domingo, 21 de setembro de 2025

Como educar nossos filhos diante da inteligência artificial?, Ronaldo Lemos, FSP

 Meu filho nasceu em julho de 2025. No dia do seu nascimento, o valor investido em inteligência artificial já superava US$ 1 trilhão (R$ 5,3 trilhões). Esse é o maior projeto da humanidade. Ultrapassa com folga a ida à lua, a criação da bomba atômica e todo o desenvolvimento da internet somados.

Se há algo que podemos afirmar a partir desses números é que nas próximas décadas vamos viver inevitavelmente no meio da inteligência artificial. Isso coloca uma pressão enorme sobre governos, empresas, organizações e, sobretudo, cada pessoa. Especialmente se você precisa educar alguém.

As escolas não estão preparadas para a tarefa e boa parte da responsabilidade sobre "o que fazer?" recairá sobre os pais. Vou compartilhar minha visão pessoal, especialmente porque vejo muita ansiedade sobre o tema.

A imagem mostra um grupo de crianças em uma sala de aula de informática. Elas estão sentadas em mesas, concentradas em seus laptops. Dois meninos estão em primeiro plano, um deles com uma expressão de surpresa ou curiosidade, enquanto o outro parece focado na tela. Ao fundo, outras crianças também estão usando computadores. O ambiente é claro e moderno, com fones de ouvido e cabos visíveis.
Crianças assistem a uma conferência sobre Inteligência Artificial em uma sala de informática da escola Yanchuan, no distrito de Zhangxian, na cidade de Dingxi da província de Gansu, no noroeste da China - Chen Bin 10.set.25/Xinhua

O desafio central é evitar que as crianças deleguem para a IA habilidades essenciais, a ponto de ficarem dependentes da tecnologia. A IA pode levar a um novo tipo de incapacidade. Para muita gente será difícil escrever, fazer contas, conversar, preencher um formulário, ficar em paz consigo mesmo, ou até se entreter sem algo derivado de uma máquina.

educação será bem-sucedida se evitar que a IA se converta em substituto da aquisição de habilidades, permitindo, ao contrário, que amplifique as habilidades adquiridas.

Vale lembrar a frase de Mcluhan: "O conteúdo de qualquer mídia é sempre outra mídia". As novas mídias absorvem as anteriores. A escrita absorveu a fala. O cinema absorveu o teatro e a literatura. A TV absorveu o cinema. A internet absorveu tudo isso. E a inteligência artificial absorveu a internet.

O resultado prático é: não deixe que ninguém diga que as habilidades que você adquiriu no passado se tornaram obsoletas. É o oposto. No contexto da IA, a formação de repertório e de habilidades torna-se mais essencial do que nunca. São fiadores dos espaços de autonomia possíveis.

Qual a idade em que uma criança deve começar a usar a IA? Uma boa resposta a essa pergunta aprendi na Estônia. O país está na liderança no teste PISA na Europa e é o mais avançado no uso da IA para a educação. As escolas do país oferecem a versão mais avançada do ChatGPT para todos os alunos. No entanto, só a partir dos 14 anos.

A constatação estoniana é que a criança até os 7 anos tem de aprender essencialmente uma coisa: ser gente. Regular seus sentimentos, aprender a conviver com outras pessoas, saber se vestir, se organizar, se alimentar, ter autonomia. Dos 7 aos 14 é hora de ensinar habilidades e repertório. A IA torna-se útil só a partir daí.

Outra dimensão é a ética. O uso da IA requer uma habilidade essencial: a prudência. A IA só é útil, inclusive profissionalmente, para quem a utiliza com prudência. Isso significa entender como ela funciona e seus resultados, o que inclui a capacidade de filtrá-los, refutá-los ou aceitá-los. Sem a prudência o uso da IA é um risco constante, que supera qualquer benefício.

Em suma, a tarefa de educar nossos filhos em face da IA é conseguir expô-los o máximo possível à vastidão, complexidade e contradições do conhecimento humano. Resistindo à sombra apaziguadora projetada pela IA.

Já era - achar que IA torna o conhecimento obsoleto
Já é - compreender autonomia frente à IA depende de repertório e habilidades
Já vem - cada vez mais necessidade de prudência no uso da IA

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