Rodrigo de Grandis
As apostas esportivas ou "bets" são realizadas pelos mais variados modos e modalidades esportivas. Diversos aspectos de um jogo entre equipes ou de uma partida entre dois jogadores podem ser objeto de palpite. A aposta pode envolver a disputa entre pessoas, animais e veículos, e recair sobre as variantes de uma prática esportiva, como o número de faltas, de cartões, de substituições etc.
Essa diversidade é uma característica comum nos mercados de apostas —legais e ilegais. Some-se a isso a disponibilidade de lances online e a utilização de aplicativos de celular acessíveis a um toque e temos o contexto perfeito para o cometimento do crime de lavagem de dinheiro em escala nacional e internacional.
A lavagem de dinheiro é um crime ardiloso. Ela serve para conferir aparência de legalidade a recursos que foram obtidos criminosamente. A ideia é ocultar ou dissimular bens ilícitos para que, no futuro, esses valores sejam usufruídos sem levantar a suspeita das autoridades encarregadas da investigação criminal.
Para realizar essas manobras, a criatividade não encontra limites. No mundo, estima-se que até US$ 140 bilhões são lavados todos os anos por intermédio de apostas esportivas e que os valores apostados em mercados ilegais estão entre US$ 340 bilhões e US$ 1,7 trilhão.
A lavagem no mundo das bets é ainda mais preocupante se levarmos em consideração que muitas apostas esportivas são realizadas online e por intermédio da compra e venda de criptoativos. As chamadas operações "peer-to-peer" (P2P), nas quais as transações são efetivadas diretamente entre as partes sem a intervenção de um terceiro, proporcionam um vácuo regulatório e um providencial anonimato para quem pretende ocultar ou dissimular recursos financeiros provenientes de uma atividade delituosa. A realização de uma aposta com recursos criminosos, por exemplo, pode ocorrer pela internet mediante um aplicativo de transferência com pagamento em bitcoins —ou qualquer outra moeda virtual. E tudo isso em proporções até então inimagináveis, de forma ágil e sem deixar vestígios.
E o Brasil?
A Lei de Lavagem de Dinheiro (lei 9.613/1998) parece suficiente para enfrentar esse novo cenário. Com penas que variam de três a dez anos de prisão e multa, o Brasil tem um conjunto de medidas que soa adequado para inibir e processar a lavagem de dinheiro por bets ilegais.
O problema reside no campo regulatório. Bets ilegais não são reguladas, não têm "compliance" e nem se submetem à fiscalização de órgãos públicos. Mesmo as empresas que se dedicam legalmente às apostas esportivas, e que têm obrigações de prevenção à lavagem de dinheiro em razão de um recente marco regulatório, precisam identificar adequadamente a natureza dos comportamentos suspeitos e estabelecer com precisão as matrizes de risco desse novo setor econômico.
Essa não é uma tarefa fácil diante da multiplicidade de comportamentos e do alto custo na implementação de mecanismos de prevenção à lavagem de dinheiro. Além disso, é preciso proporcionar recursos financeiros e humanos suficientes ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) para que a Unidade de Inteligência Financeira brasileira tenha condições de auxiliar na identificação dos recursos financeiros de origem ilícita e disseminar informações às autoridades competentes, visando a identificação dos autores de crimes e o bloqueio de valores obtidos criminosamente. Sem regulação adequada e eficiente, quem ganha a aposta é o crime.
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