SÃO PAULO
O psicólogo Barry Schwartz ficou famoso ao explicar o que chamou de "paradoxo da escolha". Em resumo, o excesso de opções acaba deixando os consumidores paralisados ou insatisfeitos. O mercado financeiro vive algo semelhante em relação aos títulos de renda fixa.
Nesta semana, ouvi de experientes gestores de fundos que está difícil comprar grandes volumes de bons papéis de crédito privado —como as famosas debêntures (títulos de dívida de empresas), CRAs (certificados de recebíveis do agronegócio) ou CRIs (certificados de recebíveis imobiliários).
É de se estranhar a afirmação, já que tivemos uma enxurrada desse tipo de oferta no mercado. E não foi uma enxurrada qualquer. Trata-se de recorde nacional. As empresas brasileiras captaram R$ 480,7 bilhões com a emissão de papéis de renda fixa até setembro deste ano, aponta a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).
Só por meio de debêntures, as empresas já embolsaram R$ 315 bilhões. No ano passando inteiro, foram R$ 236 bilhões —são 33% a mais, faltando ainda um trimestre para o ano acabar.
A oferta aumentou consideravelmente, uma vez que o dinheiro dos bancos está caro —com uma persistente taxa de juros de dois dígitos— e a roda precisa girar. Só que a demanda parece ter aumentado em velocidade ainda maior.
Com um mercado de ações que anda de lado, em meio a uma seca de novas ofertas públicas de ações (IPOs), está difícil arrumar bons ativos. Na falta de opção, todo mundo quer um pedaço dos novos papéis de renda fixa.
E você bem sabe que o mercado funciona exatamente pelo desequilíbrio entre oferta e demanda. Quando muitos querem os papéis, seus emissores não precisam pagar prêmios muito altos para conseguirem compradores. Aí está um dos problemas que tem levado fundos a ficarem "parados", mesmo com o aumento das emissões.
O outro problema está na qualidade dos emissores. Não adianta comprar um CRA com retorno previsto de 16,5% ao ano se a empresa que emitiu o título pode dar um calote nos investidores.
Recentemente, o pedido de recuperação da AgroGalaxy gerou insegurança em diversos fundos que tinham CRAs da companhia em suas carteiras. Na última semana, outra companhia grande do agronegócio, Green Farming, também protocolou pedido de recuperação, apontando como principal credora justamente a securitizadora responsável pela emissão de CRAs da empresa, em 2022. Sem citar a criminosa fraude da Americanas ou os calotes da Light, que deixaram todo mundo mais criterioso —com razão.
Mas nem só de crises vive o mercado (ainda bem). E encontrar boas oportunidades nesse mar de papéis que inundam as prateleiras dos bancos depende, hoje, mais de identificar bons emissores do que apostar nas maiores taxas. Claro que risco e retorno ficam de lados opostos da gangorra, mas, sem perspectiva de uma mudança que facilite a vida das empresas no Brasil, os profissionais do mercado têm optado pelo lado da segurança.
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