Um amigo meu, a respeito de um artigo na Folha, referiu-se ao fato de tê-lo lido “no impresso”. Queria dizer, claro, que o lera no jornal de papel. Ao ouvir isso, ocorreu-me que cada vez mais pessoas chamam de “impresso” o jornal que se compra na banca ou se recolhe pela manhã na porta do apartamento, para diferenciá-lo do online. E me ocorreu também que, mais uma vez, a substituição de um formato por outro fará com que o antigo é que tenha de mudar de nome para dar lugar ao novo.
Foi o que aconteceu quando o CD começou a se impor sobre o LP, nome pelo qual o disco de vinil foi chamado durante os seus cerca de 50 anos (1948-98) no mercado. Pois, com a chegada do CD, que era um disco metálico, o LP passou a ser chamado de “vinil” —quando, se fosse o caso, o CD, como novidade, é que devia ser chamado de “metal”. O que, com atraso, ainda pode acontecer, agora que o CD também foi reduzido a peça de museu pelas novas tecnologias.
Ninguém na Idade Média (500-1500) dizia que estava vivendo na Idade Média, e muito menos era xingado de medieval. A pecha só se estabeleceu quando veio o Renascimento. Também se diz sem pensar que dom João 6º trouxe a família real para o Brasil em 1808. Mas quem fez isto foi o príncipe-regente dom João, que só se tornou dom João 6º ao ser coroado rei, em 1816.
O advento da Segunda Guerra (1939-1945) transformou em Primeira Guerra o que até então se conhecia como a Grande Guerra (1914-1918). No Brasil, a Revolução de 1930 não derrubou a República Velha. Derrubou a República de 1889 e, para indicar a ruptura, passou a chamá-la de Velha. E o sanfoneiro Luiz Gonzaga sempre foi Luiz Gonzaga, até ser eclipsado por seu filho Gonzaguinha e tornar-se, retroativamente, Gonzagão. Etc.
Donde parece inevitável que este nosso velho amigo matinal, que nos abraça ao ser aberto, em breve se torne “o impresso”, e estaremos conversados.
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