Sou a pessoa menos religiosa (e "espiritual") que conheço, mas tenho um santo favorito. É são Tomé. Gosto dele porque personifica o saudável ceticismo, que, antes de acreditar, cobra razões objetivas para sustentar a crença.
Dizem que a equipe econômica prepara um pacote de cortes de gastos com o objetivo de dar sustentabilidade permanente ao arcabouço fiscal do ministro Fernando Haddad. É ver para crer.
Apresentar um conjunto de medidas que satisfaça às exigências aritméticas impostas pelo nó fiscal brasileiro já é difícil, mas essa é a parte fácil do problema. As dificuldades vêm em camadas. Um pacote que pare em pé precisará ainda passar incólume por Lula, pelo Congresso e pelo Judiciário.
No que talvez seja uma tentativa de traçar linhas vermelhas, Lula já começou a dizer que despesas em educação e saúde são investimentos e não gastos. Parece haver uma crença razoavelmente disseminada de que a qualidade dos gastos (as "boas causas") é capaz de expandir o Orçamento. Não é.
Não discordo de que existem gastos melhores e piores, mas acho que o poder público só deveria incorrer em despesas do primeiro tipo. E não nos faltam as do segundo. Não é difícil ver que, se o governo gasta repetidamente mais do que arrecada, acabará gerando desequilíbrios (inflação, prêmio de juros, alta na dívida) que impactarão negativamente o crescimento futuro. A maior parte dos políticos não é burra e enxerga isso.
A questão é que quem está fora da política olha para o tempo de forma contínua, enquanto os detentores de mandato precisam pensá-lo em "quanta" de quatro anos. Se, para o observador desapaixonado, o tamanho da dívida pública em 2028 é uma preocupação, para um Lula ou um Lira, 2028 só será uma realidade observável se eles passarem pelo crivo popular em 2026.
Esse viés curto-prazista é um problema com o qual a democracia não lida bem. Nós chamamos de estadistas os líderes que conseguem pôr o longo prazo à frente de seus interesses pessoais e fazer avançar agendas decisivas para o país. Estadistas são extremamente raros.
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