segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

“A era dos gurus e de endeusamento acabou”, afirma Satyanatha, OESP

 Sonia Racy

04 de janeiro de 2021 | 00h50

Davi Satyanatha Murbach. Foto: Camila Svenson

Após 12 anos solitários, sete em um monastério budista na ilha de Kauai, no Havaí, Davi Satyanatha Murbach, conhecido como Satyanatha ou apenas Sat, sabe fazer as palpitações da ansiedade desacelerarem. Em tempos de pandemia, provocada pela covid-19, o mestre em meditação distribui suas mensagens de equilíbrio em palestras para empresas ou então por meio de vídeos no aplicativo “Vivo Meditação”, onde registra 1,4 milhão de downloads. A voz mansa com que guia seus alunos deverá ser ouvida também pelo Waze. Vai surpreender motoristas no trânsito, por meio de frases como: “Perdoe a si mesmo e siga adiante”. Além disso, o seu livro Seja Monge será lançado em audiobook este mês.

Antes mesmo dos casos de líderes espirituais famosos, acusados de abusar sexualmente de suas discípulas, Sat já rejeitava o título de guru. Em 2018, eclodiram os escândalos de João de Deus e Sri Prem Baba. Em 2020, foi a vez de Tadashi Kadomoto. Sat acredita ser perigoso o líder assumir a responsabilidade pelo crescimento espiritual de quem se entrega a ele. A seguir, os principais trechos da entrevista, concedida à repórter Paula Bonelli por videoconferência.

Por que há tantas denúncias e casos de discípulas abusadas por gurus?

A humanidade ainda tenta endeusar certos gurus e isso torna tudo muito pior. A época dos gurus e de endeusamento acabou, absolutamente acabou. Quem é um guru? Guru é um grande mestre, que tem tanta luz, que assume a responsabilidade pelo crescimento espiritual de quem se entrega a ele. Só que essa história de você se entregar a alguém é muito perigosa. Eu não sou um guru. Sou um mestre em meditação e quero que cada pessoa seja o guru dela mesma.

Todo monge é celibatário?

Não, os maiores sábios da Índia, os rishis, tinham suas amadas companheiras, assim como alguns mestres Zen. Conheci lá Swami Gitananda e sua extraordinária esposa. Mas é também importante entender beleza do celibato como uma técnica extremamente valiosa.

Sobre seus próximos projetos, deve gravar para o Waze?

A minha proposta é gravar um pouquinho para a paz no trânsito. Então assim: “Vamos começar a sua viagem, respire, abra o coração com gratidão e vire à direita… Eu vou gravar em breve no estúdio para lançar este ano. O trânsito já é cansativo, um pouco irritante, algumas pessoas vão precisar disso. Uma voz que vai te acalmando, falando, ‘olha, em 200 metros respire, seja grato e vire à esquerda’. Pode ajudar.

Quais são lições do audiobook Seja Monge?

São as seguintes lições: a gente costuma deixar que a vida indique para nós como vamos nos sentir. Se está sol, a gente se sente feliz, se choveu no dia da praia, a gente fica triste. Então se alguém te trata mal, pronto, aquela pessoa te condena a ficar de mau humor algumas horas. E isso é estar à mercê das circunstâncias. O monge aprende o contrário, desenvolve a nossa capacidade de controlar a mente.

O negativismo é grande em uma pandemia.

Sim, isso foi muito visível no ano de 2020. A pandemia é algo dificílimo, as pessoas com muita dor. A interpretação delas muda a qualidade da experiência. Então as pessoas dizem: ‘olha, um ano desgraçado, não aguento mais’. É verdade. Mas elas ficam amarguradas. Se por outro lado a pessoa pensa: ‘esse foi um ano super difícil, mas eu aprendi a ficar um pouco mais com a minha família, descobri que gosto de trabalhar em casa, e me disciplinei melhor’. Isto é muito importante. O meditador começa a olhar qual é a reação dele em relação aos fatos desagradáveis. Eu não controlo o fato, mas controlo a minha reação. E tem um monte de meditações que vão te ensinando a se tornar alguém com capacidade de ser um arquiteto de si mesmo. E, em última instância, o monge simplesmente é alguém que sempre tenta estar em contato com esse mono, esse um.

Como a crise sanitária afeta a vida emocional das pessoas?

Estamos vivendo duas pandemias simultâneas, uma de vírus e uma de uma doença cognitiva. Isso é muito evidente na política e nos relacionamentos pessoais. A vida rasa nos últimos anos, provocada pelo imediatismo, ficou evidente com o vírus. Quando há políticos brigando para ver quem vai conseguir a vacina primeiro, significa que estamos vivendo uma pandemia de doença do coração, pandemia de falta de empatia, de falta de clareza, de capacidade mesmo de pensar.

Acha que no começo da pandemia, isso foi pior?

Havia um desespero muito grande deste tempo ser o do fim do mundo. Eu sentia a atmosfera energética num susto, num medo. Agora estamos vivendo o rebote disso: as pessoas estão se recusando a ter medo da covid-19. Outro lado igualmente maluco.

As pessoas buscam por um significado maior na vida?

Elas têm uma necessidade muito profunda de significado, mas sequer percebem. Então, às vezes você assiste alguma coisa na plataforma Netflix e aquilo te dá entretenimento, vai dormir e muitas vezes acorda estressado no dia seguinte. Se em lugar disso você optar por algo que tenha maior significado, ligar para um amigo importante, deixar a conversa te enriquecer, você não está apenas se entorpecendo. É algo mais profundo. As experiências de significado são um antídoto para essa loucura aparente do mundo.

A medicina reconhece o valor da meditação para saúde?

Com muita evidência. Tem comprovação científica das universidades Stanford, Harvard, entre outras. O ser humano foi feito para entrar em pânico e depois se acalmar. Porque nós não somos predadores, a gente não é tigre, é presa, éramos devorados. Então nosso estresse foi feito pra ser de curto prazo, algo nos estressa, a gente sai correndo, sobrevive e acalma. Com o desenvolvimento da civilização, o perigo parou de ser só o tigre. Se tem uma deadline chegando aquilo vai te estressando, se tem dificuldade financeira de pagar uma conta aquilo te estressa dias consecutivos. O ser humano, fisiologicamente, não está adaptado para estresse de longo prazo. No pico, o estresse joga um monte de adrenalina no seu sangue, um monte de substâncias, os vasos se dilatam, a respiração se torna mais intensa, tem toda uma adaptação física pra você aguentar aquele pico que pode ser longo.

E os efeitos no corpo?

Esse estresse gera doenças, inflamações, colesterol alto, insônia. Quando meditamos, você vai basicamente dizendo para o seu corpo: ‘está tudo bem, senão eu não estaria aqui respirando. Está tudo bem, senão meus olhos não estariam fechados. Está tudo bem, senão não estaria ouvindo essa musiquinha bonitinha’. E o corpo vai acreditando. E isso vai desligando todos os sistemas de alarme…

Perseverar na meditação é difícil?

Eu acho que isso se aplica a toda uma gama de instrumentos de automelhoria, como o exercício, como uma alimentação melhor, de benefícios inegáveis. Isso vem de uma dificuldade muito natural humana de decidir o que é importante. Cuidar de si mesmo é visto como egoísmo, e no fundo meditação é um presente para si. Então, quando você não está bem, quem mais sofre é você. Eu, por exemplo, não me aguento quando eu não medito.

Os meditadores confundem a meta com o método?

Sim, o que queremos mesmo não é virar um ótimo meditador nem uma pessoa muito religiosa, mas essa luz, essa paz. A humanidade confunde muito a meta e o método. As pessoas descobrem que meditação é um método ótimo, mas eu frequentemente tenho que lembrá-las qual é a meta. A meta é ser um bom ser humano, com uma autoconfiança profunda, para que tenha coragem de fazer o que é certo e muito difícil. As pessoas adoram dizer ‘ah, mas não deu’ e ‘ah, mas é complicado’. Então, o meditador é uma pessoa geralmente doce, mas muito corajosa e de certa maneira rebelde, até porque ela tem que ir contra o óbvio.

O que te deixa angustiado?

Cada pessoa tem um potencial gigantesco para superar a angústia, mas por causa do livre arbítrio, ela só será feliz e alcançará a própria grandeza se quiser. A minha angústia única na vida é olhar as pessoas e pensar assim ‘não precisava ser dessa maneira, você podia ser muito mais feliz’. E eu preciso ter a humildade de respeitar que cada um tem o seu caminho. Então dá vontade de ir lá, chacoalhar a pessoa e falar assim, ‘vem cá’. Mas não posso… eu não sou guru.


General usa 'tese de Mourão' para defender golpe contra STF, Marcelo Godoy, OESP ( um primor de texto)

 


Marcelo Godoy, O Estado de S.Paulo

04 de janeiro de 2021 | 10h00

Caro leitor,

Há muitas ilusões em nossa República. E uma delas é a crença do comprometimento de muitos militares bolsonaristas com a democracia. Só isso pode explicar a razão do silêncio diante de manifestações como a do general Paulo Chagas, que usa a patente para se identificar nas suas redes sociais e com ela disputou as eleições para o governo do Distrito Federal, em 2018, obtendo 7,5% dos votos. Chagas não comanda tropa há quase 14 anos, mas tem 161 mil seguidores no Twitter, vários deles fardados.

Paulo Chagas
General de Brigada do Exercito, Paulo Chagas, um dos alvos de mandados de busca no âmbito do inquérito das "fake news". Foto: Dida Sampaio / Estadão

O general comandou sua carga outra vez contra o Supremo Tribunal Federal, o que já o fez ser alvo de busca determinada pelo ministro Alexandre de Moraes em razão de ameaças à Corte. Chagas questionou a decisão do ministro Kassio Nunes, que ele chamou de "homem do presidente no STF" por "antecipar" o retorno à política de atingidos pela Lei da Ficha Limpa. Pregou pressionar os senadores por uma CPI da Lava a Toga. "Se não houver reação, ficarão caracterizados o conluio e o abandono dos princípios republicanos, indicando aos quartéis os sintomas da anomia!"

A tal anomia que ele vislumbra é o que autorizaria os liberticidas a destruir a democracia e a dar o golpe. Outros generais já fizeram raciocínio semelhante, como o vice-presidente, Hamilton Mourão, quando ainda era candidato. E alguns da reserva – mais discretos – voltaram ao tema na semana passada. É a tese do autogolpe do presidente, com apoio das Forças Armadas. Chagas escreveu: "Uma intervenção militar na política só se justifica se for para evitar mal maior do que o que causará e, além disso, tem que ser isenta de vieses políticos e, muito menos, promotora de candidatos a ditadores."

A frase do general é um primor de raciocínio tortuoso. Primeiro, porque não há golpe sem "viés político". Todo golpe é um ato político. No mundo de Jair Bolsonaro e de Chagas todos têm ideologia, exceto seu grupo. Pouco importa a falsidade das premissas, pois nenhum golpe é dado de acordo com a Constituição, se o que interessa é divulgar a ideia de que o Brasil não tem outro jeito, senão pela força e arbítrio. Entretanto, ninguém estará seguro em um país em que é possível se achar que as disputas entre cidadãos podem ser resolvidas fora da lei. Chagas parece desconhecer que o devido processo legal garante desde a propriedade até a vida.

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O coronel reformado do Exercito Carlos Alberto Brilhante Ustra presta depoimento sobre crimes durante o regime militar, na Comissão Nacional da Verdade, em Brasilia Foto: DIDA SAMPAIO/ESTADAO

Semeiam-se espantalhos pelo País, e o da anomia é só um deles. Trata-se de uma escolha. Assim como escolha é reverenciar um torturador como Carlos Alberto Brilhante Ustra, que executou prisioneiros sob a sua guarda, em vez de lembrar o general Manuel Luiz Osorio. O patrono da Cavalaria foi o primeiro brasileiro a atravessar o Rio Paraná e a pisar no Paraguai. Antes, escreveu aos soldados: "Não tenho necessidade de recordar-vos que o inimigo vencido e o paraguaio desarmado ou pacífico devem ser sagrados para um exército composto de homens de honra e de coração".

É por demais conhecida ainda – e esquecida por alguns generais – outra lição de Osório: "É fácil a missão de comandar homens livres: basta mostrar-lhes o caminho do dever." Depois de Bolsonaro flertar com o golpe ao discursar em manifestação em frente ao quartel-general do Exército, nenhum dos que ocupam cargos no governo demonstraram publicamente contrariedade pela tentativa do chefe de arrastar as Forças Armadas para o turbilhão da polarização política nacional. Um Exército só representará todo o seu povo enquanto estiver acima das disputas partidárias; sem isso, será mero instrumento de luta de facções.

Nos Estados Unidos, dez ex-secretários da Defesa – republicanos e democratas – condenaram a tentativa de apoiadores de Donald Trump de envolver os militares como juízes no processo eleitoral. Lá o exemplo de comprometimento com a Lei foi dado pelo chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, general Mark Milley ao lembrar, no dia dos veteranos, que ele e seus subordinados não prestam juramento a um líder, mas à Constituição. Eis o exemplo que mostra a todos o caminho do dever.

É ainda o exemplo que fez o chefe do Estado-Maior do Exército americano, general James C. McConville, encorajar seus subordinados a se vacinarem contra o coronavírus, assim como fez o comandante do Corpo de Fuzileiros Navais, David H. Berger. Ambos se deixaram fotografar sendo imunizados, algo que, dificilmente, veremos no governo de generais, como o da Saúde, Eduardo Pazuello.

Pazuello – nunca é demais repetir – é o gênio da logística que não conseguiu comprar seringas porque tentou cancelar a lei da oferta e procura e não encomendou vacinas por acreditar que a indústria farmacêutica dependia de nós.  Tentou com o chefe obrigar os brasileiros a assinarem um termo de consentimento para a vacinação, espalhando descrédito sobre os imunizantes.  Quando descobriu milhões de testes de covid-19 no depósito com a data de validade quase vencida, acreditou que a solução seria ampliar a data de validade. Tem dono de mercado que faz igualzinho quando a validade das salsichas está para vencer...

Assim está a Saúde brasileira. Empresários e trabalhadores ficam condenados ao isolamento social e às mascaras por falta de vacina e de seringas. Corre-se o risco nas empresas menores de um caso da doença paralisar o negócio e pôr em perigo os demais funcionários. E, enquanto as famílias vivem apreensivas e acompanham 50 países iniciarem a vacinação de seus compatriotas, a de Pazuello tem uma razão para comemorar. É que Stephanie dos Santos Pazuello, filha do ministro, que havia sido contratada por Marcelo Crivella para um cargo na prefeitura do Rio, foi mantida empregada na Secretaria de Saúde do Município pelo prefeito Eduardo Paes. 

Nesta quarta-feira, Pazuello citou que outros países, como o Reino Unido, também exige esse tipo de termo de consentimento da população que será vacinada.
Nesta quarta-feira, Pazuello citou que outros países, como o Reino Unido, também exige esse tipo de termo de consentimento da população que será vacinada Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O ministro Pazuello se comporta aqui como o chefe. Há sempre um filé para os seus. E, quando é exposto pela imprensa, tenta desqualificar o trabalho dos jornalistas. Logo após o fracasso da compra das seringas, a assessoria do general negou o problema. Mas a Saúde pediu ao Ministério da Economia que os fábricantes fossem impedidos de exportar a produção que se recusaram a vender por preço abaixo do mercado. Esse é o governo que mantém a vedação aos congelamentos de gastos militares com aviões e blindados, mas permite a possibilidade de que o dinheiro para comprar vacinas contra a covid-19 seja contingenciado.

Se manda quem tem o dinheiro, quem manda no governo Bolsonaro são generais que, como Pazuello e Chagas, parecem gostar de moldar os fatos e a realidade à sua vontade e às suas ideias. Devia ser desnecessário dizer que a fantasia de Chagas sobre um golpe sem ditadores só existe quando o alvo é a própria tirania. Fora disso, jamais um golpe deixou de propor um ditador: fosse Luís Bonaparte ou Costa e Silva. Os militares assumiram o poder em 1964 com a promessa de defender a democracia; criaram uma ditadura de 20 anos. Com Bolsonaro, muitos voltaram ao poder. E, assim como na França, após o retorno dos Bourbons, em 1815, aqui também Talleyrand poderia dizer: "Ils n’ont rien appris, ni rien oublié", "eles não aprenderam nada, nem esqueceram nada".

Marcelo Godoy

Marcelo Godoy

Repórter especial

Jornalista formado em 1991, está no Estadão desde 1998. As relações entre o poder Civil e o poder Militar estão na ordem do dia desse repórter, desde que escreveu o livro A Casa da Vovó, prêmios Jabuti (2015) e Sérgio Buarque de Holanda, da Biblioteca Nacional (2015).

Inspirado na ‘Geringonça’, Tarso Genro mira projeto de união da esquerda, OESP

 Ricardo Galhardo, O Estado de S.Paulo

04 de janeiro de 2021 | 18h20

Um dos primeiros líderes políticos a defender a criação de uma frente de esquerda no Brasil, ainda em 2016, o ex-ministro e ex-governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro (PT) vai buscar pontos de convergência entre nomes como Ciro Gomes (PDT), Fernando Haddad (PT), Guilherme Boulos (PSOL), Flávio Dino (PCdoB) e Marina Silva (Rede), entre outros, com vistas a construir a unidade do campo progressista nas eleições presidenciais de 2022.

A ideia, segundo Tarso, é seguir a metodologia usada pela esquerda portuguesa para construir a Geringonça, nome dado à inusitada aliança entre o Partido Socialista, Partido Comunista e Bloco de Esquerda, que há décadas disputavam a hegemonia do campo e se uniram para vencer as eleições de 2015 e governar o país ibérico.

Tarso Genro
Tarso Genro foi ministro de Lula e governador do Rio Grande do Sul Foto: Matheus Pé / Reprodução / Facebook Tarso Genro

Na série de entrevistas República e Democracia: o futuro não espera, que começa com Ciro, no dia 18, Tarso vai buscar os pontos de afinidade entre as principais lideranças da esquerda brasileira. Além dos nomes citados acima, aceitaram participar do debate Luiza Erundina (PSOL), Manuela D’Ávila (PCdoB), José Dirceu (PT), Aloizio Mercadante (PT) e Roberto Requião (MDB).

Na pauta das entrevistas, o ex-ministro vai explorar temas como economia, democracia e principalmente medidas para combater a pandemia do novo coronavírus, diante da política negacionista do governo Jair Bolsonaro.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apontado como possível candidato em 2022 – embora esteja barrado pela Lei da Ficha Limpa, não vai participar dos diálogos, ao menos no primeiro momento. Tarso quer tirar a questão da sucessão da pauta para não contaminar as conversas. “Vamos usar uma metodologia semelhante à da Geringonça. O objetivo é buscar afinidades em vez das divergências, retirando da pauta a sucessão de 2022”, disse ele.

O ex-ministro tem defendido a necessidade de união desde o impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016, quando criou o ‘think tank’ Instituto Novos Paradigmas (IDP), do qual fazem parte nomes importantes da esquerda brasileira e estrangeira, como o sociólogo português Boaventura de Souza Santos e o ex-juiz espanhol Baltasar Garzón.

Tarso não tem ilusões em relação às grandes diferenças que separam, por exemplo, Ciro do PT. Ele avalia que a “unidade não supõe uma candidatura só”, mas trabalha para a construção de um espaço de diálogo que possa manter os diferentes projetos unidos em um possível segundo turno contra o bolsonarismo.

“A construção de uma frente única de esquerda é algo que não pode ser avaliado antes do final deste ano. Pode ser que até lá amadureça. Hoje, temos duas ou três opções de enfrentamento ao bolsonarismo que devem se apresentar em separado, mas tem que ter desde o começo uma identidade em comum. A ideia é construirmos essa identidade e dar insumos para a discussão interna nos partidos”, disse ele.

Segundo o ex-ministro, os entrevistados foram avisados de que o objetivo é buscar convergências, não divergências. Nenhum tema, fora a sucessão de Bolsonaro, foi excluído da pauta, mas a abordagem das perguntas será no sentido de direcionar a unidade.

De acordo com Tarso, a série de entrevistas não deslegitima nem disputa espaço com outras iniciativas semelhantes como o fórum Direitos Já – que também inclui nomes da centro-direita – nem impede a ampliação do diálogo com outros campos da oposição a Bolsonaro.

“Esta é uma discussão interior do campo da esquerda. A ampliação é um passo paralelo e o debate entre grandes lideranças como ex-presidentes (como Lula e Fernando Henrique Cardoso) vai ficar para outro momento”, disse o ex-ministro.