terça-feira, 13 de junho de 2017

Reação em cadeia, The Economist, O Estado de S.Paulo



Por que, para aflição dos agricultores, as grandes empresas químicas estão se fundindo







11 Junho 2017 | 05h00

Agrícola
Norma. Agricultores da União Europeia tiveram de reduzir pesticidas  Foto: Reuters/Joe Skipper
Com a chegada da primavera no Hemisfério Norte, as folhas das videiras recobrem de verde as colinas do Languedoc, no sul da França. O fenômeno conta com o amparo dos defensivos agrícolas – utilizados em grande quantidade, confessa um vinicultor, cuja propriedade fica próxima ao vilarejo de Thuir, nos Pirineus. Na falta desses produtos agroquímicos, seria preciso usar fertilizantes naturais e arrancar manualmente as pragas que atacam as plantas; duas alternativas dispendiosas. Na Europa, ninguém faz uso tão intensivo de agrotóxicos quanto os agricultores franceses: são 65 mil toneladas só de pesticidas todos os anos.
Por isso, até os pequenos vinicultores estão de orelha em pé com uma série de aquisições envolvendo seus principais fornecedores de defensivos agrícolas. De 2015 para cá, após uma década sem negócios mais retumbantes, três grandes fusões foram postas na mesa, envolvendo um montante total de cerca de US$ 240 bilhões. Inicialmente, quando as transações foram anunciadas, muitos duvidaram que as autoridades antitruste fossem aprová-las. Se as três receberem sinal verde, como agora parece provável que aconteça, quatro empresas, e não mais seis, como hoje, serão responsáveis pela produção de 70% dos pesticidas utilizados no planeta.
A primeira grande fusão, anunciada em dezembro de 2015, foi a da Dow Chemical com a DuPont, quarta e quinta maiores empresas químicas do mundo em valor de mercado. Trata-se de um negócio de US$ 130 bilhões. É a maior fusão da história do setor, e acabou impulsionando outros negócios. Um ano depois, foi a vez da gigante alemã Bayer concordar em se juntar com a americana Monsanto, especializada em sementes, numa transação valendo US$ 66 bilhões. Passados mais dois meses, a gigante chinesa ChemChina ofereceu US$ 43 bilhões em dinheiro pela suíça de biotecnologia Syngenta. Agora, os chineses também querem se unir com uma concorrente local, a Sinochem, a fim de criar uma empresa com faturamento de aproximadamente US$ 100 bilhões.
E a onda de fusões extravasou do segmento de defensivos para o restante do setor químico; em particular, para empresas que fabricam produtos “especiais”. Em 22 de maio, a Clariant e a Huntsman, fabricantes, entre outras coisas, de aditivos para pesticidas, concordaram na fusão de iguais, num negócio de US$ 14 bilhões. Em abril, a fabricante americana de tintas PPG já tinha se prontificado a pagar quase o dobro disso por sua concorrente holandesa AkzoNobel, que rejeitou a oferta, embora os americanos continuem insistindo. Em 24 de maio, as fornecedoras de gás industrial Praxair e Linde anunciaram uma fusão de iguais no valor de US$ 70 bilhões.
O principal motor dessa onda de negócios é a forte desaceleração no crescimento da demanda de todos os tipos de produtos químicos, explica P. J. Juvekar, do Citigroup. Nos anos 2000, as vendas aumentavam a uma taxa de 6% ou 7% ao ano. Em 2016, com a demanda chinesa extremamente desaquecida, o setor cresceu só 2%. Os executivos veem no aumento de escala uma forma de reduzir custos.
Custo. A alta expressiva dos gastos com o desenvolvimento de novos produtos químicos é outro fator, diz Kurt Bock, CEO da gigante alemã Basf. Na Europa, o custo médio de desenvolvimento de uma nova substância ativa, que era de US$ 150 milhões em 1995, chega hoje a mais de US$ 500 milhões. A maior parte disso é empregada em testes que verificam a segurança do produto. No mesmo período, o número de compostos potenciais que precisam ser sintetizados e testados para cada nova substância, a fim de identificar eventuais efeitos prejudiciais à saúde, aumentou de 50 mil para mais de 140 mil, envolvendo processos que podem levar até dez anos para serem completados. Com ciclos de desenvolvimento mais demorados, as empresas precisam ter fôlego financeiro para manter maior número de projetos simultaneamente em andamento.
Normas mais rígidas, adotadas em toda a União Europeia, reduziram o número de pesticidas que os agricultores podem aplicar em suas plantações: de quase 1 mil no início da década de 90 para cerca de 400 hoje, observa Robert de Graeff, da Organização Europeia de Proprietários de Terras. Caso o aumento de escala signifique que as empresas terão os recursos necessários para investir no desenvolvimento de novos produtos, os membros da associação verão o processo de consolidação com bons olhos.
Mas os agricultores também estão temerosos. Não querem ficar excessivamente dependentes de combinações de sementes e defensivos agrícolas de uma única empresa. As três grandes fusões envolvem uma companhia focada em sementes e outra em agroquímicos. Muitos agricultores receiam se ver numa situação em que tenham necessariamente de usar os pesticidas da mesma empresa que lhes fornece as sementes. Segundo Roger Johnson, presidente da União Nacional de Agricultores dos EUA, aos olhos de seus associados nenhuma das fusões cheira a coisa boa. O aumento da consolidação também pode significar que as empresas químicas terão condições de cobrar preços mais altos, teme Johnson, além de serem menos pressionadas a desenvolver novos produtos.
As fusões precisam passar pelo crivo das autoridades antitruste. A UE aprovou as fusões da Dow com a DuPont e da ChemChina com a Syngenta; e agora é quase certo que esses negócios serão concretizados, diz Juvekar. A Bayer está em conversações com as autoridades sobre sua fusão com a Monsanto; os analistas acham que também esse negócio receberá sinal verde.
A condescendência das autoridades tende a encorajar a realização de ainda mais negócios. A facilidade com que a compra da Syngenta pela ChemChina foi aprovada talvez anime outras companhias chinesas a vir atrás de empresas químicas ocidentais no futuro. Segundo Florian Budde, da consultoria McKinsey, por mais impressionantes que sejam os valores envolvidos, o fato é que a atual onda de negócios parece ser o início de um movimento de proporções ainda mais avassaladoras. Ao que tudo indica, os agricultores ainda terão muitos motivos para se preocupar.
© 2017 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.  

Mais de mil para cada um, Roberto Rodrigues, O Estado de S. Paulo




Hoje somos cerca de 207 milhões de brasileiros. Portanto, produzimos mais de 1,1 tonelada de grãos para cada brasileiro.







11 Junho 2017 | 05h00
De acordo com dados do IBGE, no primeiro trimestre deste ano o PIB brasileiro cresceu cerca de 1%, depois de vários meses e trimestres em recessão. Ufa, até que enfim!
E ficou claro que o crescimento se deveu ao setor agropecuário. De fato, este segmento fundamental da economia nacional teve uma expansão de 13,4% em relação ao trimestre anterior, enquanto a indústria cresceu 0,9% e o setor de serviços ficou estagnado. Feitas as contas subjacentes, verifica-se que o agronegócio contribuiu com mais de 75% do crescimento da economia no período. E, de acordo com os estudiosos, esta deverá ser a participação porcentual mínima do agro no avanço do PIB anual em 2017. Não chega a ser uma novidade, embora os números atuais tenham uma explicação: tivemos um ano com bastante chuva em quase todas as áreas agrícolas, salvo uma ou outra região que sofreu com veranicos (períodos de 10 a 15 dias sem chuva e com muito calor, o que prejudicou o desenvolvimento das plantações) em janeiro. Isso permitiu um aumento na safra de grãos da ordem de 47,7 milhões de toneladas em relação ao ano passado. Saltamos de 186,6 milhões de toneladas em 2016 para 234,3 milhões em 2017, 25,5% mais, enquanto a área plantada cresceu apenas 3,7%! Vale uma reflexão: apenas 8 países do mundo todo (EUA, China, Índia, Rússia, Argentina, Ucrânia, Canadá e Austrália) e mais a UE conseguem produzir uma safra de grãos superior ao acréscimo do Brasil neste ano. Ao acréscimo, somente!
Entre os diversos fatores responsáveis por esse salto incrível está a tecnologia tropical sustentável aqui desenvolvida, admirada internacionalmente, que estava pronta, e bastou um bom ano de chuvas para isto ser demonstrado tão claramente.
Mas o que tudo isso tem a ver com o título do artigo? É que hoje somos cerca de 207 milhões de brasileiros. Portanto, produzimos mais de 1,1 tonelada de grãos para cada brasileiro. Os números da FAO dizem que há segurança alimentar para a população cujo país produzir mais de 250 quilos por habitante/ano. Ora, nossos agricultores alimentam tranquilamente 4 vezes mais gente que a demanda dos nossos consumidores. Daí os excedentes para exportação que nos colocam em grande destaque no cenário global: primeiro exportador de café, suco de laranja, açúcar, carne de frango, farelo de soja, soja em grãos, segundo de milho e de óleo de soja, terceiro de carne bovina e quarto de carne suína. E crescendo em algodão e frutas. Somos também o maior exportador mundial de tabaco.
Tudo isso é notável, especialmente se nos lembrarmos de que há 50 anos éramos importadores de alimentos, e hoje ajudamos na segurança alimentar de mais de 150 países, exportando 90 milhões de toneladas de grãos, 6,3 milhões de toneladas de carnes, 28,9 milhões de toneladas de açúcar.
Pena que nem todos os produtores se beneficiem de tanta fartura: com ela, os preços caíram este ano, e as contas não estão fechando para muita gente. Na pecuária de corte, especialmente, os episódios da carne fraca e da JBS derrubaram o valor da arroba no país inteiro. É por isso que precisamos tanto de um seguro rural digno do nosso agro, como os países desenvolvidos já têm.
Mas não foi ainda neste Plano Safra que o seguro foi contemplado como deveria, infelizmente. E vale a pena uma palavra sobre o Plano: diante da crise política que vivemos e seus inevitáveis reflexos na economia, havia o temor de que faltaria crédito para o financiamento da nova safra. Mas isso não aconteceu. A oferta de recursos aumentou 2,5% em relação ao ano passado, chegando a R$ 190 bilhões. Os juros diminuíram 1% para a maioria dos programas. Poderiam ser menores, já que a inflação estimada para o exercício deverá ficar em torno de 4%. Positivo foi o Programa para Construção e Ampliação de Armazéns, com juros de 6,5%, mesma taxa para Incentivo à Inovação Tecnológica. Enfim, diante do cenário atual, foi um bom Plano Safra, não fosse o Seguro. Como disse o ministro da Agricultura, temos de olhar a floresta, e não apenas a árvore. Vamos tratar de plantar outra grande safra este ano, outros mil quilos para cada brasileiro.

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Ibope, internet e voto, José Roberto de Toledo, O Estado de S.Paulo



Web virou maior influência para eleger um presidente




12 Junho 2017 | 05h00
Pela primeira vez, uma pesquisa extraiu da boca do eleitor o que urnas e ruas sugeriam mas faltavam elementos para provar: a internet virou o maior influenciador para eleger um presidente. Sondagem inédita do Ibope revela que 56% dos brasileiros aptos a votar confirmam que as mídias sociais terão algum grau de influência na escolha de seu candidato presidencial na próxima eleição. Para 36%, as redes terão muita influência.
Nenhum dos outros influenciadores testados pelo Ibope obteve taxas maiores que essas. Nem a mídia tradicional, nem a família, ou os amigos - o trio que sempre aparecia primeiro em pesquisas semelhantes. Muito menos movimentos sociais, partidos, políticos e igrejas. Artistas e celebridades ficaram por último.
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TV, rádio, revistas e jornais atingiram 35% de "muita influência" e 21% de "pouca influência", somando os mesmos 56% de peso da internet. A diferença é que seus concorrentes virtuais estão em ascensão - especialmente junto aos jovens: no eleitorado de 16 a 24 anos, as mídias sociais têm 48% de "muita influência" eleitoral, contra 41% da mídia tradicional. 
No total, conversa com amigos chega a 29% de "muita influência" para escolha do candidato a presidente, contra 27% das conversas com parentes. Movimentos sociais alcançaram 28%. A seguir aparecem partidos (24%), políticos influentes (23%), líderes religiosos (21%) e artistas e celebridades somados (16%).
Por que a internet tem um peso tão grande na eleição? A constatação do Ibope é importante por levantar essa questão, mas, sozinha, não é suficiente para respondê-la. Outras pesquisas baseadas em resultados eleitorais e estudos empíricos ajudam a entender o fenômeno, mesmo que indiretamente.
Lançado em 2016 nos EUA, o livro "Democracy for Realists" vem provocando polêmica por contestar o conceito popular de que, na democracia, o eleitor tem preferências claras sobre o que o governo deve fazer e elege governantes que vão transformá-las em políticas públicas. Para os autores, e dezenas de fontes que eles compilam, não é bem assim. O "do povo, pelo povo, para o povo" funciona na boca dos políticos, mas não na prática.
No mundo real, pessoas elegem representantes mesmo cujas ideias e propostas estão em desacordo com o que elas pensam. Não fosse assim, os congressistas brasileiros deveriam sepultar em vez de aprovar as reformas da Previdência e trabalhista, rejeitadas pela maioria dos que os enviaram para Brasília.
Segundo Achens e Bartel, o eleitor não vota em ideias, mas em identidades. Elege quem ele imagina que representa o seu lado contra o outro - sejam quais forem os lados. É aquela piada irlandesa. "Você é católico ou protestante? Ateu. Mas você é ateu católico ou ateu protestante?". Ou seja: de que lado está?
Nos EUA, essa linha é mais fácil de traçar porque as identidades se resumem, eleitoralmente, a duas legendas. Mesmo na disruptiva eleição de Trump, 95% tanto de republicanos quanto de democratas votaram nos candidatos de seus partidos. E no Brasil, onde dois em cada três eleitores dizem não ter preferência partidária?
Nas eleições de 2004 a 2014, a geografia separou petistas de antipetistas. Bairros, cidades e Estados mais pobres ficaram majoritariamente de um lado; enquanto moradores dos locais mais ricos, em geral, ficaram do outro. Em 2016, não mais. A internet misturou e segue confundindo essas fronteiras. A construção de identidades virtuais via Facebook e Twitter aproxima forasteiros e afasta vizinhos. Proximidade física importa, mas menos.
Quanto mais tempo ele passar online, mais a internet influenciará o eleitor. O celular bateu a TV também na urna.