The Economist
Javier Milei tem se especializado em contrariar expectativas. Quando anunciou a candidatura à Presidência, muitos riram. Quando venceu, disseram que os protestos inviabilizariam suas reformas. Quando obteve os primeiros êxitos, minimizaram.
Agora, após um ano turbulento, o libertário irascível surpreende novamente com uma vitória expressiva nas eleições legislativas de meio de mandato. Ele precisa aproveitá-la para revitalizar seu programa de reformas radicais.
Os cortes de gastos de Milei são, talvez, os mais profundos e rápidos já impostos a um país com amplo consentimento democrático. Quando venceu a eleição, prometendo austeridade severa, os eleitores ainda não haviam sentido o peso de sua "motosserra".
Agora sentiram: cortes tão drásticos que só encontram paralelo na Grécia pós-crise, onde um trio de instituições internacionais impôs medidas de austeridade sob forte indignação popular. Ainda assim, os eleitores voltaram a apoiá-lo. Como apenas parte das cadeiras estava em disputa, Milei não conquistou maioria no Congresso, mas agora tem força suficiente para barrar tentativas de restaurar os gastos públicos, e pode formar coalizões para aprovar novas reformas.
Isso importa para muito além do rio da Prata. Muitos governos de países ricos enfrentam déficits fiscais e dívidas crescentes. Seus problemas não chegam ao nível argentino, mas ainda assim há lições a extrair de Milei. Seu sucesso mostra o poder de mensagens econômicas duras, porém coerentes, quando transmitidas com clareza e convicção.
É verdade que o realismo fiscal direto pode ser mais bem recebido pelos argentinos do que por europeus ou norte-americanos, que não conhecem as misérias da hiperinflação recorrente e dos controles de preços. Mas, até Milei, analistas céticos sustentavam que os argentinos jamais apoiariam cortes tão profundos.
O presidente agora tem uma rara oportunidade de lançar uma segunda leva de reformas. A tarefa urgente é completar a transição da Argentina para a normalidade macroeconômica. Isso começa com a flutuação plena do peso. Milei passou a depender demais de uma moeda artificialmente valorizada para conter a inflação, o que prejudicou o crescimento e dificultou a acumulação de reservas internacionais. Sua vitória eleitoral torna possível uma desvalorização ordenada, mas o tempo é curto. Após um breve rali pós-eleitoral, o peso voltou a cair em direção ao limite inferior da faixa em que hoje é permitido flutuar.
Além de eliminar, ou ao menos alargar, essa faixa, o governo precisa adotar uma política monetária clara, que use as taxas de juros para ancorar a inflação. Também deve acumular reservas externas. Feito isso, a Argentina poderá recuperar o acesso aos mercados globais de capitais e refinanciar parte de sua dívida. Cerca de US$ 20 bilhões vencem no próximo ano.
Milei também precisa criar condições para o crescimento. Liberalizar o mercado de trabalho e simplificar o sistema tributário seriam bons começos. Essas medidas reforçariam as reformas financeiras, impulsionando a economia e a popularidade do presidente e abrindo caminho para enfrentar temas mais espinhosos, como a reforma da Previdência.
Para aprovar leis, ele precisa de uma coalizão no Congresso e do apoio dos governadores provinciais. Investidores exigem segurança jurídica e estabilidade; a agressividade do governo, por vezes direcionada a instituições independentes, não pode minar isso. Uma reforma ministerial ajudaria.
Milei tem a chance de melhorar a Argentina de forma duradoura, transformando os termos do debate político. A cada ciclo eleitoral, os mercados oscilam com a possibilidade de uma vitória dos peronistas gastadores. O país só se tornará "normal" quando tiver uma oposição que também defenda disciplina fiscal. Se as reformas de Milei tornarem a Argentina mais próspera e estável, isso poderá obrigar o peronismo a adotar a racionalidade fiscal.
O caminho, no entanto, está repleto de armadilhas. A arrogância e o estilo combativo do presidente podem ser seu tropeço. Ainda assim, sua trajetória já oferece lições ao mundo —e, em breve, pode oferecer mais.

 
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