sexta-feira, 31 de outubro de 2025

Paulo Solmucci - O FGTS é do trabalhador e de ninguém mais, FSP

 

Paulo Solmucci

Presidente-executivo da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) e membro do Conselho de Administração da Unecs (União Nacional de Entidades do Comércio e Serviços)

Quase 37 milhões de trabalhadores brasileiros com carteira já aderiram ao saque-aniversário do FGTS, e 26,4 milhões de fato fizeram o pedido de liberação, o que mostra o sucesso do programa, criado em 2019.

Mas, afinal, o que é o saque-aniversário? Trata-se da possibilidade de o trabalhador antecipar parte do saldo do FGTS, valor que só poderia acessar em caso de aposentadoria ou demissão, para utilizar conforme sua conveniência no presente. Ou seja, é o direito de acessar um dinheiro que já lhe pertence, sem depender de situações excepcionais.

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Trabalhadores com carteira assinada têm direito ao FGTS - Gabriel Cabral/Folhapress

Agora, o governo federal impôs restrições ao programa, válidas já a partir deste sábado (1º). O valor máximo antecipado será de R$ 2.500 em até cinco anos, com parcelas de até R$ 500 por ano. O trabalhador teria acesso a apenas uma operação de crédito ativa por vez ao antecipar o saque. Além disso, haverá um prazo de 90 dias entre o pedido e a liberação do dinheiro.

A justificativa oficial, segundo o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, seria proteger o trabalhador de abusos do sistema financeiro, já que teria de pagar juros pela antecipação. Mas, na prática, o teto dos juros é de 1,79% ao mês, bem inferior ao praticado em outros tipos de crédito no mercado. O argumento revela uma espécie de paternalismo: o governo supõe que o trabalhador não sabe decidir sozinho sobre suas próprias finanças e precisa ser tutelado.

Aqui surge um contrassenso: o governo propõe isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000, classificando esse grupo como "pobre", mas limita o acesso ao saque-aniversário, que atende justamente os mais vulneráveis. Se quem ganha R$ 5.000 é considerado pobre, por que impedir que trabalhadores de renda ainda menor possam acessar um recurso essencial para quitar dívidas ou enfrentar emergências? Isso joga por terra o discurso do governo de que quer tirar dos ricos e proteger os pobres.

Não bastasse essa contradição, a real motivação parece ser reter o dinheiro dos trabalhadores para financiar o setor imobiliário, como já tentado em outras ocasiões. Vale lembrar que o FGTS já soma R$ 680 bilhões, crescendo ano a ano, mesmo com as regras atuais.

Importante destacar que a primeira tentativa de restringir o saque-aniversário foi barrada pelo Congresso, que representa os interesses do povo. Mesmo após esse recado claro, desafiando o que foi decidido pelos parlamentares, o governo optou por impor as mudanças por meio de ato administrativo do Ministério do Trabalho, ignorando o debate democrático sobre o tema.

As novas regras terão impactos negativos profundos. Primeiro, prejudicam diretamente os trabalhadores, restringindo sua capacidade de usar o próprio dinheiro para cobrir dívidas mais caras. Segundo dados do Datafolha de abril de 2024, 73% dos que usam o saque-aniversário o fazem para quitar contas em atraso. Segundo, prejudicam o país: o saque-aniversário injetou R$ 206 bilhões na economia, estimulando consumo, emprego e renda.

Em todos os aspectos, limitar o saque-aniversário é prejudicar os trabalhadores brasileiros e o Brasil, e atinge de modo especialmente cruel os mais pobres. É direito do trabalhador decidir como usar seu próprio dinheiro.

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