica de raciocínio, boa comunicação, habilidade para trabalhar em grupo, domínio de línguas e outros requisitos. É por isso que sobram vagas e candidatos.

As empresas sabem que profissionais prontos e acabados para resolver problemas específicos não existem. Por isso, ao contratar, elas buscam pessoas que sejam capazes de apreender rapidamente o que precisam saber. Isso é essencial porque as tecnologias e os processos produtivos mudam muito depressa e exigem boa capacidade para acompanhar as mudanças. Nos dias atuais, já não basta ser adestrado. É preciso ser educado e bem-educado.

A educação só faz diferença no salário e na carreira do profissional quando é de boa qualidade. Isso explica por que muitos formados em cursos superiores ganham menos do que bons técnicos formados nas escolas técnicas de alta reputação. No Seminário sobre Educação e Formação de Mão de Obra para o Crescimento, realizado pelo jornal O Estado de S. Paulo, os dados ali aportados foram eloquentes.

Os técnicos projetistas e os técnicos em automação industriais, assim como os técnicos em energias renováveis, têm salário inicial por volta de R$ 3,5 mil por mês - bem acima do de muitas profissões de nível superior. Com 10 anos de experiência, ganham R$ 6 mil mensais e até mais. Pessoas com esse perfil são mais difíceis de ser encontradas do que os formados pelas universidades. Ainda hoje, a situação está desequilibrada. O país tem cerca de 6,5 milhões de estudantes nas universidades (15% do total) - o que ainda é pouco - e apenas 1,3 milhão nas escolas profissionais (7% do total) - o que é irrisório. Os países avançados possuem mais de 40% dos jovens matriculados nessas escolas. No Japão, são 55%; na Alemanha, 53%.

Os estudos do Senai indicam que, só para o setor industrial, serão necessários cerca de 1,1 milhão de profissionais qualificados novos até 2015, sem falar na necessidade de atualizar e reciclar os milhões já empregados. Mas o sistema brasileiro de formação profissional é acanhado. Isso tem efeitos perversos para as pessoas e para a economia.

Do lado das pessoas, muitas perdem oportunidade de melhores salários diante de vagas que não são preenchidas por falta de qualificação. Do lado da economia, a produtividade do trabalho se mantém baixa e inferior ao aumento do custo do trabalho, o que compromete a competitividade e os próprios investimentos futuros. Nenhuma economia se sustenta com produtividade baixa e custos crescentes.

Felizmente, há luzes no fundo do túnel. O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC) está bem estruturado e promete ampliar substancialmente as matrículas nas escolas profissionais de nível médio. O Programa Ciência sem Fronteiras, com a oferta de mais de 100 mil bolsas de estudo, é fundamental para melhorar a qualidade das escolas superiores nas áreas tecnológicas e, com isso, sustentar a expansão das escolas de nível médio. As iniciativas das empresas por meio de cursos intensivos de qualificação técnica e de universidades corporativas trazem uma chama de esperança de dias melhores.

É animadora também a expansão do Sistema S. A propósito, estive na última semana na Olimpíada do Conhecimento, promovida pelo Senai em São Paulo, quando pude ver o vigor e o sucesso do ensino de boa qualidade. Os participantes do certame mostraram enorme capacidade de combinar a teoria com a prática no exercício das profissões técnicas que abraçaram. Dali eles seguem para Leipzig, onde disputarão as Olimpíadas Mundiais. Em 2011, os brasileiros se colocaram em segundo lugar, prova que as coisas benfeitas dão certo - mesmo no Brasil.

A decisiva segunda metade - PEDRO MALAN




O Estado de S.Paulo - 09/12


Dilma Rousseff não contou, na primeira metade de seu mandato presidencial - e não contará na segunda -, com um contexto internacional favorável como contou Lula, embora o ex-presidente nunca tenha reconhecido o quanto dele se beneficiou. E se Lula preferiu "esquecer" esse fato, o governo Dilma viu-se obrigado a chamar a atenção - com insistência - para a crise no mundo desenvolvido, seu ministro da Fazenda chegando a afirmar que se não fosse a crise internacional o Brasil poderia estar crescendo em torno de 4,5% a 5% ao ano.

Mas o fato é que há países no mundo que estão respondendo bem à crise com que se defrontam os Estados Unidos, a Europa e o Japão. Para ficar apenas aqui, na América Latina, as taxas de crescimento no biênio 2011-2012 no Chile, na Colômbia, no Peru e no México são - em muito - superiores à brasileira. As taxas de inflação desses quatro países são - em muito - inferiores à brasileira. E as taxas de investimento desses mesmos quatro países estão na faixa dos 23% a 25%, ante os 18% a 19% do Brasil.

Há um quase consenso entre economistas brasileiros das mais variadas persuasões de que a chave para o nosso crescimento econômico sustentado é o aumento de nossa taxa de investimento dos atuais 18%-19% para níveis próximos dos desses quatro países latino-americanos citados acima (que já são abaixo dos asiáticos). Volto ao tema do artigo publicado neste espaço em junho deste ano (Urgências no gradualismo), agora com referência mais específica aos problemas do setor de petróleo e gás.

Em 7 de setembro de 2009 a então chefe da Casa Civil e óbvia candidata à Presidência da República concedeu ao jornal Financial Times longa e detalhada entrevista sobre o tema. A primeira e natural pergunta do jornalista foi: "Por que mudar o regime de concessão para o de partilha?".

Dilma Rousseff foi muito clara ao apresentar, e reiterar, ao longo da importante entrevista as suas três razões básicas: baixo risco exploratório no pré-sal, alta taxa de retorno sobre o investimento na área e reservas potenciais de petróleo e gás que poderiam chegar a dezenas de bilhões de barris de petróleo equivalente. A conclusão ou o corolário natural que a então ministra defendeu com convicção: "Nós (governo) queremos uma fatia maior das receitas deste petróleo". Daí a decisão de mudança do regime de concessões para partilha. (A propósito, acaba de sair um bom livro sobre esse tema, editado por Fabio Giambiagi e Luiz Paulo Velloso Lucas.)

Deixemos de lado uma pergunta fundamental: era mesmo preciso mudar totalmente a Lei do Petróleo de 1997 apenas para aumentar a fatia do governo? (Algo que o regime de concessões, adaptado, já permitiria, dizem especialistas, por meio do aumento da "participação especial" para os novos campos do pré-sal.) A questão relevante, no entanto, após a controvertida decisão da mudança de regime, passou a ser a viabilização dos investimentos para a empreitada, principalmente com a Petrobrás tendo de assumir a posição de operadora, com pelo menos 30% de todos os campos do pré-sal a serem explorados.

Em entrevista a este jornal há exatos três anos (2/12/2009, Economia, página B3), Sergio Gabrielli, então presidente da Petrobrás, diz o seguinte: "Hoje, a Petrobrás tem um plano de investimentos de US$ 174 bilhões para cinco anos (2009-13), que vai aumentar. Quanto eu não sei ainda. Mas, com certeza, é maior. US$ 174 bilhões em cinco anos significa cerca de US$ 35 bilhões por ano". E acrescenta: "A companhia não é capaz de gerar caixa livre para fazer esse investimento". Em 2009 a Petrobrás levantou US$ 31 bilhões de dívida nova (fato muito enfatizado pela ministra-chefe da Casa Civil na entrevista de 7 de setembro, supondo que captações adicionais não seriam problema, dadas as suas três razões básicas já mencionadas).

Mas Gabrielli nota que a Petrobrás tem de respeitar certos limites na relação dívida/capital próprio. E que seria necessária uma capitalização da empresa - como veio a ser feito. Sobre a capacidade de endividamento futuro da empresa, Gabrielli refere-se ao "potencial de produção" de quatro campos, diz que em outros quatro não se sabe qual o volume e que "das áreas não concedidas ninguém sabe nada". Como continuamos não sabendo, porque não há leilões nem para o pré-sal nem para nenhuma outra área, inclusive em terra, desde dezembro de 2008 - quatro anos atrás. Tempo precioso.

A pergunta fundamental continua sendo: a mudança de regime de concessão para o de partilha aumentou os incentivos ao investimento, público e privado (doméstico e internacional) no setor de petróleo e gás e em sua cadeia? Em outras palavras: para a mesma expectativa quanto às possibilidades de produção potencial do pré-sal, o ambiente de negócios melhora, piora ou é indiferente no que se refere ao regime escolhido?

Os casos do petróleo - e da energia elétrica - não são isolados. As mesmas controvérsias sobre os papéis relativos do Estado, de empresas públicas e do setor privado existem em outras áreas, como portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, trens-bala, saneamento, abastecimento de água. A convivência de diferentes visões por vezes levou a paralisias decisórias, que a presidente Dilma vem, à sua maneira, procurando enfrentar.

Vale concluir com pertinente observação de Felipe González, ex-primeiro ministro da Espanha: "Paradoxalmente, o grande problema da ideologia é que ela obscurece o debate de ideias sobre a ação do poder público ao tratar como grandes questões políticas e morais problemas específicos que deveriam ser enfrentados como questões de eficiência operacional do setor público, quando não há diferenças de vulto sobre os objetivos a alcançar, e sim sobre as formas mais eficazes de fazê-lo".

Até 2014 teremos, talvez, alguma indicação adicional sobre essa questão.

Até lá, um feliz Natal e um próspero ano-novo a todos!

Quem ama mata - ou morre - DANUZA LEÃO



FOLHA DE SP - 09/12


Um homem ao lado da mulher que ama é outra pessoa, alguém que nem sua própria mãe reconhece


O amor é maravilhoso, não é? É, responde o mundo em coro. Mas por que será que as pessoas mudam tanto quando apaixonadas? Os mais boêmios, que passavam as madrugadas contando histórias idiotas, mas muito divertidas, que tinham sempre uma opinião diferente e original sobre os assuntos do dia, tornam-se austeros -e a bem da verdade, bem menos interessantes.

O "affair" do diretor do FMI, por exemplo: qualquer homem, em companhia de seus íntimos, dirá que, se a camareira fosse gostosa, faria a mesma coisa. Única ressalva: negaria até o fim, mesmo diante da Suprema Corte. Mas, se estiver ao lado da namorada, vai dizer que esse tipo de procedimento é indigno e que um homem que se respeita não pode, jamais, fazer nada de parecido. Quanto a elas -bem, se eles são assim, por que elas seriam diferentes?

Num almoço só de mulheres, depois da segunda caipirinha, algumas serão suficientemente francas para dizer que adoram homens atrevidos e ousados. Mas ponha essas mesmas mulheres ao lado dos maridos e pasme diante do que elas vão dizer, dele e da pobre camareira.

Um homem ao lado da mulher que ama é outra pessoa, alguém que nem mesmo sua própria mãe é capaz de reconhecer; ele é capaz de dizer que não acha a menor graça em mulher alguma, que quem ama é fiel e que para ele só existem duas coisas que realmente importam: ela -em primeiro lugar- e o time pelo qual torce. Se você encontrar esse mesmo homem almoçando com três amigos no centro da cidade, traçando uma linguicinha com um chope, vai descobrir que se trata de outra pessoa, só pelo som das gargalhadas. E, se passar uma bela morena com as pernas de fora, será um belo festival de baixarias.

Se você tiver uma única e grande amiga e ela se apaixonar, fique sabendo que ficou sozinha no mundo. Fazer uma refeição com um casal apaixonado está acima das forças de qualquer ser humano não apaixonado, pois o mundo deles é diferente, e nele não há lugar para pessoas normais.

Quem ama se transforma em outra pessoa, com outros gostos e outras opiniões, capaz de roubar a aliança da própria mãe para passar um fim de semana no Caribe com o ser amado, isto é: torna-se uma pessoa indigna de nossa confiança.

Aquela mulher que, quando entrava na discoteca, começava a mexer o corpo, hoje em dia fica paralisada, surda e muda, talvez pelas lembranças que a música traz -ah, como são coerentes, as mulheres. Só que ele se apaixonou por ela exatamente quando ela mexia não só o corpo, como o gelo do copo de uísque com o dedo, e agora, quando olha para aquela mulher austera, não entende por que a vida era tão melhor.

Você já foi a um show de striptease com seu amado? Bem, quando o romance começou, ele brincava e atiçava seu ciúme com elogios às gostosas no palco; agora, quando vê uma mulher pelada numa revista, olha sério, sem uma só expressão no rosto, como se estivesse vendo um quadro num museu. Ele virou um marido, tudo que você sempre quis, e por nada no mundo você faria um strip particular só para ele, como já fez; certas coisas não são para serem feitas com o marido.

Tente ir com ele a uma praia da Europa, daquelas em que as mulheres tiram muito naturalmente o sutiã para tomar sol. Nervoso ele vai ficar -ah, isso vai. Faça então uma experiência e diga que vai tirar o seu: um homem das cavernas vai surgir de dentro daquele que passava a mão nas suas pernas no carro, no meio do trânsito, com o ar mais sério do mundo.

Onde foi parar esse homem? Onde foi parar aquela mulher que vivia feliz e risonha, que não queria nada da vida a não ser ficar junto com ele, agarrada, apaixonada? Quem ama não mata? Mata, sim; ou mata o outro, ou mata a si próprio -e o fim dessa história a gente conhece.