quinta-feira, 23 de outubro de 2025

Ruy Castro - Assalto à moda de Lupin, FSP

 O assalto ao Museu do Louvre, em Paris, no domingo (19), será assunto por muito tempo. Não pelo alto valor das peças roubadas, mas pela espetacular forma com que foi conduzido. Quem o planejou só pode ser leitor de Arsène Lupin, o ladrão de casaca criado por Maurice Leblanc em 1905 e protagonista de 24 livros de romances e contos. Lupin, como outros ladrões elegantes da literatura, não é só mestre dos disfarces, fluente em línguas e capaz de distinguir a olho nu uma joia verdadeira de uma perfeita falsificação. Às vezes, suas personificações escapam até à detecção do leitor, que custa a saber que esse ou aquele personagem é ele.

Foi este o segredo do assalto ao Louvre. Seus praticantes não o invadiram à noite, que é quando os museus dobram a vigilância com alarmes, arapucas, vigias, sirenes e olhos eletrônicos. Penetraram à luz da manhã, pelas janelas de uma rua lateral, usando uma escada como a dos bombeiros e à vista dos transeuntes. Vestidos como operários de obras, nada mais natural do que estarem ali, daí passarem em branco até pelos guardas ao redor do museu. Foi puro Lupin —se quiser ficar despercebido, seja como todo mundo.

O assalto aconteceu no mesmo dia em que um site britânico casualmente lembrou a venda em 2021, por US$ 18 mil, da mais ousada escultura já produzida: "Io sono" ("Eu sou"), do italiano Salvatore Garau, constando de um espaço vazio de, segundo o autor, 1,5 m por 1,5 m —tamanho que só ele pode saber, porque a obra não existe fora da sua mente. Quer dizer que o também ousado cliente comprou o nada? "Não", diz o vanguardista Garau. "Não vendi o nada, mas um vácuo cheio de energia. O vazio é uma forma de presença."

Uma escultura incorpórea, donde invisível, tem suas vantagens: dispensa manutenção, pode ser admirada até por deficientes visuais e nela ninguém tropeça. E desvantagens: pode ser facilmente copiada, roubada sem ninguém perceber e é facílima de esconder.

Por sorte, os ladrões do Louvre não gostam de arte contemporânea.

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