terça-feira, 8 de outubro de 2024

Linha digital-radical sobressai na reta final de eleição com direita vitoriosa, Fabio Victor, FSP

 Fabio Victor

Fabio Victor

Repórter especial da Folha, é autor do livro 'Poder Camuflado' (Companhia das Letras), ganhador do Prêmio Jabuti

SÃO PAULO

Ainda que detectada nas pesquisas da véspera da eleição, a arrancada da jornalista de direita radical Cristina Graeml (PMB) em Curitiba, garantindo a ida ao segundo turno junto com Eduardo Pimentel (PSD), foi possivelmente a maior surpresa deste primeiro turno nas principais capitais do país.

Em meados de setembro, ela aparecia em quinto lugar, com 5%. Superou tanto o ex-prefeito Luciano Ducci, candidato da união entre PSB, PT, PC do B, PV e PDT, como o ex-deputado federal Ney Leprevost (União Brasil), candidato de uma direita mais tradicional, apoiado por Sergio Moro e cuja vice era Rosangela Moro. Maior derrotado do pleito, Leprevost terminou com 6,4%.

Cristina Graeml (PMB), candidata a prefeita de Curitiba
A jornalista Cristina Graeml (PMB), que disputará o segundo turno em Curitiba com Eduardo Pimentel (PSD) - @cristinagraeml no Instagram

O feito de Graeml (pronuncia-se Grêmel) exprime não somente a força da direita de modo geral neste primeiro turno em todo o Brasil, mas de uma vertente específica dentro do espectro conservador: mais radical e mais digital, que domina as redes sociais com mais eficiência.

Jornalista, Graeml trabalhou na Gazeta do Povo e na Jovem Pan, dois veículos alinhados ao bolsonarismo nos últimos anos. Por um comentário dela (chamando de "bandido" o advogado Cristiano Zanin, hoje ministro do STF), a Jovem Pan foi condenada na Justiça a pagar R$ 34,2 mil a Zanin.

Com o racha da direita no segundo turno curitibano, Jair Bolsonaro –que apoia oficialmente Pimentel, cujo vice é do PL, mas gravou vídeos para Graeml– terá de se decidir. Ou não, repetindo o jogo duplo que fez em parte da campanha em São Paulo.

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Por todo o país, os direitistas digitais-radicais –ou "bolsonaristas 5G"– sobressaíram na disputa com seus pares mais moderados e mais analógicos.

Em Fortaleza, o líder do primeiro turno foi o André Fernandes (PL), um ex-youtuber que, na Câmara, votou contra o projeto de lei que ampliou a pena para feminicídio e o que impõe igualdade salarial entre mulheres e homens e foi condenado a indenizar a repórter Patrícia Campos Mello, da Folha, por ofensas de cunho sexual.

Ao longo da campanha, o "radical-digital" André superou o ex-aliado e também direitista Capitão Wagner (União Brasil), apoiador de Bolsonaro em 2018 e 2022, mas bem mais moderado.

Na divisão da direita em Belo Horizonte, o vitorioso também foi um "bolsonarista 5G", Bruno Engler, unha e carne com Nikolas Ferreira, um dos mais populares integrantes dessa cepa.

Em Goiânia, seu representante é Fred Rodrigues (PL), autor de um projeto que transforma a leitura da Bíblia no Legislativo em patrimônio e que usou na campanha o slogan de Bolsonaro (e dos fascistas no século passado) "Deus, Pátria e Família".

Apoiado por Bolsonaro, terminou à frente do também direitista Sandro Mabel (União Brasil), apoiado pelo governador Ronaldo Caiado.

Não por coincidência, GraemlAndréEngler e Fred lideraram o Índice de Popularidade Digital da Quaest nesta campanha mesmo quando estavam bem atrás nas pesquisas de intenção de votos.

Nascido na mesma Goiânia que Fred, Pablo Marçal tem um lugar de honra nessa galeria. É verdade que, no fim das contas, perdeu –por pouco. Mas também é inegável que Marçal foi um dos fenômenos desta eleição, talvez maior que Graeml (com quem trocou declarações de apoio).

Em termos absolutos, teve mais votos que todos (1,7 milhão), pautou a campanha na principal cidade do país e ficou bem próximo de ir ao segundo turno –vinha numa crescente, e é possível que a tresloucada cartada final do laudo falso tenha lhe custado a vaga.

Contingências do radicalismo. Como ensinou o (nada radical nem digital) Tancredo Neves: a esperteza, quando é demais, engole o dono.

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