quinta-feira, 11 de setembro de 2025

Réplica: Conformidade, orientação e transação: construindo um Brasil mais justo, FSP

 

Anelize Almeida

Procuradora-geral da Fazenda Nacional

Robinson Barreirinhas

Secretário especial da Receita Federal

Ainda na transição de governo, o ministro Fernando Haddad atribuiu uma missão clara à Receita Federal e à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional: transformar a relação do Estado com o contribuinte, reduzindo o litígio e fortalecendo a orientação, a conformidade e os instrumentos modernos de solução consensual de conflitos.

A realidade brasileira sempre foi marcada por um modelo de tributação conflituoso. Herdamos um sistema tributário anacrônico, um verdadeiro labirinto de regras que, por décadas, serviu de escudo para maus pagadores e paralisou investimentos, punindo o bom contribuinte e atrasando o desenvolvimento do país.

Esse ambiente fomentou a litigiosidade, diminuindo a arrecadação e criando um enorme contencioso administrativo e judicial.

Fachada do prédio da Superintendência da Receita Federal em Brasília - Antonio Molina - 4.jan.2022/Folhapress

Nos últimos anos, essa lógica vem sendo gradualmente substituída por um novo paradigma. A estratégia combina a orientação e o estímulo à autorregularização, a cobrança amigável e, sobretudo, a utilização da transação tributária como mecanismo de pacificação e de recuperação de créditos, que além de recompor os cofres públicos, tem o importante papel de desafogar o Poder Judiciário.

Trocamos o embate pela consensualidade, analisando o histórico e a capacidade de pagamento de cada contribuinte para encontrar uma solução justa, distinguindo o devedor contumaz daquele que busca a regularização.

A Receita Federal implementou o Litígio Zero em 2023, oferecendo pela primeira vez, de maneira efetiva, a transação em todas suas modalidades para contribuintes sem capacidade de pagamento. Em 2024, Receita Federal e PGFN uniram forças para promover a transação conjunta de grandes teses tributárias, inovando ao buscar soluções consensuais para discussões de elevado impacto econômico e social.

Já em 2025, com o lançamento do Programa de Transação Integral (PTI), ambos os órgãos passaram a atuar de forma coordenada para resolver litígios históricos, reforçando a cultura de diálogo e cooperação.

A transação tributária não é apenas um instrumento de cobrança: é a afirmação de que o Estado brasileiro reconhece a importância da continuidade das atividades empresariais e do equilíbrio concorrencial. Ela se baseia na análise concreta da capacidade de pagamento, no histórico de comportamento fiscal e na relevância das teses discutidas.

Dessa forma, promove-se a regularização responsável, sem premiar a inadimplência, mas assegurando que bons contribuintes possam retomar sua conformidade fiscal e jurídica.

Em um artigo publicado nesta Folha na última sexta-feira (5), Marcos Mendes demonstrou desconhecimento e cometeu ilações sobre essas transações, ao se referir à busca por receitas predatórias como um custo do suposto desajuste fiscal, que não existe. O pesquisador também apontou que há incentivo para transações em excesso, com descontos elevados. Não é verdade.

Os números evidenciam o avanço: embora a arrecadação com transações seja expressiva (R$ 59,9 bi em 2024), ela permanece proporcionalmente menor que a obtida pela cobrança amigável (R$ 171 bi em 2024) e marginal diante da arrecadação espontânea. Isso demonstra o equilíbrio da política adotada: a transação atua como ferramenta complementar, sem incentivar a inadimplência.

O modelo, por desenho, maximiza o retorno ao erário, alinhando os interesses em prol da sociedade, com um processo transparente e sujeito à fiscalização dos órgãos competentes.

Nosso compromisso inabalável é com a construção de um sistema tributário mais justo e eficiente para todos os brasileiros. A verdade é que estamos trabalhando para desmontar um sistema que beneficiava poucos e construindo, com diálogo e responsabilidade, um Brasil mais justo para todos.

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Desfaçatez política está a serviço do INSS, Romulo Saraiva- FSP

 Há um quarto de século, as últimas reformas previdenciárias realizadas no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) tiveram como justificativa a necessidade de regras mais rígidas em prol do bem-estar financeiro do sistema.

Os argumentos eram cíclicos. Necessidade de sustentabilidade financeira, preocupação com a transição demográfica e desequilíbrio fiscal. Todas convergentes na ideia: reformar hoje para garantir o amanhã.

Desde 1998, senadores e deputados federais se revezam nesse enredo, quase um mantra, para convencer o eleitorado a ter reformas previdenciárias extremamente duras. Mas em 2025 estes mesmos parlamentares esqueceram por um momento seus históricos argumentos.

A imagem mostra a fachada de um prédio do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) com uma porta de entrada em destaque. O nome 'INSS' está visível na porta, que possui um design arquitetônico clássico. Ao fundo, há outros prédios, incluindo um de cor verde e outros de tons neutros, sob um céu claro.
Superintendência Regional do Instituto Nacional do Seguro Social Sudeste I (INSS), localizada no Viaduto Santa Ifigênia, no centro histórico de São Paulo - Rafaela Araújo/Folhapress

O INSS, sempre tratado como desequilibrado financeiramente, apenas neste ano passou a ser visto como superavitário, visto que os parlamentares votaram no Congresso Nacional para que os recebíveis sejam adiados durante 25 anos.

Nesta semana, está sendo promulgada a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 66, de 2023, do senador Jader Barbalho Filho (MDB-PA), que autoriza municípios a parcelarem, a perder de vista, as dívidas com o INSS.

Ficará autorizado o parcelamento dos débitos decorrentes de contribuições previdenciárias dos municípios com o INSS, incluídas suas autarquias e fundações, mesmo em processos de execução fiscal ajuizados e aqueles parcelados anteriormente. O prazo inicial será de 20 anos em prestações mensais, podendo ser prorrogado por mais cinco anos.

Assim, de repente nossos parlamentares entenderam que o INSS pode esperar para receber valores que ajudam a pagar benefícios a milhares de brasileiros. A medida vai de encontro a tudo que se alardeava.

Em 1998, ano da criação da emenda constitucional 20, o então ministro da Previdência Social, Reinhold Stephanes, demonstrou preocupação com o saldo operacional negativo do INSS. Na exposição de motivos para a reforma, argumentou que seria necessário mudar as regras para "viabilizar financeiramente a Previdência Social, tornando-a ao mesmo tempo mais justa" e "garantir o pagamento dos benefícios previdenciários às próximas gerações, legando aos nossos filhos e netos um patrimônio construído com o esforço solidário de todos os brasileiros".

Em 2003, quando foi realizada outra reforma previdenciária, o ministro da Previdência da época, Ricardo Berzoini, fundamentou na exposição de motivos a necessidade da "persecução do equilíbrio financeiro e atuarial" pois "só assim será possível um sistema previdenciário verdadeiramente justo, viável e sustentável no longo prazo".

Em 2019, o então ministro Paulo Guedes defendeu uma reforma austera para melhorar a "sustentabilidade da nova Previdência, contribuindo para a redução do elevado comprometimento dos recursos públicos" e evitar o "crescimento explosivo da dívida pública".

A depender dos interesses políticos, há uma flexibilidade em promover a defesa das contas do INSS ou não.

O INSS padece de diferentes problemas em sua arrecadação. Mas o governo tem contribuído para esse agravamento, a exemplo de reiterados Refis, desoneração da folha de pagamento, desvinculação das receitas e falta de rigor em conceder certidão de beneficência para grandes conglomerados de hospitais e universidades, isentando-os de pagar contribuição previdenciária. Agora, foi a vez de dificultar que o INSS receba mais recursos devidos pelos municípios.