Enviado por luisnassif, dom, 11/11/2012 - 10:37
Por Josias Pires
Eduardo Galeano: "Ao trabalhador, restam a angústia e o desemprego"
Da Carta Maior
Cidade do México – O escritor uruguaio Eduardo Galeano encerrou na noite de sexta-feira (9) o congresso do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (Clacso), realizado na capital mexicana, com uma concorrida conferência pautada em um tema caro para os cientistas sociais: a decadência do mundo do trabalho.
Intitulada “Os direitos dos trabalhadores: um tema para arqueólogos?”, a intervenção de Galeano, assistida por ao menos mil pessoas, que lotaram auditório e salas anexas do hotel onde acontecia o congresso, foi construída como um “mosaico” de histórias essenciais sobre os “200 anos de lutas dos trabalhadores do mundo”.
A maior parte delas está disponível no último livro do escritor, “Os filhos dos dias", lançado neste ano no Brasil. Galeano tratou, por exemplo, da greve operária de Chicago em primeiro de maio de 1886, violentamente reprimida pelas forças de segurança. A data tornou-se o Dia do Trabalho em muitos países, mas não nos Estados Unidos.
“Há sete ou oito anos estive em Chicago e pedi aos amigos que me receberam que me levassem onde aconteceram os protestos. Mas me surpreendi porque eles não conheciam a história”, disse ele. “Só recentemente recebi uma carta deles contanto que tinha acabado de haver uma manifestação na cidade, para lembrar as greves daquela época”, completou. O escritor, de 72 anos e mundialmente conhecido pela obra "As veias abertas da América Latina", também lembrou o médico italiano Bernardino Ramazzini (1633-1714), precursor da medicina do trabalho. Segundo o uruguaio, o médico natural de Pádua escreveu o primeiro tratado do gênero, vinculando tipos de ocupações laborais com enfermidades específicas. “Mas ele também escreveu que pouco poderia ser feito com as condições de vida daquelas pessoas, que comiam mal e trabalhavam de sol a sol”, afirmou. Ainda sobre a dureza do trabalho, Galeano lembrou que em 1998 a França reduziu a jornada a 35 horas por semana, mas a medida já foi desfeita. “Era o sonho de Thomas Morus. Para que servem as máquinas, senão para ampliar nossos espaços de liberdade? Mas acabou em apenas 10 anos. Para o trabalhador, restou desemprego e angústia”, disse o uruguaio, lembrando a crise financeira global iniciada em 2008. Galeano ainda citou o pouco interesse dos países e grandes empresas pelos 189 acordos e convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), dos quais só 14 foram ratificados pelos Estados Unidos. “Justamente o país em que o primeiro de maio não é celebrado”, destacou. Ao encerrar sua participação, Galeano contou a história de Maruja, trabalhadora doméstica e moradora de Lima, no Peru, também disponível em seu último livro. É esta que segue: "Marzo, 30, Día del servicio doméstico" "Maruja no tenía edad. De sus años de antes, nada contaba. De sus años de después, nada esperaba. No era linda, ni fea, ni más o menos. Caminaba arrastrando los pies, empuñando el plumero, o la escoba, o el cucharón. Despierta, hundía la cabeza entre los hombros. Dormida, hundía la cabeza entre las rodillas. Cuando le hablaban, miraba el suelo, como quien cuenta hormigas. Había trabajado en casas ajenas desde que tenía memoria. Nunca había salido de la ciudad de Lima. Mucho trajinó, de casa en casa, y en ninguna se hallaba. Por fin, encontró un lugar donde fue tratada como si fuera persona. A los pocos días, se fue. Se estaba encariñando." * Viagem realizada a convite do Clacso |
domingo, 11 de novembro de 2012
Eduardo Galeano e as angústias do trabalhador
Teórico do domínio do fato repreende STF
Por Sanzio
Da Folha
Participação no comando de esquema tem de ser provada
Um dos responsáveis por teoria citada no julgamento do STF, jurista alemão diz que juiz não deve ceder a clamor popular
Daniel Marenco/Folhapress 
Claus Roxin, que esteve há duas semanas em seminário de direito penal do Rio
Da Folha
Insatisfeito com a jurisprudência alemã -que até meados dos anos 1960 via como participante, e não como autor de um crime, aquele que ocupando posição de comando dava a ordem para a execução de um delito-, o jurista alemão Claus Roxin, 81, decidiu estudar o tema.
Aprimorou a teoria do domínio do fato, segundo a qual autor não é só quem executa o crime, mas quem tem o poder de decidir sua realização e faz o planejamento estratégico para que ele aconteça.
Roxin diz que essa decisão precisa ser provada, não basta que haja indícios de que ela possa ter ocorrido.
Nas últimas semanas, sua teoria foi citada por ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) no julgamento do mensalão. Foi um dos fundamentos usados por Joaquim Barbosa na condenação do ex-ministro José Dirceu.
"Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado", diz Roxin. Ele esteve no Rio há duas semanas participando de seminário sobre direito penal.
Folha - O que o levou ao estudo da teoria do domínio do fato?
Claus Roxin - O que me perturbava eram os crimes do nacional socialismo. Achava que quem ocupa posição dentro de um chamado aparato organizado de poder e dá o comando para que se execute um delito, tem de responder como autor e não só como partícipe, como queria a doutrina da época.
Na época, a jurisprudência alemã ignorou minha teoria. Mas conseguimos alguns êxitos. Na Argentina, o processo contra a junta militar de Videla [Jorge Rafael Videla, presidente da Junta Militar que governou o país de 1976 a 1981] aplicou a teoria, considerando culpados os comandantes da junta pelo desaparecimento de pessoas. Está no estatuto do Tribunal Penal Internacional e no equivalente ao STJ alemão, que a adotou para julgar crimes na Alemanha Oriental. A Corte Suprema do Peru também usou a teoria para julgar Fujimori [presidente entre 1990 e 2000].
É possível usar a teoria para fundamentar a condenação de um acusado supondo sua participação apenas pelo fato de sua posição hierárquica?
Não, em absoluto. A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem. Isso seria um mau uso.
O dever de conhecer os atos de um subordinado não implica em co-responsabilidade?
A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção ["dever de saber"] é do direito anglo-saxão e não a considero correta. No caso do Fujimori, por exemplo, foi importante ter provas de que ele controlou os sequestros e homicídios realizados.
A opinião pública pede punições severas no mensalão. A pressão da opinião pública pode influenciar o juiz?
Na Alemanha temos o mesmo problema. É interessante saber que aqui também há o clamor por condenações severas, mesmo sem provas suficientes. O problema é que isso não corresponde ao direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública.
A classe média vai ao paraíso
CELSO MING - O Estado de S.Paulo
Os bancos passaram meses atordoados com o inesperado aumento da inadimplência no crédito às pessoas físicas. Tudo se passou como se coisas novas estivessem acontecendo nesse mercado. E, de fato, aconteceram.
Os relatórios oficiais do governo da presidente Dilma Rousseff falam com entusiasmo dos cerca de 40 milhões de pessoas incorporadas às classes médias de consumo no Brasil nos últimos dez anos. É gente que passou a se alimentar mais adequadamente, a estudar mais, a ter acesso a uma conta bancária, a um plano de saúde. E tem agora automóvel, geladeira, celular, cartão de crédito e começa a viajar de avião.
Para o bem e para o mal, tudo isso muda muita coisa na vida e, principalmente, muda muita coisa no orçamento doméstico. Essas pessoas começam a entender que ser classe média também custa mais caro e planta armadilhas econômicas na vida diária.
Comprovaram no próprio bolso, por exemplo, que comprar um carro é mais do que levantar um financiamento e pagar as prestações mensais. Implica mudanças de padrões de consumo que, mal administradas, podem derrubar o consumidor em buraco difícil de sair. O novo dono de um carro logo vê que é empurrado a novas despesas e novas tentações. É IPVA, licenciamento, seguro, taxa de inspeção veicular, despesa com combustíveis, lubrificantes, estacionamento, lavagem, mecânica, pedágio, flanelinha, fim de semana na Praia Grande e esticadas com as crianças no Simba Safári.
O sujeito vai, é claro, exibir seu carrão para a parentada e para os amigos, como sugerem os anúncios. E isso também custa mais dinheiro. Levar a namorada ao shopping, por exemplo, acarreta despesas inesperadas. E esse é só o começo de uma lista interminável de novas demandas, como ocorre também com quem passa a pilotar um celular, a internet ou a TV por assinatura. Todas essas situações contribuem para que o salário acabe antes do final do mês, sina de qualquer pobretão.
Não é somente o consumidor que vem tendo de aprender com situações novas. Os bancos também vêm apanhando. Aparentemente, ao fazerem a avaliação de risco de um empréstimo para esses seus relativamente novos clientes, os bancos não consideraram o impacto de sua nova condição de consumidor de classe média sobre a renda familiar.
Tudo isso não desembocou meramente na elevação da inadimplência (mostrada no gráfico). Também mudou algo na administração das garantias. Expandiu a diferença entre os preços do carro usado e do carro zero. É uma realidade que sepultou de uma vez um conceito estranho, que teve tanta força nos tempos de inflação: o de que automóvel é "investimento". Outro impacto foi certa deterioração da principal garantia em vigor no empréstimo bancário de um veículo: a reserva de domínio. Em grande número de casos, a retomada do veículo nas inadimplências deixou de cobrir o saldo devedor.
Enfim, o crescimento dos segmentos de classe média no Brasil está mudando hábitos de consumo, traços de comportamento e práticas de administração financeira. Ainda está para ser avaliado o impacto dessas mudanças na própria cultura brasileira e na administração da política econômica.
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