sexta-feira, 15 de julho de 2022

Platitudes planejadas, Ruy Castro ,FSP

 O comentário mais ousado feito até agora sobre o assassinato do petista Marcelo de Arruda pelo bolsonarista Jorge Guaranho no sábado último (9), em Foz do Iguaçu, foi o de que não passou de uma briga de bêbados, típica dos fins de semana. Partiu do general Hamilton Mourão, vice-presidente da República, que não parece, mas desempenha importante papel no governo Bolsonaro. Sempre que uma ignomínia de Bolsonaro ou de um aliado ameaça gerar uma crise, Mourão surge nos telejornais descendo de um carro, abotoando o paletó e dizendo uma platitude que reduza a ignomínia a uma trivialidade.

Fez isso outro dia ao analisar o fuzilamento na Amazônia do jornalista britânico Dom Philips, que acompanhava o indigenista Bruno Pereira: "Deve ter sido um comerciante da área, que se sentiu prejudicado pela ação do Bruno. O Dom entrou de gaiato nessa história". A mesma Amazônia em chamas aos olhos do mundo já rendeu a Mourão esta frase: "Agosto, setembro e outubro são meses de seca e queimada. É igual ao 7 de Setembro, tem todo ano". E quando lhe perguntaram sobre a apuração dos crimes de tortura na ditadura: "Apurar o quê? Os caras já morreram tudo, pô! Vai trazer os caras do túmulo de volta?".

Mourão acha tudo muito natural. Nada o perturba. Parafraseando Nelson Rodrigues, se um dia lhe servirem ensopado de ratazana ao jantar, ele levará o guardanapo ao pescoço e apenas pedirá à pessoa ao lado que lhe passe o sal. Mas, ao definir o assassinato de Marcelo de Arruda, superou a si mesmo.

Como ele sabe, Bolsonaro está dividindo de propósito o país e armando seus seguidores para eternizá-lo no poder. Mas, com a facilidade com que se compram armas hoje no Brasil, quem impedirá que seus adversários também se armem e partam para o confronto? O nome disso, pelos compêndios, é guerra civil.

Para o brejeiro Mourão, no entanto, guerra civil deve ser só uma grande briga de bêbados.

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