quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Vovó baleia cuida dos netos


Fernando Reinach
A grande maioria dos seres vivos morre assim que termina a fase reprodutiva. Insetos machos devorados pelas fêmeas ainda durante o coito e fêmeas que morrem logo após botar os ovos são casos extremos, mas do ponto de vista evolutivo fazem todo o sentido. Os seres vivos são selecionados por sua capacidade de transmitir seus genes aos descendentes e os que falharam já estão extintos.
Se isso é verdade, como explicar que em algumas espécies, como nos humanos e nas baleias, a vida de um indivíduo se estende por longos anos após o término de seu ciclo reprodutivo? Em 1964, W. D. Hamilton demonstrou que os seres vivos podem aumentar as chances de seus genes serem transmitidos às gerações futuras se cuidarem de seus filhos. Ao garantir que os filhos sobrevivam até a idade reprodutiva, os pais asseguram indiretamente a sobrevivência de seus genes.
Isso explicaria por que surgiram comportamentos como o de alimentar e cuidar da prole. Para Hamilton, a avó que vive o suficiente para ajudar a filha a criar os netos aumenta as chances de seus genes chegarem aos bisnetos. É uma noção pouco romântica, mas explica por que as mulheres sobrevivem tantos anos após a menopausa. As mulheres ancestrais que possuíam genes que conferiam anos extras de vida deixaram mais descendentes, que dominam o planeta.
Sabe-se há muitos anos que as orcas, também chamadas de baleias assassinas (Orcinus orca), vivem mais de 90 anos, apesar de seu período reprodutivo terminar aos 30 ou 40 anos. Agora foi demonstrado que essas baleias ajudam sua prole até que os filhos terminem sua idade reprodutiva.
Estudo de 36 anos. Essa descoberta foi feita estudando um grupo de 589 baleias que vivem livremente no Oceano Pacífico, na costa oeste dos EUA. O estudo foi iniciado em 1974 e terminou em 2010. Durante esses 36 anos, a vida de cada baleia foi monitorada, e nascimentos e mortes foram registrados. Esse acompanhamento foi possível porque a nadadeira dorsal de cada baleia possui marcas e cicatrizes únicas que permitem que cada indivíduo seja identificado nas fotos tiradas pelos biólogos. O trabalho foi facilitado pelo fato de essas baleias viverem em grupo e os filhos e netos continuarem a viver com os pais e avós. Assim, quando um grupo surge na superfície, ele pode ser fotografado, o que permite a identificação de cada indivíduo.
Para analisar o que acontecia com cada indivíduo, as baleias jovens foram divididas em três grupos. No primeiro estavam os animais que, aos 40 anos, tinham perdido as mães aos 15 (ou seja, somente tiveram a mãe até o inicio da idade reprodutiva). No segundo grupo estavam as baleias que, aos 40 anos, tinham perdido a mãe aos 35 (tiveram a mãe até a metade de sua idade reprodutiva). No terceiro, os animais que, aos 40 anos, ainda tinham a mãe viva, que agora era vovó (tiveram a presença da mãe até o final de sua idade reprodutiva).
Os cientistas analisaram a probabilidade de os animais de cada grupo viverem até os 40 anos. Foi observado que os animais que tiveram a mãe presente durante toda sua vida tinham 50% de chance de chegarem vivos aos 40 anos. Os que perderam a mãe aos 35 também tinham 50% de chance de chegar aos 40, mas essa probabilidade caía rapidamente logo após a morte da mãe, indicando uma grande dependência da presença materna. Os que perderam a mãe mais cedo, aos 15, tiveram sua chance de sobrevivência reduzida durante toda sua vida e sua probabilidade de chegar aos 40 anos é de 30%.
Os cientistas também observaram que esse efeito é mais acentuado para fêmeas que para machos. Esses resultados demonstram que a presença da mãe no grupo social aumenta as chances de sobrevivência dos filhos e, quanto mais tempo a mãe está presente, melhores as chances de sobrevivência de sua prole. O interessante é que esse efeito se estende por um período muito maior que o necessário para a mãe amamentar seu filhote e o ensinar a caçar. Os cientistas não sabem a causa dessa maior chance de sobrevivência dos animais que ainda têm sua mãe viva, mas uma hipótese é que a mãe ajude os filhos a caçar e talvez auxilie na criação dos netos.
Do ponto evolutivo, isso confirma a vantagem evolutiva de uma vida longa. Mesmo que na chamada "melhor idade" as baleias não sejam capazes de reproduzir, elas ajudam os filhos a sobreviver. Tudo indica que o que chamamos de amor materno é uma estratégia evolutiva para garantir a sobrevivência de nossos genes.
* BIÓLOGO
MAIS INFORMAÇÕES: ADAPTIVE PROLONGED POSTREPRODUCTIVE LIFE SPAN IN KILLER WHALES. SCIENCE,  VOL. 337,  PÁG. 1.313,  2012

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Lula carregou seu segundo poste, por Elio Gaspari, na FSP


Se Nosso Guia acender a lâmpada de Haddad, terá ganho mais uma, se não, a derrota será sua
LULA LEVOU seu poste ao segundo turno na disputa pela Prefeitura de São Paulo. Apesar de a eleição ter ocorrido enquanto o Supremo Tribunal Federal julga um dos maiores escândalos políticos da história nacional, o PT saiu da rodada inicial como o partido mais votado nos municípios, com 17,3 milhões de votos (um crescimento de 4%), elegendo 624 prefeitos, 12% a mais que em 2008. Levou 8 das 83 cidades com mais de 200 mil habitantes que fecharam a conta.
Isso num dia em que o ministro Joaquim Barbosa era festejado na seção onde votou. "Cana neles", disse-lhe um eleitor. Seu colega Ricardo Lewandowski, adversário no julgamento do mensalão, entrou pelos fundos. O comissário José Dirceu, depois de ter trocado de endereço, chegou acompanhado por uma centena de companheiros parrudos.
O PMDB continua sendo o partido com maior número de prefeituras (1.025) mas, pela primeira vez, perdeu na soma dos votos. O PSDB elegeu 693 prefeitos com 13,9 milhões de votos, perdendo 13% dos municípios e 4% dos votos.
Qualquer projeção de resultado eleitoral com base em resultados do primeiro turno é uma ousadia aritmética e as especulações nacionais a partir de números municipais são exercícios de quiromancia. Os números de domingo fixam três personagens vitoriosos: o mineiro Aécio Neves, o pernambucano Eduardo Campos e o carioca Eduardo Paes, mas falta São Paulo.
Se Nosso Guia eleger Fernando Haddad, sairá desta eleição maior do que entrou. Se perder, pobre Lula. Assim como ninguém poderá dizer que o PT perdeu a eleição tendo vencido em São Paulo e saído do pleito com mais de 14 milhões de votos, os companheiros terão dificuldade para cantar vitória tendo perdido também em Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife.
A ascensão de Celso Russomanno mostrou que costuras partidárias, marquetagens e tempo no horário de propaganda gratuita são incapazes de decidir um pleito. Sua implosão provou que pesquisa é uma coisa, e eleição, outra. A de domingo mostrou as limitações da futurologia. Noutro aspecto, indicou as limitações da passadologia.
Continua em vigor a sabedoria convencional do cinturão petista da periferia de São Paulo. Haddad conseguiu recuperar os votos da periferia que escorregavam na direção de Russomanno e ficou com o maior pedaço desse eleitorado. Não existe cinturão petista. Se existisse, nas pesquisas de setembro, Russomanno não teria conseguido 38% das preferências na região. O que existe é um pedaço da cidade onde, depois de oito anos de exercício da prefeitura, o tucanato ainda não se fez ouvir.
Há dez anos havia no Rio de Janeiro o fator passadológico da zona oeste. Nela, políticos como Anthony Garotinho e Cesar Maia, com oito anos de poder estadual e 12 na prefeitura, estariam protegidos. Pois no domingo, o candidato Rodrigo Maia (filho de Cesar), que tinha como vice Clarissa Garotinho (filha de Anthony e de Rosinha, sua sucessora) conseguiu 5,4% dos votos, com 0,91% em Campo Grande. O cinturão carioca também não existia. Tanto na periferia de São Paulo como na zona oeste do Rio concentram-se eleitores de baixa renda.

Desequilíbrio entre oferta e demanda faz SP parar no tempo


DIRETOR-GERAL DO DATAFOLHA
ALESSANDRO JANONI
DIRETOR DE PESQUISA DO DATAFOLHA
Como resultado das notas atribuídas pelos moradores dos 96 distritos de São Paulo a 27 aspectos do cotidiano, conclui-se que pouca coisa melhorou na capital nos últimos quatro anos na percepção da população.
Do total, apenas oito distritos conseguiram médias superiores às verificadas na versão anterior do DNA Paulistano, realizada em 2008.
Já 22 distritos recebem notas inferiores às observadas há quatro anos. Os 66 restantes apresentam desempenho estável no mesmo período.
Ao se observar no mapa da cidade os distritos que pioraram nos últimos anos, percebem-se duas grandes manchas. Uma é localizada no extremo leste e configura uma faixa que corta a região no meio e reúne Ermelino Matarazzo, São Miguel Paulista, Itaquera, Parque do Carmo, José Bonifácio, Cidade Tiradentes e Iguatemi.
A outra mancha de involução começa no extremo norte, nos bairros de Tremembé e Mandaqui, desce por Vila Medeiros e Vila Maria, contempla Tatuapé e Água Rasa, na zona leste, contorna o centro pela Mooca, Belém e Liberdade, passa pelo Jardim Paulista, na zona sul, e chega à zona oeste por Pinheiros e Alto de Pinheiros.
Gabo Morales/Folhapress
O centro de São Paulo visto a partir do Terraço Itália
O centro de São Paulo visto a partir do Terraço Itália
Pelos dados, percebe-se que uma explicação possível para os resultados encontra-se no desequilíbrio entre oferta e demanda nas diferentes regiões da cidade.
Com a economia controlada e a distribuição desigual de serviços públicos e privados pelo município, a população de áreas mais carentes tende a buscar aquilo que não tem em seu bairro nos distritos com mais estrutura, mais próximos à região central.
Essa dinâmica gera reflexos inevitáveis nos mais diversos aspectos do centro expandido, inclusive no trânsito.
Quanto aos bairros que melhoraram, não se percebe concentração geográfica expressiva em determinada região. Os distritos que mais subiram no ranking geral da cidade --Sapopemba e Jardim São Luís-- ficam, respectivamente, nas zonas leste e sul.
A base do desempenho positivo, nos dois casos, sustenta-se muito mais em ações de natureza comunitária e cultural do que propriamente em benfeitorias estruturais.
Sobre o ranking dos distritos, aliás, vale destacar a evolução do Carrão, bairro da zona leste que, em 2008, ocupava a 36ª posição e hoje figura no sétimo lugar. Dos 27 itens avaliados no bairro, 16 conseguiram notas mais altas do que há quatro anos.
Os bairros que lideram o ranking de 2012 já estavam no topo em 2008 --Alto de Pinheiros, Vila Mariana e Consolação ficam com as maiores médias. A exceção é o Jardim Paulista que caiu da segunda para a oitava colocação, abrindo espaço para Vila Leopoldina, Moema e Lapa. No geral, os bairros com as maiores médias compõem o centro expandido da capital.
Na lanterna, o desempenho positivo da Brasilândia, que melhorou ligeiramente sua média em relação a 2008, jogou o extremo sul para a posição --figuram ali os bairros de Parelheiros, Jardim Ângela e Marsilac. As menores médias no geral localizam-se nos distritos da periferia.
Em um cenário que pede mudança, o próximo prefeito terá como tarefa importante solucionar a equação do desequilíbrio, gerando ofertas adequadas às demandas específicas de cada região, para que, daqui a quatro anos, a maioria dos 96 distritos apresente médias de satisfação maiores que as de 2012, no DNA Paulistano de 2016.