quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Uma potência que cai


Luis Fernando Verissimo - O Estado de S.Paulo
Fluminense campeão por antecipação, Palmeiras na segunda divisão. O que pior se espera de um campeonato de pontos corridos e com bloco de rebaixados aconteceu: um líder disparado que torna as últimas rodadas supérfluas, a não ser para quem ainda busca consolo na classificação para uma das competições satélites, e uma potência que cai.
Defendo, solitariamente, a tese de que deveria haver uma espécie de liga de intocáveis, clubes que por sua tradição e pelo tamanho e poder econômico da sua torcida estariam imunes ao vexame do rebaixamento. Isto não eliminaria o ascenso e o descenso, ainda haveria lugar para os times que vêm de baixo subirem na vida. Apenas os grandes clubes, por pior que fossem nos campeonatos, e por pior administrados, não correriam o risco de cair. Estariam, por assim dizer, protegidos da sua própria incompetência.
Minha tese não é elitista nem sentimental. Se baseia em frio raciocínio capitalista. Qual é a lógica de um negócio que de uma hora para outra mutila o seu próprio mercado, tirando de cena uma das suas maiores atrações e dispensando o seu público? Eu sei, eu sei. As estatísticas mostram que as grandes torcidas não abandonam o time rebaixado, antes reforçam a sua devoção para ajudar a tirá-lo do buraco. O que é muito bonito, mas não esconde o fato de que grandes organizações profissionais como o Palmeiras são obrigadas a se submeter a regras amadorísticas.
Shakespeare sabia que a morte de um comum pode ser trágica mas só a morte de reis dava boas peças. Uma potência que cai tem ressonâncias e implicações que fazem pensar, como a queda dos reis shakespearianos, na transitoriedade da glória fugaz, e nunca é um espetáculo menos que impressionante - mesmo que a imagem que perdure seja apenas a de uma torcedora enxugando as lágrimas com a camiseta do clube.
Mas eu não deveria estar escrevendo tudo isto. Ultimamente minha única alegria como torcedor tem sido a de poder dizer que, falem o que falarem dele, o Internacional jamais caiu para a segunda divisão.

Governo Paulista quer vender o Ibirapuera, do blog do Juca Kfouri


Por R$ 168 milhões o governo de São Paulo quer vender o Conjunto Esportivo Constâncio Vaz Guimarães, no Parque do Ibirapuera, inaugurado em 1957, palco, por exemplo, dos Jogos Pan-Americanos de 1963, e objeto de formidável reforma no ano passado.
Trata-se de uma área de mais de 100 mil metros quadrados e com quase 90 mil metros quadrados de área construída.
A mesma tentativa, sete anos atrás, foi feita pelo mesmo governador Geraldo Alckmin, barrada, então, pela firme atuação do secretário de Esportes à época, Lars Grael.
A proposta visa irrigar a Companhia Paulista de Parcerias, com os recursos distribuídos para as Parcerias Público-Privadas no estado, e está contida no Projeto de Lei do Governador de São Paulo de número 650.
Outras 549 propriedades do governo paulista, por todo o Estado de São Paulo, estão postas à venda, segundo foi encaminhado à Assembleia Legislativa.
O texto que você lerá abaixo é do próprio governo paulista:
“O Conjunto Desportivo Constâncio Vaz Guimarães é uma obra que orgulha muito o Governo do Estado de São Paulo. Com aproximadamente 100 mil m² de área, é um dos maiores e mais equipados complexos desportivos da América Latina.
Palco da realização de inúmeros eventos esportivos, culturais e de lazer, agrega uma estrutura que compreende o Ginásio Geraldo José de Almeida (mais conhecido como Ginásio do Ibirapuera), o Estádio Ícaro de Castro Mello, o Conjunto Aquático Caio Pompeu de Toledo, o Ginásio Poliesportivo Mauro Pinheiro e o Palácio do Judô.
O conjunto possui um alojamento par 340 pessoas, tem três auditórios para 300 pessoas, três salas de condicionamento físico, sala de arco e flecha, uma pequena pista de corrida, parque para recreação, três quadras oficiais de tênis, duas quadras poliesportivas descobertas e estacionamento par 550 veículos
Recebe o nome de um dos mais respeitados homens do esporte nacional: Constâncio Vaz Guimarães, advogado e procurador fiscal que dedicou 46 anos de vida ao esporte. Decatleta, profundo conhecedor do atletismo, entre outros feitos de destaque, foi nomeado presidente da delegação Olímpica nos jogos de Berlim, em 1936.
No local funciona ainda o programa olímpico Projeto Centro de Excelência, que desde sua criação em 1984 atende atletas oriundos de todo Estado em regime de internato e atendimento integral, nas modalidades de judô, atletismo, natação e voleibol.
O Conjunto Desportivo Constâncio Vaz Guimarães está localizado na Rua Manoel da Nóbrega, 1361″.
Em região altamente valorizada e às vésperas de o país receber os Jogos Olímpicos, o governo tucano quer se desfazer de um patrimônio desse quilate.
E não se trata de privatizá-lo, mas, sim, de vendê-lo, pura e simplesmente, certamente para que se construam novos espigões na congestionada cidade que não pode parar, e está parando, numa de suas poucas áreas agradáveis.
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terça-feira, 20 de novembro de 2012

Discurso de Alberto Dines na Entrega do 34o Prêmio Vladimir Herzog


Queridos amigos:

O melhor prêmio que se pode conceder a um jornalista é a oportunidade para seguir trabalhando. Somos escravos do efêmero, vítimas da fragmentação. Assim como fazem com equipamentos, querem nos condenar à obsolescência, isto é, nos desativar. O reconhecimento é a nossa chance – ainda que fugaz --  de avisar que estamos atentos, ativos, portanto vivos. Este privilégio vale mais do que medalhas de ouro – aliás, a única que recebi nos últimos 60 anos foi roubada num arrastão no meu prédio. Este momento jamais nos será roubado, vale mais do que ouro.

Também sabemos conviver com os holofotes, sobretudo em ocasiões como esta em que o inspirador deste prêmio, os objetivos da premiação e os companheiros premiados simbolizam os mais preciosos valores da arte jornalística -- solidariedade, decência, dedicação.

Esta é uma festa, mas não devemos esquecer a suprema ironia de, sendo arautos das mudanças, somos também suas primeiras vítimas. Cultores da palavra livre estamos aprisionados por um palavrório vazio e perverso, geralmente composto por neologismos como “monetização”, “modelo de negócios”, “terceirização”, “out-sourcing”, sinergia, “aliança estratégica”.

Éramos marginais no início, em seguida fomos reconhecidos como trabalhadores, depois nos transformaram em PJs, agora querem que sejamos empreendedores. Tudo bem, seremos empreendedores, mas pelo menos facilitem a desconcentração, abram espaços. Mas, por favor, não despachem nossos jornais para as nuvens virtuais porque de lá voltarão emitindo grunhidos com 140 caracteres.

O Senhor Mercado imagina que o mundo é movido por gadgets, o Senhor Mercado engana-se mais uma vez: o mundo é movido por idéias, por gente. Socrates, pai da filosofia, não conhecia as tecnologias de informação, não sabia ler nem escrever, estava apenas conectado com a condição humana e inventou o diálogo.

 A informação hoje ou é codificada através de números ou glamourizada pela informalidade. Inovação é um vale-tudo que virou retrocesso. O jornalismo forjado na esfera do espírito e da moral está a reboque da banalidade. Éramos os buscadores da verdade, hoje querem de nós apenas meias-verdades. Às vezes, nem isso, apenas meias meias-verdades. Desde que abençoadas pelo capelão da empresa. Deo gratias

Mesmo assim, estamos aqui, sob a égide de um idealista chamado Vladimir Herzog, irmanados pelo compromisso de restaurar o acontecido. Não somos juízes, mas sabemos desencavar destroços e com eles contar histórias. É a nossa especialidade.

A absurda tese do suicídio de Vladimir Herzog foi derrubada trinta e sete anos depois. Foi morto nas dependências de uma repartição militar onde se apresentou voluntariamente um dia antes. Mas não podemos esquecer que semanas antes Vladimir Herzog foi submetido a um autêntico bullying jornalístico por um profissional da imprensa marrom chamado Claudio Marques que sugeria cinicamente sua internação no “Tutóia Hilton”, nefanda alusão à localização do Doi-Codi.

Herzog era tímido, não me conhecia, pediu a Zuenir Ventura que me contasse a campanha de difamação contra ele empreendida pelo colunista do “Shopping News”. Fiz uma denúncia no “Jornal dos Jornais”, não adiantou: uma semana depois, Vladimir Herzog foi assassinado. Claudio Marques, jamais foi convocado a prestar contas sobre sua cumplicidade. Vi-o uma vez na redação da “Folha de S. Paulo”, fazia parte da corriola da linha-dura que andava por lá, era próximo do coronel Erasmo Dias, assíduo em outras redações paulistanas.

Cabe a nós completar esta e outras histórias. Nossas pautas são enormes. Com prêmio ou sem prêmios precisamos tocá-las. Podemos ser encostados jamais seremos descartáveis. Parafraseando Kant, nossa missão é interminável. Com ou sem papel, nosso papel é intransferível.

Alberto Dines