O Brasil já possui 24 unicórnios — termo utilizado para caracterizar startups com valor de mercado (seja em avaliações públicas ou privadas) superior à cifra de US$ 1 bilhão. São companhias cujas marcas já se tornaram parte do cotidiano dos consumidores, como QuintoAndar, 99, iFood, entre outras.
O que esse pequeno número não mostra é a quantidade de companhias que não apenas ficou distante do valuation bilionário, mas também deixou de operar em algum momento de sua existência. Um levantamento do Distrito feito com exclusividade ao InfoMoney aponta que mais de 8 mil startups fecharam suas portas na última década.
Os dados fazem parte de um levantamento realizado pela companhia que atua como um hub de startups e que já mapeou mais de 38 mil empresas na América Latina. Ao todo, entre janeiro de 2015 e setembro de 2024, 8.258 startups brasileiras deixaram de existir. É quase metade das 16.936 startups que estão ativas atualmente no País.
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De acordo com Victor Harano, gerente de research do Distrito, a taxa de mortalidade das startups tem se mantido constante ao longo do tempo, apesar de um aumento durante o ano passado e que pode ser atribuído à diminuição das captações ocorridas em 2022.
Ainda que exista uma dificuldade para identificar o momento exato em que as companhias deixaram de operar, o Distrito informa que o tempo médio do empreendimento gira em torno de 58 meses. “Muitas empresas continuam semi-operantes devido a dificuldade de fechar uma empresa no Brasil”, informa a consultoria.
Fintechs e retailtechs
O levantamento do Distrito revela ainda que quase 20% das startups que deixaram de existir desde 2015 atuavam com serviços financeiros, as chamadas fintechs. As retailtechs, que atuam com varejo, ficam em segundo lugar na lista com 13% do total de fechamentos. Pouco mais de 800 companhias que faliram eram healthtechs.
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Independentemente do setor, a causa mais comum para o fechamento é a falta de capital. Das mais de 8 mil companhias que deixaram de operar, apenas um décimo delas recebeu algum tipo de investimento. Como são empresas ainda em estágios iniciais, trata-se principalmente de aportes feitos por investidores-anjos.
“O primeiro cheque, via de regra, é um cheque local. Isso posto, é preciso considerar que o ecossistema de venture capital na América Latina só está começando a se desenvolver”, diz Julia De Luca, economista e VP de tecnologia no banco de investimento do Itaú BBA.
Facily
Uma dessas empresas que pode ser considerada semi-operante é a Facily. A startup de social commerce é também o caso mais notório de uma companhia que conseguiu atrair investidores, mas viu seu negócio fracassar ao longo do tempo. A companhia levantou mais de US$ 500 milhões em aportes com gestoras de venture capital.
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A Facily se tornou bilionária no fim de 2021, justamente quando recebeu sua maior injeção de capital de investidores: um aporte de US$ 135 milhões. Na época, a companhia que apostava em uma tese de social commerce para a venda de alimentos com preços mais baratos do que supermercados e atacados foi avaliada em US$ 1,1 bilhão.
Em abril deste ano, uma reportagem do NeoFeed apontou que a Facily corria o sério risco de fechar as portas uma vez que investidores já discutiam a continuidade operacional do negócio. Foi no início daquele mês que a startup fez sua última postagem nas redes sociais. Ainda assim, a empresa segue operando em seu aplicativo.
Pandemia
O caso da Facily é um retrato do comportamento dos investidores na época. Durante a pandemia, o setor de venture capital bateu recordes de alocação de investimentos em startups. Em 2021, os investidores injetaram mais de US$ 9,4 bilhões em startups brasileiras, quase três vezes mais do que o registrado no ano anterior.
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Os investidores esperavam que os valores aportados fossem multiplicados ao longo dos anos. Não foi o que aconteceu. Segundo dados do PitchBook, mais de 3,2 mil startups que captaram US$ 27 bilhões com investidores decretaram falência no ano passado.
Entre elas está a WeWork, que chegou a ser uma das startups mais valiosas dos Estados Unidos. A rede de escritórios compartilhados levantou mais de US$ 1 bilhão antes de realizar sua abertura de capital. Em novembro do ano passado, a companhia entrou com um pedido de falência.
Tema é tabu?
Falar de mortalidade das startups ainda parece um tema tabu no Brasil, principalmente entre os investidores. A reportagem do InfoMoney tentou contato com algumas gestoras em busca de dados da taxa de insucesso de seus investimentos ao longo dos anos. Poucas, no entanto, abriram seus números neste sentido.
“Há um tabu, mas em relação ao empreendedor. Eu tendo a acreditar que, pelo ecossistema brasileiro ser mais novo, os empreendedores ainda não têm uma cabeça de desapegar de negócios que não estão dando certo”, afirma De Luca, do Itaú BBA.
Para Harano, do Distrito, “desenvolveu-se no Brasil uma cultura de glamourização das startups, onde o foco estava mais nas histórias de sucesso e nos unicórnios do que nas dificuldades enfrentadas”. “Os fracassos eram ignorados ou minimizados no discurso público”, afirma.
Duas gestoras abriram seus números ao InfoMoney. A Bossa Invest, informou que 32 investidas de um conjunto de 366 empresas em seu portfólio direto (sem contar as companhias investidas em outros fundos) não geraram retorno à gestora. Já a Anjos do Brasil diz que 25% das 190 investidas feitas até o momento fracassaram.
“É um percentual que está abaixo das médias internacionais para investimentos-anjo, que podem chegar próximo de 50%”, diz Cassio Spina, fundador e presidente da Anjos do Brasil.
O executivo cita problemas de crescimento acelerado, questões pessoais dos fundadores e timing para o lançamento das companhias como alguns dos principais fatores que levaram os negócios a não darem certo.
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