As coisas que não são um problema em geral nem entram em nosso radar. No Brasil, não nos preocupamos, por exemplo, com nevascas nem com terremotos —e ninguém precisa nos lembrar de que esses fenômenos não constituem ameaça.
"A contrario sensu", se comandantes militares e outras autoridades sentem necessidade de afirmar e reafirmar que não há risco de golpe, como acontece hoje, então devemos nos preocupar. Não significa, é claro, que tais eventos necessariamente ocorrerão, mas é um sinal claro de que a paisagem institucional se deteriorou. Quando não há mesmo risco de golpe, ninguém precisa nos dizer que não há risco de golpe.
Não creio, porém, que nosso prepóstero presidente tenha condições de desferir um ataque institucional com boas chances de sucesso. Ele, afinal, só deflagrou essa estranha reforma ministerial porque está fragilizado. Perdeu o apoio da fatia mais significativa do PIB, vem se indispondo com os principais governadores e prefeitos, vê sua popularidade encolher nas pesquisas e, constatamos agora, já não conta nem mesmo com o respaldo da cúpula militar.
Bolsonaro ainda tem o suporte do centrão —mas só enquanto for capaz de entregar cargos e verbas e não se tornar um nome tóxico demais— e, de forma talvez mais inquietante, de grupos armados de policiais, soldados e baixo oficialato. Se não fizer nenhuma nova bobagem maior, Bolsonaro deve conseguir arrastar-se pelos próximos meses sem ser defenestrado.
Em 2022, se a epidemia tiver refluído o bastante e a economia voltar a crescer de forma perceptível, ele será um candidato à reeleição competitivo, apesar do rastro de destruição humana, econômica, institucional e moral que seu governo terá deixado atrás de si.
Quanto aos brasileiros, teremos de nos haver com os historiadores do futuro, por nem termos tentado de verdade tirar esse homem de um posto que ele jamais deveria ter assumido.
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