terça-feira, 20 de agosto de 2024

Machadão, a linha de trólebus mais cenográfica de São Paulo, Vicente Vilardaga, FSP

 Vicente Vilardaga

São Paulo

No fim de semana teve Jornada do Patrimônio. Parece pouco, mas não é. Trata-se de um dos programas mais legais da cidade, com museus abertos e grátis e shows ao ar livre. A jornada serve para que o cidadão reforce seus laços culturais e afetivos com a metrópole e circule em busca de referências históricas de sua própria identidade.

Um dos itens da programação é o Roteiro de Memória, em que um especialista guia o público por lugares esquecidos ou inusitados de São Paulo onde a história aconteceu. Diante da falta de vestígios físicos, o que resta é imaginar os locais do passado. Como costuma acontecer nesta cidade, as marcas da memória tendem a desaparecer rapidamente.

A primeira vez que participei da Jornada do Patrimônio foi em 2019. O roteiro era "Prostituição e confinamento: um percurso pela antiga zona do baixo meretrício do Bom Retiro (1940-1953)", guiado pela
antropóloga Paula Janovitch. Fiquei maravilhado com os relatos sobre a região, Paula levava diversas fotos para substituir a falta de prédios antigos no triângulo entre as ruas dos Timbiras e Cesare Lombroso.

Mais antiga linha de trólebus de São Paulo liga o bairro de Perdizes à Aclimação

Dessa vez a experiência foi num ônibus, mais precisamente num trólebus, conhecido como Machadão, por conectar a rua Cardoso de Almeida, em Perdizes, com a rua Machado de Assis, na Aclimação. Os veículos têm aquelas duas hastes ligadas à rede elétrica e são climatizados. Fazem também uma rara homenagem para Machado de Assis em São Paulo.

A linha de trólebus traça uma narrativa da cidade em meados do século 20, quando teve grande desenvolvimento imobiliário. É uma aula de educação patrimonial. Entre 1930 e 1960, nos tempos do prefeito Prestes Maia, o Centro passou por uma profunda reforma urbanística, avenidas foram abertas e surgiram novos bairros de classe média.

A característica principal do Machadão é cruzar muitos pontos turísticos da cidade. Pacaembu, Higienópolis, prédios do arquiteto João Artacho Jurado, rua Major Sertório, território afro-oriental da Liberdade, Cambuci, Pateo do Collegio, Mosteiro de São Bento, Viaduto do Chá, Galeria Metrópole são só alguns exemplos de lugares do percurso. Pode ser considerado o trólebus mais cenográfico da cidade.

Jornada do Patrimônio
Participantes do roteiro Machadão se reúnem em frente ao ônibus para uma foto coletiva

É também a linha mais antiga em funcionamento. Pode ser considerada um prolongamento da via inaugural de 1949, que ligava a praça João Mendes, no Centro, à praça General Polidoro, na Aclimação. Depois, esse percurso foi ampliado até a rua Cardoso de Almeida e até a rua Machado de Assis.

Em abril deste ano, o sistema de trólebus completou 75 anos em São Paulo, onde está a maior frota desse tipo de veículo no Hemisfério Sul. São 200 distribuídos em nove linhas.

Na Jornada do Patrimônio, o trólebus ficou lotado, com cerca de 60 pessoas, muitas de pé, interessadas em conhecer mais sobre a cidade e fazer isso usando transporte público. "Vi que mais gente do que eu imaginava tem interesse em fazer turismo em ônibus", afirma Maria Luiza Paiva, coordenadora do "Circulando Essepê", organizador do evento.

Nesse momento, o ônibus se torna um local de intercâmbio cultural e de turismo. Pela janela passa o cinema da cidade, com prédios históricos e lugares que desapareceram porque ganharam novos usos.

Machadão
Crianças brincam no Machadão: turismo de ônibus tem público surpreendente e variado

No público havia muitas famílias de pais com crianças, estrangeiros, moradores de Perdizes que usam o ônibus normalmente e curiosos interessados na experiência de percorrer uma linha ancestral ou em descobrir alguma informação pouco divulgada. Um ou outro estava interessado em debate. Tinha muito diálogo entre os viajantes. O caminho de ida e volta durou 1h30, com uma escala de 15 minutos na Aclimação.

Durante a o percurso do Machadão, na Jornada do Patrimônio, cumpri a função de mediador, contando histórias e guiando os espectadores para as referências arquitetônicas da cidade.

A experiência do turismo urbano interno se tem expandido nos últimos anos. Cada vez mais pessoas querem conhecer melhor a cidade onde vivem e visitar suas atrações. Também há um interesse em encontrar novos locais que fujam do óbvio. É aí que entra o Machadão.


Musk está errado; nem por isso Moraes está certo, Joel Pinheiro da Fonseca - FSP

 No novo capítulo de sua briga com Alexandre de Moraes, Elon Musk demitiu toda a equipe do escritório brasileiro da rede X e declara que a rede não obedecerá às ordens de bloqueio de contas e envio de informações de usuários. Por enquanto, ela segue funcionando, mas se continuar desobedecendo e não pagar as multas, logo terá que ser fechada.

Mesmo quando erra, o Supremo erra por último. Nenhuma empresa, brasileira ou estrangeira, pode se dar ao luxo de desobedecer decisão judicial, não importa o quão injusta ela pareça. Em alguns casos de flagrante imoralidade, é admirável o ato de quem se recusa a obedecer à lei injusta e aceita as consequências de seu ato, mesmo que com grande custo pessoal. Qual o custo pessoal para Musk? Sua fortuna não será afetada e será ainda mais adulado pelo público de direita que ele adotou como sua plateia preferencial. Seus funcionários pagarão o preço com seus empregos, e os usuários brasileiros com o possível corte do serviço.

Foto mostra Montagem de foto do Mega-empresário Elon Musk, à esquerda, ao lado do Ministro do STF Alexandre de Moraes. à direita.
O empresário Elon Musk e o ministro Alexandre de Moraes - Gonzalo Fuentes/Reuters e Adriano Machado/Reuters

Entre repetidas previsões (ou seria torcida?) de guerra civil na Europa e bravatas inócuas contra Maduro, ele tomou a causa da liberdade de expressão no Brasil como mais uma bandeira. Em abril, revelou algumas ordens sigilosas que o TSE teria feito em 2022. Na época, Musk fez sua acusação mais grave contra o TSE: a de que o X recebera ordem de não apenas suspender contas mas de também mentir publicamente acerca do real motivo dessa suspensão. Até hoje não mostrou prova da acusação.

Na nova rodada, além de divulgar as ordens sigilosas, recusa-se a obedecê-las. Ao fazê-lo, alimenta ainda mais o discurso a favor dos inquéritos do Supremo: o de que há pessoas nas redes que se julgam acima das leis brasileiras.

Showzinhos de Musk à parte, o questionamento do Supremo é importante. Temos já uma semana de revelações de conversas de Eduardo Tagliaferro —então perito da Assessoria de Enfrentamento à Desinformação do TSE— com auxiliares de Moraes no Supremo.

A decisão de bloquear uma conta vinha antes. O relatório justificando o bloqueio era então pedido, feito e entregue. Quando o próprio perito do TSE não via nos posts algo que justificasse medidas cautelares —como no caso da revista Oeste— era aconselhado a olhar de novo e "usar a criatividade". Alexandre de Moraes, enquanto relator do inquérito das fake news, precisava de um relatório feito por uma assessoria especial do TSE? Não. Poderia ele próprio anexar os posts que julgasse relevantes no inquérito e proceder às ordens de bloqueio. Mas então por que o pedia? É tudo parte de um teatro para mascarar que, em tudo que se liga ao inquérito das fake news (que corre desde 2019), a única coisa que importa é a vontade de Alexandre de Moraes, falível como todo mortal?

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A matéria publicada nesta segunda relata que Moraes pediu dados e bloqueio de contas que promoviam protestos contra ele no exterior. Qual a linha entre fomentar um golpe de Estado e o protesto legítimo? A crítica junto à opinião pública é uma primeira barreira contra o apagamento desse limite.

O Brasil viveu uma tentativa real de golpe. O indiciamento dos responsáveis pelos bloqueios rodoviários da PRF no dia do segundo turno ressalta esse ponto. Naquele dia, a ação decisiva do TSE —para desmobilizar os bloqueios e recusar a extensão do horário do pleito, como pedido pelo PT— salvou nossa democracia. Ao mesmo tempo, o inquérito das fake news e o das milícias digitais permanecem como fonte constante de decisões questionáveis, restrições à liberdade dadas com pouquíssimo embasamento, embaraço quanto à informalidade no proceder e alimentam uma suspeita crescente do Supremo. É preciso voltar à normalidade.

Debate sobre Lava Jato reúne ex-procurador Deltan e advogado Bottini, FSP

 O ex-procurador Deltan Dallagnol, que coordenou a força-tarefa da Lava Jato, e o criminalista Pierpaolo Bottini, que é crítico dela, participarão de um debate na próxima sexta-feira (23) sobre o legado da operação.

A imagem apresenta um cartaz de um evento intitulado '10 ANOS LAVAJATO: HERANÇA, LEGITIMIDADE E SALVAGUARDAS NO BRASIL?'. No cartaz, estão duas figuras masculinas, uma à esquerda e outra à direita, ambas vestindo trajes formais. O fundo é escuro, e há elementos decorativos na parte inferior. O texto inclui os nomes dos palestrantes e a data do evento.
Card anunciando debate entre advogado Pierpaolo Bottini e ex-procurador Deltan Dallagnol sobre a Lava Jato - Reprodução

O encontro, marcado para as 16h30 na Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), tem o título de "10 anos da Lava Jato: herança maldita ou salvação do Brasil?".

O evento deve abordar também as recentes revelações feitas pela Folha de procedimentos fora do rito oficial adotados pelo ministro Alexandre de Moraes (STF) na coleta de provas para os inquéritos contra bolsonaristas que ele comanda.