segunda-feira, 25 de julho de 2022

Tontura, fadiga e falta de ar podem indicar doença cardíaca, NYT FSP

 Jane E. Brody

THE NEW YORK TIMES

Ned Hallick, especialista em iluminação acostumado a transportar equipamentos pesados, tinha 63 anos quando notou pela primeira vez episódios ocasionais de tontura. Até que um dia, Hallick, que mora em Nova York, disse-me: "Fiquei tão exausto que subir as escadas do metrô era como escalar uma montanha."

Seu clínico geral, suspeitando de um problema no coração, solicitou vários exames, incluindo um eletrocardiograma, e, com base nos resultados, encaminhou-o a um cardiologista. Diagnóstico: fibrilação atrial, a anomalia do ritmo cardíaco mais frequente.

A doença ocorre quando os átrios, as duas câmaras superiores do coração, batem rápida e caoticamente, fora de sincronia com os ventrículos, as câmaras cardíacas de bombeamento inferiores, que são responsáveis pela circulação do sangue por todo o corpo. Os ventrículos podem ser incapazes de bombear sangue suficiente para atender às necessidades do corpo, resultando em circulação lenta, fadiga e falta de ar.

Ilustração de um homem em uma esteira. A faixa da esteira é um eletrocardiograma
Fibrilação arterial é o mais comum tipo de arritmia - Gracia Lam/The New York Times

fibrilação atrial afeta cerca de três milhões de adultos nos Estados Unidos, número que deve quadruplicar na próxima década à medida que a população envelhece e fatores de risco como obesidade, diabetes e pressão arterial alta se tornam ainda mais comuns. O risco ao longo da vida de desenvolver a doença é superior a 20 por cento, mas muitas pessoas nem mesmo sabem que têm a doença.

O diagnóstico apropriado e o tratamento imediato, no entanto, podem salvar vidas. Em um relatório publicado no "The New England Journal of Medicine", em janeiro de 2021, o dr. William G. Stevenson e o dr. Gregory F. Michaud, cardiologistas do Centro Médico da Universidade Vanderbilt, no Tennessee, escreveram que a fibrilação atrial não tratada pode aumentar o risco de AVC (cidente vascular cerebral) quatro vezes mais nos homens e cerca de seis vezes nas mulheres, e pode aumentar o risco de insuficiência cardíaca três e 11 vezes, respectivamente.

Também está associada à demência, provavelmente resultado de AVCs e perturbações na circulação para o cérebro causadas pelo ritmo cardíaco irregular. A condição é direta ou indiretamente responsável por mais de 158 mil mortes por ano.

COMO SABER SE TENHO FIBRILAÇÃO ATRIAL?

Os afetados pela doença podem sentir o coração disparar ou palpitar periodicamente por vários minutos a cada vez, ou podem notar episódios ocasionais de falta de ar, tontura ou fadiga excessiva devidos ao esforço.

Os sintomas podem ser desencadeados pelo consumo excessivo de álcool ou cafeína. Em algumas pessoas com a doença, os ritmos anormais vêm e vão, enquanto em outras persistem, e o coração fica impossibilitado de restabelecer um ritmo normal sem tratamento.

Infelizmente, muitas pessoas com fibrilação atrial, incluindo Hallick, não veem esses sintomas como anormais, especialmente quando desaparecem por conta própria.

Para confirmar o diagnóstico, seu médico pode solicitar um eletrocardiograma ou um teste ergométrico, ou você pode usar um monitor portátil durante várias semanas para checar se há ritmo cardíaco anormal. Esses testes ajudam a diferenciar a fibrilação atrial de condições menos graves que causam palpitação, como a ansiedade e o estresse.

COMO A FIBRILAÇÃO ATRIAL É TRATADA?

Se a fibrilação atrial for confirmada, seu médico pode tentar fazer o coração voltar ao ritmo normal usando um procedimento chamado cardioversão elétrica, em que uma corrente elétrica é aplicada ao tórax usando o desfibrilador. Você será sedado para o breve procedimento e não sentirá os choques.

Em longo prazo, a maioria dos pacientes com a doença pode ser tratada de forma eficaz e segura com medicamentos, geralmente betabloqueadores e bloqueadores de cálcio que ajudam o coração a manter o ritmo normal. Os pacientes também recebem um anticoagulante para prevenir a formação de coágulos sanguíneos.

Vários anticoagulantes atualmente populares, incluindo rivaroxabana, o mesmo que Hallick toma, têm efeitos anticoagulantes duradouros mesmo se o paciente perder uma dose ou duas, o que pode ajudar a evitar um AVC.

Esses anticoagulantes também não exigem monitoramento constante e repetido de seus efeitos na coagulação, ao contrário de seu predecessor varfarina, que foi por muitos anos o principal anticoagulante no tratamento de fibrilação atrial.

A varfarina tem uma vantagem importante em relação aos remédios mais recentes: uma reversão quase imediata de seu efeito anticoagulante, quando o paciente deve parar de tomá-lo para prevenir sangramento excessivo, por exemplo, antes de uma cirurgia ou depois de uma lesão.

OS MEDICAMENTOS PARA FIBRILAÇÃO ATRIAL PODEM PARAR DE FUNCIONAR?

Sim, foi isso o que aconteceu com Hallick. Ele se deu bem com o remédio durante sete anos até maio, quando um check-up de rotina revelou que, sem que ele soubesse, sua fibrilação atrial havia reaparecido e seu coração tinha uma frequência de 165 batimentos por minuto, cerca do dobro da taxa normal.

"Eu estava ficando um pouco sem fôlego e sentindo dificuldade para andar em subidas, mas desconsiderei isso. Pensei que agora tinha 70 anos e talvez estivesse realmente fora de forma por causa da pandemia."

Uma mudança de medicação e dois choques para tentar restaurar o ritmo cardíaco normal ajudaram apenas por um curto período, e Hallick acabou de passar por um procedimento que promete um benefício mais duradouro: a destruição das células ao longo da parede posterior do átrio esquerdo de seu coração que estão transmitindo sinais instáveis para os ventrículos.

O procedimento, chamado ablação, envolve a introdução de um cateter em uma veia até o átrio e normalmente queima ou congela as células erráticas.

QUAL É A EFICÁCIA DA ABLAÇÃO NO TRATAMENTO DA FIBRILAÇÃO ATRIAL?

Os ensaios controlados mostraram que, ao longo do tempo, a ablação é significativamente mais eficaz na correção da doença do que a terapia medicamentosa.

Em um estudo recente com 203 pacientes, a ablação preveniu com sucesso a doença um ano depois em cerca de 75% dos pacientes em um grupo, ao passo que a terapia com remédios ajudou apenas 45% dos pacientes em outro grupo. Em pessoas saudáveis como Hallick, a ablação muitas vezes pode ser feita em um ambulatório, seguida por alguns dias de atividade limitada enquanto o coração se cura da inflamação resultante.

De acordo com Stevenson, da Vanderbilt, alguns pacientes com fibrilação atrial persistente preferem se submeter à ablação em vez de tomar remédios de uso contínuo, que podem causar problemas de sangramento ou outros efeitos colaterais.

O benefício da ablação, entretanto, às vezes é adiado. Ele disse que, nos primeiros meses depois do procedimento, cerca de metade dos pacientes apresenta ritmo cardíaco anormal e pode precisar de choque ou terapia medicamentosa até que o coração se recupere do procedimento.

EXISTEM NOVOS TRATAMENTOS NO HORIZONTE?

Hallick está participando de um ensaio clínico em curso de um procedimento novo e presumivelmente mais seguro chamado ablação de campo pulsado, que destrói as células errantes fazendo furos nelas com choques elétricos. O procedimento é considerado mais rápido do que as outras técnicas de ablação como cauterização ou congelamento, e é menos suscetível de danificar o esôfago, que fica próximo ao átrio.

A nova técnica, conhecida comercialmente como Farapulse, foi aprovada para uso na Europa em janeiro, mas ainda não está licenciada nos Estados Unidos. Está sendo testada em um ensaio clínico controlado envolvendo pelo menos 350 pacientes em mais de 30 centros médicos americanos, incluindo o Sistema de Saúde Mount Sinai, em Nova York.

"Se vamos mudar, precisamos provar que a ablação de campo pulsada é claramente melhor e mais segura do que aquilo que fazemos agora", comentou Stevenson.

'Quero que todos tenham acesso', diz brasileiro em terapia inovadora contra câncer nos EUA, OESP

 Quando o cineasta Sebastião Dias Braga, de 37 anos, teve a notícia de que o câncer voltou mesmo depois de um transplante de medula, a sensação foi de choque e medo. Ele, que já havia passado por tantos tratamentos agressivos contra um tipo grave de leucemia, de repente se viu sem alternativas. Foram dias sem uma luz no fim do túnel até que uma possibilidade surgiu: participar de uma terapia ainda experimental - mas bastante promissora - nos Estados Unidos.

Há um mês, Braga e o marido Thiago Amaral, de 39 anos, estão no James Cancer Hospital, em Ohio. Lá, Tião, como é chamado pelos amigos, foi submetido a um tipo de terapia inovadora contra o câncer, o CAR-T Cell triplo. A terapia faz uma modificação genética nas células para induzi-las a combater a doença e é considerada a última fronteira nos tratamentos contra o câncer com origem no sangue, como leucemias e linfomas.

Tião e Thiago
Tião recebe terapia de modificação genética para combater câncer; o marido Thiago o acompanha em hospital nos Estados Unidos Foto: Thiago Amaral/Arquivo pessoal

“Ter a possibilidade de uma terapia avançada como essa é maravilhoso, é um alívio”, diz Tião. Ele descobriu a leucemia em março de 2020, depois de sentir dores nas pernas. Inicialmente, passou por quimioterapias mais leves, que fizeram a doença entrar em remissão. Meses depois, porém, o câncer retornou e, em abril do ano passado, Tião teve de passar por um transplante de medula.

A recuperação era difícil e lenta, mas, no início deste ano, a vida finalmente começava a entrar nos eixos - até que veio um novo revés. “No final de março, comecei a sentir sintomas no corpo. Diagnostiquei a recidiva da doença, 11 meses depois do transplante”, lembra. “É o momento mais crítico porque os médicos não podiam optar por fazer outro transplante.” Ele perguntou quanto tempo teria de vida e ouviu a palavra “meses”.

O cineasta já tinha escutado sobre a terapia CAR-T, mas sabia pouco sobre o tema. Por indicação de uma amiga, procurou o hematologista Vanderson Rocha, professor da Universidade de São Paulo (USP) e um dos principais pesquisadores da terapia no País. Foi ele quem sugeriu que Tião fosse incluído em um protocolo de pesquisa nos EUA, conduzido pelo também brasileiro Marcos de Lima, chefe do Programa de Transplante de Medula e Terapia Celular da Universidade Estadual de Ohio.

A partir de então, começou uma batalha para que Tião fosse aprovado como voluntário na pesquisa - é necessário um aval da Anvisa americana, a Food and Drug Administration (FDA). Também era preciso juntar dinheiro para pagar a viagem e o custeio de despesas médicas no hospital. Uma campanha online que contou com a participação de amigos e artistas arrecadou R$ 950 mil.

CAR-T triplo ataca três alvos do câncer

Tião e Thiago
Tratamento, chamado CAR-T triplo, ainda não está disponível no Brasil; Tião usa as redes sociais para destacar importância de desenvolvimento da tarepia no País Foto: Thiago Amaral/Arquivo pessoal

Lima, médico brasileiro que trabalha nos EUA há mais de 20 anos, iniciou uma pesquisa com células modificadas para atacar o câncer por três alvos diferentes - por isso, a técnica é chamada de CAR-T triplo. Diferentemente do CAR-T convencional, que ataca apenas um dos marcadores do câncer, a hipótese da equipe é de que o CAR-T triplo tenha mais sucesso na remissão da doença justamente por ser mais abrangente.

Uma possível vantagem seria evitar recaídas da doença. Segundo Lima, há relatos de recidivas em parte dos pacientes que fizeram o CAR-T convencional porque, ao atacar apenas um marcador específico presente em células tumorais, a doença encontra novas “brechas” para continuar agindo. O pesquisador diz que Tião foi o primeiro voluntário de que se tem notícia em uma pesquisa do tipo em todo o mundo.

A terapia começa com a coleta de linfócitos T, que são células de defesa, do paciente. Essas células são modificadas em um laboratório para se tornarem capazes de reconhecer e atacar as células tumorais. Depois disso, os linfócitos T são injetados novamente no paciente e, a partir de então, a expectativa é de que o próprio corpo comece a debelar o câncer. O objetivo final é a remissão da doença de forma duradoura.

A terapia com CAR-T convencional já é comercializada nos Estados Unidos e alcançou bons resultados em vários pacientes. A primeira a ser tratada com essa técnica se submeteu à terapia aos 6 anos de idade e hoje está com 16 - sem sinais da leucemia. No Brasil, até mesmo a terapia convencional com CAR-T avança lentamente por falta de incentivo. Não há esse tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pacientes que já passaram pelo procedimento tiveram de ser incluídos em grupos de centros de pesquisa brasileiros. “O Brasil está muito atrasado em relação ao CAR-T. Temos pessoas, só não tem dinheiro”, lamenta Rocha.

Em fevereiro deste ano, a Anvisa aprovou pela primeira vez um tipo de tratamento com CAR-T no Brasil, mas o acesso ainda esbarra nos custos elevados de enviar o material biológicos a laboratórios no exterior. Uma das soluções é fortalecer a produção de células modificadas em centros próprios: no mês passado, o governo paulista anunciou investimentos em dois núcleos de terapia celular avançada, ligados à USP e ao Instituto Butantan.

O momento de infusão das células modificadas em Tião foi acompanhado com emoção no hospital. Além de ser o primeiro teste com CAR-T triplo no mundo, também foi a primeira vez que o James Hospital fez a modificação das células no próprio laboratório - o que reduz custos e tempo de tratamento. Antes, era preciso enviar as células a laboratórios externos, que cobram caro para fazer a reprogramação genética.

Tião recebeu 40% das células modificadas - e teve febre forte dias depois, o que é um sintoma esperado. Agora a equipe avalia se será necessária a injeção do restante ou se a terapia até então será suficiente. “Esperamos que, com a evolução dos dias e com a batalha celular dentro do meu corpo, a doença entre em remissão o quanto antes e as células da medula comecem a se multiplicar normalmente, de forma saudável e consistente."

Dias após a infusão, a equipe médica detectou que as células geneticamente modificadas estavam se reproduzindo no corpo de Tião - o que é um primeiro bom sinal. Lima pondera que ainda é cedo para medir resultados da pesquisa: uma conclusão sobre a eficácia do tratamento CAR-T triplo deve ser alcançada somente após dois anos, mas há motivos para ter esperança. Depois de Tião, outro paciente deve receber a terapia experimental nesta semana.

Planos para o futuro

Tião e Amaral dizem que escolheram continuar acreditando na cura. E fazem planos. “Às vezes sinto muita saudade da vida que tinha antes, mas ela não existe mais, e isso é maravilhoso porque a vida é cíclica”, diz o cineasta. Todo o tratamento, afirma ele, fortaleceu os laços com a família e amigos. O sonho é expandir ainda mais os afetos: “Penso em ter filhos e ter saúde para construir nossa família.”

Além de projetos individuais, ele diz que é um “caminho sem volta” perceber as necessidades sociais e coletivas do Brasil na área da saúde e, especificamente, no combate ao câncer. “Quero voltar minha vida para que o CAR-T se torne acessível no SUS, para que qualquer pessoa possa realizar esse tratamento que estou realizando hoje.”

Energia produzida a partir do lixo é arma contra aquecimento global, Eduardo Geraque OESP

 Há mais de 10 anos o Brasil tem uma Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). E mesmo com esse marco legal em curso, a situação nacional está longe de ser positiva. Conforme dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), 40% das 76,1 milhões de toneladas de resíduos sólidos coletadas anualmente no País estão depositadas em lixões. 

Usina de transformação de resíduos em energia
Funcionário trabalha em usina de transformação de resíduos em energia instalada na cidade Wujiang de Suzhou, na China. Foto: Aly Song/Reuters

Isso gera tanto um problema ambiental – o metano que sai do lixo é um gás que superaquece a atmosfera – quanto de saúde pública, pois o chorume que escorre das montanhas de resíduos a céu aberto contamina os rios.

Apesar de avanços nas áreas de disposição final de lixo e no incremento da economia circular e da reciclagem industrial - e o Brasil é o país que mais recicla latas de alumínio no mundo, por exemplo -, há muito a ser feito. Produzir energia a partir do lixo, por exemplo, é uma estratégia para reduzir a poluição ambiental e ainda economizar recursos. 

“Por mais que não seja uma bala de prata, e que tenhamos que focar nos 3Rs (redução, reutilização e reciclagem), a energia do lixo é uma tecnologia com muito potencial para somar, dentro da nossa realidade. Não é nenhuma aventura e não estamos inventando nada. Existem hoje por volta de 2,5 mil usinas no mundo, mais de mil apenas no Japão”, afirma Rubens Aebi, vice-presidente da Abren (Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos). 

Usina de energia de resíduos
CopenHill, uma usina de energia de resíduos localizada em Copenhague, Dinamarca. Foto: Wolfgang Rattay/Reuters

Na prática, as usinas que operam a partir dessa lógica defendida por Aebi incineram a parte orgânica do lixo e, a partir disso, geram energia elétrica tradicional. “É uma tecnologia totalmente segura do ponto de vista ambiental, que gera energia limpa e ainda diminui a necessidade do aterro sanitário para sempre”, explica Aebi. 

Segundo o executivo, além de reduzir a emissões de gases como o metano, e baixar o volume de lixo em 95%, os 5% restantes, em forma de cinzas, podem ser usados, por exemplo, na construção civil. “É um material totalmente inerte”, explica.

Apesar de ser usada há décadas em países europeus – e cidades como Paris e Zurique têm suas instalações que queimam lixo na frente de todos – esse tipo de tecnologia não conseguiu, ainda, eliminar por completo a necessidade de se construir aterros sanitários, afirma Carlos Silva Filho, diretor presidente da Abrelpe. 

“Não podemos colocar o carro na frente dos bois. É preciso que sejam feitos estudos de viabilidade técnica muito precisos para se entender se esse tipo de tecnologia é ou não viável, tanto do ponto vista econômico quanto até ambiental”, explica o executivo da Abrelpe. 

“É uma solução possível dentro das várias outras e respeitando condições específicas. Nenhum país do mundo deixou de ter aterros por isso. Não pode ser tratada como uma panacéia”, pondera Silva Filho, para quem o Brasil, antes, deveria focar no aumento da reciclagem de seu lixo e em ações que favoreçam, por exemplo, a compostagem da fração orgânica dos resíduos sólidos.

“Essas usinas de energia a partir dos resíduos sólidos têm um potencial bastante interessante para o Brasil. Temos uma quantidade apreciável de resíduos que depende de uma solução definitiva. Ao meu modo de ver, os aterros sanitários são apenas soluções temporárias, em que áreas extensas permanecem mobilizadas e quase sempre ficam contaminadas, deixando um legado negativo para as gerações futuras”, afirma Marco Aurélio dos Santos, professor associado do programa de planejamento energético da Coppe/UFRJ.

De acordo com o especialista, apesar do preço alto do primeiro leilão realizado no ano passado pelo governo federal para a venda de energia, deve-se investir mais nessa nova tecnologia até para que ela possa baratear no futuro, assim como ocorreu com os equipamentos usados na geração das energias solar e eólica. “Esse novo paradigma poderá ser uma das soluções, mas não o único”, diz Santos.

O leilão realizado em 2021 deverá colocar no sistema ao menos 12 MW – a um custo de R$ 549 o MWh – que deverão ser produzidos a partir de 2025 em uma usina térmica na cidade de Barueri, na Grande São Paulo. A usina deverá ser construída por R$ 520 milhões. Se tudo der certo e ela começar a operar será a primeira instalação do gênero na América Latina. 

Aterro Sanitário Jardim Gramacho
Aterro Sanitário Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, quando ainda estava em funcionamento, em 2012. Atualmente, o local está desativado. Foto: Marcos de Paulo/Agência Estado (17/04/2012)

“Estes 12MW não são significativos para suprir a demanda, mas não deixa de ser importante para mostrar que essa opção de geração de energia pode ser uma das alternativas viáveis que temos”, explica o pesquisador da Coppe. Em setembro, outros leilões devem ocorrer. 

Pelas estimativas da Abren, com 56% do lixo urbano produzido nas 28 regiões metropolitanas do Brasil com mais de 1 milhão de habitantes seria possível abastecer 27 milhões de residências. “Em regiões com menos de 600 mil habitantes não existe viabilidade econômica. Seria preciso, de repente, fazer consórcios entre os municípios”, afirma Aebi. “Essas usinas custam entre R$ 500 milhões a R$ 1 bilhão.”