O euro atingiu nesta terça-feira (12) a paridade com dólar pela primeira vez em duas décadas, afetado pela ameaça de corte de fornecimento do gás russo para a União Europeia no contexto da Guerra da Ucrânia.
Os investidores privilegiam a moeda americana, considerada um valor refúgio, que valorizou 14% desde o início do ano e chegou a ser negociada a US$ 1 por euro às 9h50 GMT (6h50 de Brasília), a maior cotação diante da divisa europeia desde dezembro de 2002.
O mercado teme um agravamento da crise energética na Europa devido à interrupção do fluxo de gás russo que chega pelo gasoduto Nord Stream 1, atualmente em manutenção. A tensão alimenta os temores de uma recessão na Europa.
O gás procedente da Rússia está no centro da tempestade na Europa e o anúncio de sábado (9) de que o Canadá devolverá turbinas à Alemanha para aliviar a crise energética com a Rússia "não teve um impacto positivo", disse o analista Jeffrey Halley, da empresa Oanda.
O grupo russo Gazprom iniciou os trabalhos de manutenção na segunda-feira (11) no gasoduto Nord Stream 1, que transporta gás diretamente da Rússia para a Alemanha. Os países europeus estão na expectativa para saber se Moscou vai restabelecer o fornecimento após as obras, previstas para durar dez dias.
"A questão chave é saber se o gás voltará depois de 21 de julho. Os mercados parecem já ter tomado uma decisão", disse Halley.
Para Mark Haefele, analista do UBS, uma suspensão do fornecimento de gás russo na Europa "provocaria uma recessão em toda a zona do euro com três trimestres consecutivos de contração da economia".
Um cenário de recessão dificultaria o trabalho do BCE (Banco Central Europeu) caso a instituição deseje acabar com sua política monetária expansionista e passar para uma fase de contração para combater a inflação que agrava a situação.
Ao mesmo tempo, o Federal Reserve (Fed, p banco central americano) tem mais margem de manobra para continuar elevando as taxas, já que os números de emprego divulgados na sexta-feira (8) provaram que a economia dos Estados Unidos apresenta maior resiliência no momento.
VALOR REFÚGIO
A queda do euro pode prosseguir nas próximas semanas.
Os dados sobre a inflação na Alemanha, França e Estados Unidos podem alimentar na quarta-feira (12) a preocupação dos investidores.
"Se a inflação nos Estados Unidos for maior do que o mercado espera, isso pode beneficiar o dólar, já que os investidores apostam que o Fed terá que seguir ainda mais rápido para aumentar as taxas", disse Fawad Razaqzada, analista da Forex.com.
O euro registrou leve alta depois de atingir a paridade com o dólar e às 10h10 GMT (7h10 de Brasília) era negociado a US$ 1,0024 (R$ 5,3).
O dólar também vive uma valorização na comparação com outras moedas consideradas vulneráveis ao risco. A cotação da libra esterlina caiu a US$ 1,1807 (R$ 6,3), nível que não era registrado desde março de 2020, quando o início da pandemia do novo coronavírus na Europa, durante as negociações do brexit, provocou a queda da moeda britânica ao menor valor desde 1985.
PARIDADE COMO VANTAGEM?
Uma moeda fraca pode ter suas vantagens, pois ajuda as empresas exportadoras. Afinal, os produtos domésticos ficam mais baratos no exterior, o que impulsiona as vendas. Ao mesmo tempo, porém, o poder de compra também é exportado para o exterior, que passa a comprar produtos alemães e europeus mais baratos.
De qualquer forma, a vantagem para as empresas exportadoras locais só existe enquanto os empresários alemães fabricarem seus produtos inteiramente na Alemanha ou na zona do euro e depois os exportarem, afirma Sonja Marten, especialista em câmbio do DZ-Bank.
"Uma vez que eles comprem produtos primários de países de fora da UE [União Europeia] ou que sejam produzidos usando muita energia, esse cálculo deixa de fazer sentido", diz ela, apontando que as fontes energéticas em particular são faturadas em dólares.
INFLAÇÃO TAMBÉM PÕE PRESSÃO SOBRE O EURO
O aumento dos preços da energia foi a principal razão pela qual a balança comercial externa da Alemanha foi negativa em junho pela primeira vez em muitos anos, o que significa que o país importou mais – incluindo petróleo e gás – do que exportou.
Os altos preços de importação, especialmente de energia, também estão impulsionando a inflação. E isso não é bom para o Banco Central Europeu (BCE). Afinal, ele quer contrabalançar a inflação com aumentos planejados das taxas de juros.
Ao mesmo tempo, contudo, o BCE não deve fazer isso muito rapidamente, senão corre o risco de paralisar a economia. "Ele poderia primeiro tentar intervir verbalmente", analisa Marten. Mas a experiência mostra que é mais provável que isso atraia especuladores, que poderiam empurrar novamente para baixo a taxa de câmbio do euro dentro de poucos dias.
O movimento descendente dos últimos dias, contudo, já é incomum: "Isso mostra o nervosismo dos mercados", afirma Marten. Portanto, a especialista não exclui a possibilidade de paridade ou mesmo de uma avaliação de curto prazo abaixo dessa marca.
TEMORES DE RECESSÃO TRANSATLÂNTICA
O fato de o euro estar tão fraco em relação ao dólar sempre tem relação com a avaliação da moeda americana. "O Banco Central americano, o Fed, está definindo o ritmo novamente", explica o ex-economista-chefe da Allianz Michael Heise. A instituição está tomando medidas contra a inflação e já começou a aumentar as taxas de juros.
Por vezes isso chegou a assustar o mercado de ações, que temia uma recessão nos Estados Unidos, diz Marten. Mas agora os olhos estão voltados para a Europa: se a economia americana entrar em colapso, a recessão também atingirá o continente europeu.
EURO SUBVALORIZADO
Mas os mercados financeiros agora esperam que o Fed adote uma postura mais cautelosa, observa Heise, que atualmente é economista-chefe do HQ Trust.
Se o BCE realmente fizer o primeiro aumento da taxa de juros em julho e outros aumentos se seguirem, talvez até elevando as taxas de juros um pouco mais do que se pensava, ele acredita que isso poderia ajudar a taxa de câmbio do euro novamente.
Assim, a moeda comum europeia poderia voltar a ser cotada a US$ 1,10, ou até mais. Atualmente, Heise considera que o poder de compra do dólar está supervalorizado de qualquer maneira.
Os mercados estão nervosos por causa da incerteza. Se o gás da Rússia continuar chegando aos países europeus, isso também deve ajudar o euro, espera Ulrich Leuchtmann, do Commerzbank. "De qualquer forma, uma taxa de câmbio do euro tão baixa assim não se justifica."
Com Deutsche Welle
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