O acordo entre os três Poderes para disciplinar aspectos da execução das emendas parlamentares reestabeleceu algum bom senso na discussão sobre essa rubrica do Orçamento. Primeiro, determinou que as emendas devem respeitar critérios de rastreabilidade e transparência. Até aí, nada de novo, pois esses critérios já deveriam estar sendo atendidos.
E, segundo, estabeleceu que deveria haver reavaliação da atual vinculação das emendas à receita corrente líquida (2% para as individuais e 1% para as de bancada). Hoje já se discute a importância da desvinculação dos mínimos em saúde e educação para tornar a execução do Orçamento mais flexível, abrindo espaço para novas demandas sociais.
Nada mais justo do que também revisar a regra que determina o valor das emendas. As emendas não correspondem a um gasto essencial e não há motivo para que o seu orçamento esteja vinculado a um percentual específico da receita corrente líquida.
Por mais que avançar nessas duas direções seja desejável, o acordo passou longe de abordar os objetivos e resultados dos projetos que recebem recursos das emendas. A pergunta mais importante não foi respondida: esses projetos satisfazem critérios mínimos de custo-efetividade?
Como escrevi em 2021: "A discricionaridade dos parlamentares na escolha de projetos vem ao custo de uma avaliação mais ampla de alternativas para a aplicação dos recursos, e nesse sentido é falha na identificação de ações prioritárias". Além disso, "os parlamentares priorizam a alocação dos recursos em suas regiões de origem, ainda que os maiores gargalos possam estar em outros municípios".
A avaliação mais sistemática realizada até então —uma auditoria do TCU de 2018— mostrou que as emendas parlamentares de fato apresentam falhas na definição do problema a ser atacado, na análise da melhor maneira de resolvê-lo e no estabelecimento de critérios úteis para determinar se as desigualdades regionais estão sendo reduzidas.
Há problemas também na implementação e na execução dos projetos. No caso de obras, o tempo médio para a execução chega a alcançar 97 meses, pouco mais de oito anos, comprometendo o sucesso do investimento destinado a elas.
A percepção de que as emendas parlamentares geram ineficiências e distorcem as decisões políticas para atender a interesses particulares em detrimento do bem-estar da sociedade encontra lastro em diversos estudos na área de economia. Os chamados "pork barrels" —gastos governamentais direcionados a interesses locais e específicos— resultam, em linhas gerais, em um governo muito grande, que escolhe projetos com benefícios menores que seus custos, resultando em baixa provisão de bens públicos e em uma trajetória fiscal de déficit, já que os custos de um endividamento excessivo não são internalizados por políticos que enfrentam o risco de não se reelegerem no futuro.
Assim, as emendas comprometem o uso eficiente dos recursos públicos, e, por mais que sua existência pudesse ser justificada como forma de "lubrificar as engrenagens do Legislativo" para construir coalizões e permitir que projetos com altos benefícios sociais sejam aprovados, sua execução impositiva no Brasil inviabiliza que esse tipo de barganha entre os Poderes possa acontecer.
Alguns estudos também são capazes de estabelecer que as emendas melhoram o resultado eleitoral do parlamentar, ampliando ainda mais a vantagem dos incumbentes na competição eleitoral ou então sua relevância política na região de origem.
Se as emendas comprometem o uso eficiente dos recursos públicos e reduzem a competição eleitoral justamente em favor dos parlamentares que as demandam, por que então o acordo permitiu que essa rubrica continue fazendo parte do Orçamento?
No atual arranjo político, reduzir o escopo ou mesmo pôr fim às emendas parlamentares parece ser a melhor forma de garantir que os recursos sejam alocados de forma benéfica para o crescimento e o desenvolvimento do país.
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