"Estão falsificando a Acta", gritaram apoiadores de Joaquim Nabuco na Igreja Matriz de São José, onde se realizava a votação em 1884. Ato contínuo a multidão chacinou o fiscal do Partido Conservador e seu sobrinho; o abolicionista José Mariano saiu ferido do episódio.
A repercussão foi tamanha que o imperador escreveu 13 cartas a respeito do "affair" em três semanas. As atas registraram a vitória, por um voto, do Conselheiro Portella, adversário de Nabuco, tendo a Justiça determinado um segundo escrutínio. Nele, Nabuco triunfa. No entanto, foi "degolado" a bico de pena no processo parlamentar de reconhecimento.
Na sequência, o gabinete Dantas, que propunha a abolição da escravidão sem indenização, foi derrubado por uma moção de desconfiança por apenas dois votos. Novas eleições e uma solução: o partido oferece a vaga de deputado do 5º. Distrito (agreste de Pernambuco) a Nabuco, que concorre e é eleito. O episódio é descrito por Carolina Nabuco em "A Vida de Joaquim Nabuco".
Sim, no Império e na República Velha as eleições eram marcadas por violência e fraudes diversas: eleitores fantasmas ("fósforos"), cédulas ("chapa de caixão") e envelopes ("sobrecartas") falsos; idem atas eleitorais. Mas, ao contrário do que o regime varguista propagandeou, não era muito diferente nas atuais democracias no século 19.
A independência dos eleitores aumentou após o Código Eleitoral (1932), com o voto secreto (cabine eleitoral) e a gestão das eleições para a Justiça Eleitoral. O alistamento tornou-se obrigatório, mas não o voto, o que só aconteceu com o Código de 1965.
Paradoxalmente, a medida reforçou a manipulação do eleitorado analfabeto (majoritariamente rural até a década de 70), que votava a despeito da proibição formal. Isso explica porque, ao contrário do que ocorreu nos EUA no período das leis "Jim Crow", as oligarquias nunca se opuseram à inclusão da massa da população no sistema eleitoral; afinal, podiam manipulá-la.
A mudança crucial ocorreu a partir de 1955, com a introdução da cédula oficial substituindo a fornecida pelos partidos. A nova cédula exigia que os eleitores escrevessem o nome dos candidatos.
O impacto foi avassalador para o eleitorado analfabeto: os votos inválidos para deputado federal chegaram a 41% em 1990. Entre 1980 e 2000, o Brasil ostentava o título do campeão de votos inválidos na América Latina.
A introdução da urna eletrônica muda radicalmente as coisas: em 2000, os votos inválidos caíram de 41% para 7,6%, um recuo de 82%. A EC 25/85, que garantiu o voto dos analfabetos foi simbólica; a urna foi um instrumento que emancipou "de facto" o eleitorado pobre.
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