Não é porque a historiografia trata de eventos que já aconteceram e por definição não podem mais ser alterados que ela não avança. O acesso a mais fontes, mudanças em perspectivas teóricas, além do desenvolvimento de novas tecnologias, permitem quando não recomendam a reinterpretação de fatos pregressos.
Em "Hitler´s People" (o povo de Hitler), Richard Evans tenta responder àquelas questões que jamais vão embora. Como os alemães, um dos povos mais instruídos da Europa, puderam apoiar Hitler? Por que persistiram por tanto tempo nesse apoio?
Evans toma como modelo obras consagradas sobre o nazismo, como as de Joachim Fest e Ian Kershaw, e se beneficia da abertura, nos anos 90, de arquivos soviéticos que lançaram novas luzes sobre velhas figuras. Esse material não provoca nenhuma reviravolta interpretativa, mas fornece detalhes importantes.
Evans tenta responder às questões seminais traçando perfis das figuras que tornaram o nazismo possível. E o faz em camadas. Começa com Hitler, continua com os paladinos (Göring, Goebbels, Röhm, Himmler, Von Ribbentrop, Rosenberg e Speer), passa a uma espécie de segundo escalão, no qual se destacam personagens como Heydrich, Streicher e Von Pappen, e conclui com o que chama de "instrumentos", pessoas que não tinham envolvimento profundo com a cúpula nazista, mas trabalharam a favor dessa ideologia, como a cineasta Leni Riefenstahl e o general Von Leeb.
O resultado são quase 600 páginas muito bem escritas e altamente informativas. Ficamos sabendo não apenas o que os biografados fizeram nos anos sombrios do nazismo mas também como, em alguns casos, operaram para se livrar das responsabilidades. Speer, por exemplo, teve sucesso em fazer uma espécie de lavagem de seu passado nazista.
Evans também se beneficia do afastamento temporal. Para os contemporâneos do nazismo e as primeiras gerações posteriores a ele era importante, por exemplo, tentar pintar Hitler como uma figura que de alguma forma não pertencia à humanidade. Hoje sabemos melhor do que humanos são capazes.
helio@uol.com.br
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