Sou fã incondicional do voto útil, que é um outro nome para pensamento estratégico. O panorama da disputa pela prefeitura paulistana, contudo, dá um nó nos raciocínios que normalmente embasam um voto útil.
A grande dificuldade é definir o objetivo que orienta as preferências do eleitor. Uma meta "civilizacional" defensável seria excluir do segundo turno o candidato extremista e antissistema que é Pablo Marçal. Seria uma aposta na volta da normalidade eleitoral, com um candidato mais à esquerda enfrentando um da direita republicana.
Nesse contexto e considerando que é a direita que está dividida, o mais lógico seria votar em Ricardo Nunes. Reforça esse raciocínio a alta probabilidade de Marçal ser beneficiário de um voto envergonhado, não captado pelas pesquisas.
Embora a chance de um segundo turno paulistano sem um representante da esquerda seja historicamente baixa, ela é diferente de zero. Assim, se o eleitor com inclinações progressistas vota em Nunes para tirar Marçal e isso acaba custando a vaga de Guilherme Boulos, ele se condenará a uma espécie de opróbrio de consciência eterno.
Em nenhum lugar está escrito que o pensamento estratégico deve ficar limitado ao primeiro turno. É perfeitamente possível e legítimo estendê-lo para a segunda votação, o que torna o espaço de raciocínios possíveis ainda mais exuberante.
O eleitor de esquerda está obviamente interessado em eleger um prefeito de esquerda. E, dado que o campeão de rejeições é Marçal, seguido por Boulos, o melhor caminho para a vitória do psolista é enfrentar o ex-coach. Progressistas corajosos deveriam votar em Marçal no primeiro turno para facilitar a eleição de Boulos no segundo.
Generalizando um pouco mais e considerando que a rejeição a Marçal é tão alta que praticamente inviabiliza suas chances de vitória final, alguém pode ficar tentado a dizer que o que mais amplia a utilidade do voto é o eleitor, no primeiro turno, escolher o candidato que corresponde a sua preferência genuína, o que, paradoxalmente, é uma negação do voto útil.
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