O caso da menina brasileira de 10 anos que foi estuprada, engravidou e então uma juíza e promotora pediram que desse à luz uma (outra) criança chegou ao Washington Post.
Virou notícia aqui porque, como vocês podem ter ouvido falar, o Brasil, nesse quesito, é nosso futuro. "Brasil, país do futuro... sempre." A reportagem cita o Ministério da Saúde brasileiro declarando que todo aborto é crime. Em junho, nossa Suprema Corte decidiu, por seis votos a três, deixar que estados criminalizem o aborto.
A decisão expõe em seu país e no meu uma ânsia autoritária de usar os poderes coercivos do estado para regulamentar a conduta privada. A liberdade é ótima nos mercados, dizem os conservadores. Mas não no quarto. E, na visão deles, o útero das mulheres deve ser socializado.
O Brasil, como muitos países católicos que seguem o exemplo francês, teve o bom senso de não criminalizar o comportamento homossexual, como fizeram os países protestantes do norte. Mas agora, nos EUA, os tribunais, que há décadas vêm sendo preenchidos por juízes indicados por autoritaristas republicanos, estão rapidamente retrocedendo por esse caminho sombrio. O direito à privacidade está ameaçado.
Se o estado da Virgínia declarar —como fez até ser impedido por uma Suprema Corte de maioria liberal, em 1967— interesse em impedir casamentos entre brancos e negros, os juízes da Suprema Corte agora não vão intervir.
Um fato divertido ou assustador, dependendo do seu senso de humor, é que o juiz da Suprema Corte Clarence Thomas, o mais radical inimigo da privacidade, é negro e é casado com uma mulher branca. Antes do processo, muito apropriadamente intitulado Loving vs. Virginia, 388 U.S. 1 (1967), Clarence Thomas teria sido encarcerado. Podemos esperar que ele seja encarcerado em breve na Virgínia.
O argumento apresentado pela Suprema Corte é que assuntos como esse devem ser legislados, não decididos por um tribunal. Ou seja, os conservadores estão dizendo que não existe um direito fundamental à privacidade, como o direito do controle sobre o próprio corpo —pelo menos se você tem cromossomos XX.
Quem tem cromossomos XY ficaria indignado se a Suprema Corte não protegesse o seu direito privado de tomar comprimidos de Viagra para combater a impotência masculina. Mas as mulheres são meros receptáculos...
A não ser que você impeça que isso aconteça, o Estado vai regulamentar sua vida cada vez mais. Tanto a esquerda quanto a direita, tanto Lula quanto Bolsonaro, são a favor de nos converter em escravos do Estado. Importadores. Banqueiros. E menininhas.
Tradução de Clara Allain
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