segunda-feira, 23 de setembro de 2024

Não é só a inflação, FSP

 

Shireen Mahdi

Economista principal do Banco Mundial para o Brasil e doutora em economia pela Universidade de Manchester (Reino Unido)



A baixa concorrência no setor bancário do Brasil também eleva as taxas de empréstimo. Apenas cinco bancos controlam mais de dois terços do mercado de crédito do país, limitando as pressões competitivas e permitindo uma maior margem de spread bancário (a diferença entre a taxa de juros que um banco cobra nos empréstimos e a taxa que paga nos depósitos).

Em 2023, o spread bancário médio no Brasil era superior a 20 pontos percentuais, significativamente mais alto do que em economias comparáveis, e é ainda maior se o crédito direcionado for excluído do cálculo. Em mercados emergentes como o México, o spread é normalmente em torno de 5 a 6 pontos percentuais, enquanto em mercados desenvolvidos, como os Estados Unidos, gira em torno de 2 a 3 pontos percentuais.

Ineficiências estruturais, como infraestrutura precária e um sistema tributário confuso, acrescentam outra camada de dificuldade. Esses fatores aumentam o custo de fazer negócios, traduzindo-se em maior risco de crédito, especialmente para tomadores de menor porte.

Além disso, lacunas em instrumentos de gestão de risco de crédito, como o acesso limitado a dados confiáveis de crédito e procedimentos de insolvência ineficientes, agravam o problema. Por exemplo, o Brasil apresenta uma das menores taxas de recuperação de crédito entre seus pares de renda. Diante dessas incertezas, os bancos aumentam as taxas de empréstimo (e, portanto, os spreads) para se proteger contra possíveis perdas.

Somando-se à complexidade, estão os desequilíbrios fiscais do Brasil. Com uma dívida bruta do governo geral de 74.4% do PIB até o final de 2023, e necessidades brutas de financiamento substanciais a retornos relativamente altos, a demanda do governo por crédito absorve a liquidez e reduz o capital disponível para empresas e famílias, elevando os custos de empréstimo. Os elevados níveis de dívida do Brasil também aumentam o risco de crédito do país, o que eleva ainda mais as taxas de juros.

Desfazer um ciclo de aperto monetário é como afinar um instrumento musical. Assim como um músico precisa ajustar gradualmente as cordas para acertar o tom, os bancos centrais devem ajustar cuidadosamente as taxas de juros, reduzindo-as em pequenos incrementos para evitar desafinar a economia.

Mas quando os fatores que impulsionam as altas taxas também são estruturais, para reduzir as taxas de juros de forma sustentável, os formuladores de políticas devem olhar além da abordagem de metas de inflação do Banco Central e enfrentar as ineficiências subjacentes que inflacionam os custos de empréstimo.

Foram feitos progressos no fortalecimento do arcabouço fiscal, e manter o curso reduzirá o prêmio de risco e a demanda pública por crédito. Além disso, enfrentar as distorções criadas pelos programas de crédito direcionado é fundamental; um exame profundo desses programas é necessário para racionalizá-los e redirecioná-los cada vez mais para corrigir falhas de mercado e promover a inovação.

Aumentar a concorrência dentro do setor bancário e melhorar o arcabouço regulatório para gestão de risco de crédito também seriam passos úteis. Em última análise, é uma combinação dessas reformas que ajudará o Brasil a se livrar das altas taxas de juros e abrir caminho para uma economia mais dinâmica e inclusiva.

Esta coluna foi escrita em colaboração com Faruk Miguel Liriano, especialista em Setor Financeiro do Banco Mundial.

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