domingo, 21 de março de 2021

O agro é tech e expande os serviços, Celso Ming, O Estado de S.Paulo


20 de março de 2021 | 08h00

Muita gente ainda olha o agronegócio como um setor que gera pouca atividade da porteira para fora. Mais ainda, que é um negócio ligado a mentalidades quase sempre conservadoras, que gera pouco emprego e está excessivamente voltado para as exportações.

Quem ainda pensa assim precisa se atualizar. Uma das consequências da boa fase do agronegócio no Brasil é a grande expansão de toda uma rede de serviços a ele ligada. Tem a ver com tecnologia avançada, consultoria, armazenamento, transportes modais, serviços de informática, de mecânica e manutenção, biotecnologia, construção civil e por aí vai.

A principal mudança nessa área não pode ser medida. É a mudança de mentalidade. O agricultor e o pecuarista se deram conta de que o futuro dele e de seu negócio depende de incorporação de tecnologia, adoção de novos métodos em áreas como de preparo da terra, seleção de sementes, adubação, irrigação, manejo, armazenamento e escoamento da produção.

O agricultor e o pecuarista passaram a entender que não podem parar de inovar, que precisam investir em si próprios, em busca de mais conhecimentos. A apropriação de tecnologias digitais modifica a dinâmica produtiva convencional e favorece o desenvolvimento de atividades satélites.

Há um enorme atraso a tirar quando se fala em inovação. Pesquisa da consultoria McKinsey & Company mostrou que apenas 23% dos agricultores brasileiros contam com acesso à internet em suas operações agrícolas. É um campo aberto para grande número de empresas e de redes de apoio.

Embora tenha apresentado bons números em geração de emprego nos últimos trimestres de 2020, o agronegócio fechou o último ano com recuo em postos de trabalho de 5,2%, em comparação com 2019, de acordo com dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP. Essa queda foi considerada atípica e atrelada, em parte, aos efeitos da pandemia, principalmente entre os meses de abril e junho. Mas, em 2020, além de uma safra recorde, o PIB do agronegócio brasileiro acusou crescimento recorde de 24,31%, de acordo com cálculos do Cepea.

Felippe Serigati, professor e pesquisador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas, chama a atenção para um dos impactos da boa fase do setor: “Bons momentos como foram os do agronegócio no ano passado geram desdobramentos positivos tanto na geração de postos de trabalho como na adoção de novas tecnologias”.

Agronegócio
O agricultor e o pecuarista se deram conta de que o futuro dele e de seu negócio depende de incorporação de tecnologia. Foto: Marcos Müller/Estadão

expansão das fronteiras agrícolas apresenta desafios logísticos e de produção e cria ambiente propício para formação de cadeias especializadas no atendimento dessas novas exigências. É que produzir mais longe implica enfrentar maiores custos a serem reduzidos com aumento da produtividade. É uma situação que gera oportunidades para novas empresas, novas profissões, novas especialidades, mais empregos.

A inovação não acontece apenas com máquinas modernas, drones e chips, mas com processos de produção e compartilhamento de novas ferramentas de gestão. São coisas que o produtor não aprende só com experiência, exigem instrução.

“A demanda por esse tipo de tecnologia acaba gerando oportunidades de trabalho e criação de novos negócios. Embora não estejam diretamente ligados à produção, são esses agentes que darão suporte para que os avanços aconteçam”, pontua Serigati.

A seguir, dois exemplos. No município de Luís Eduardo Magalhães, oeste baiano, conhecido como a capital do Matopiba – nova fronteira agrícola do País que abrange os estados do MaranhãoTocantinsPiauí e Bahia – , a aceleradora de startups Cyklo Agritech, lançada em setembro de 2019, atua em soluções de problemas numa região que ainda opera com limitações de logística.

Dioxd, uma das empresas que passaram pela aceleração da Cyklo Agritech, trabalha com aumento da produtividade a partir do tratamento de sementes, como soja e feijão, com gás carbônico.

Felipe Matos, presidente da Associação Brasileira de Startups (Abstartups) mostra especial entusiasmo por essa área. As oportunidades de investimentos e de aceleração das agtechs – como são conhecidas as startups focadas em soluções para o agronegócio – tendem a se intensificar neste ano. “O agro é um dos setores que vêm crescendo e isso chama a atenção dos investidores. A pandemia forçou a digitalização. O potencial de desenvolvimento dessa área é muito grande.”/COM PABLO SANTANA

*CELSO MING É COMENTARISTA DE ECONOMIA 


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