quarta-feira, 9 de abril de 2025

Direita patológica, Helio Schwartsman, FSP

 O mundo é mesmo um lugar injusto. Enquanto a direita brasileira padece do problema de excesso de candidatos para o pleito presidencial de 2026, a esquerda amarga a velha dependência de Lula, que é um outro jeito de dizer que, sem o nome do petista na urna, ela se veria em apuros.

Se Lula optar pela aposentadoria e a esquerda se dividir entre candidatos de peso eleitoral semelhante, corre o risco de nem passar para o segundo turno.

Um grupo de sete homens está posando para a foto em um ambiente interno. Eles estão vestidos com camisetas da seleção brasileira de futebol, predominantemente amarelas, com um homem usando uma camiseta azul. Todos estão com os braços cruzados e sorrindo. O ambiente tem um piso claro e paredes brancas.
Governadores presentes em ato convocado em São Paulo por Jair Bolsonaro pela anistia aos envolvidos no 8 de janeiro: Zema, Jorginho, Tarcísio, Bolsonaro, Caiado, Wilson Lima, Ratinho e Mauro Mendes - Vile Santos/Divulgação

Se olharmos para nomes individuais, também encontraremos problemas. Fernando Haddad é visto como um sucessor natural de Lula. Mas, se o presidente decidir não concorrer, será porque a economia não vai bem. E, se ela não estiver bem, Haddad, que é o ministro da Fazenda, não teria a menor chance.
Outro nome muito citado é o de Flávio Dino, mas há dúvidas de que ele trocaria um cargo vitalício no jardim das delícias do Judiciário pelas incertezas de um processo eleitoral. Uma solução mais heterodoxa seria o campo governista sair com um nome não exatamente da esquerda, mas da coalizão lulista, como

Geraldo Alckmin ou Simone Tebet, mas parecem nulas as chances de o PT chancelar algo assim. Já a direita, vista em bloco, está em melhor situação. Eu pelo menos não consigo visualizar um cenário em que ela não esteja no segundo turno. As dificuldades começam quando consideramos a situação pessoal de cada um dos postulantes.

Para chegar ao segundo escrutínio, eles precisam dos votos dos bolsonaristas. Com isso, o ex-presidente, que já está inelegível e possivelmente estará preso no ano que vem, os faz de reféns. Exige dos potenciais candidatos que lhe batam continência e defendam a anistia, sob pena de se verem exorcizados dos círculos bolsonaristas e perderem a passagem para o turno final.

Esse é um estado patológico. Para a democracia brasileira recobrar a saúde, a direita republicana precisaria romper de vez com o golpismo bolsonarista e reafirmar seu compromisso com as instituições.

Os governadores-candidatos estão fazendo exatamente o avesso do que deveriam.

A mancha de batom - Mariliz Pereira Jorge - FSP

 A extrema direita tem um talento indiscutível: se apodera de símbolos consagrados para defender o golpismo bolsonarista. Foi assim com a bandeira, o hino e as cores que representam todos os brasileiros.

É assim ao comparar os horrores da ditadura de 1964 ao rigor da lei com a qual é tratada por atacar a democracia.

Repete a dose ao tentar transformar o batom na representação do que juram ter sido um ato de resistência pacífica contra o Supremo Tribunal Federal. Michelle Bolsonaro ajudou a replicar a imagem do cosmético nas redes sociais e ao segurá-lo durante a sua fala em defesa da anistia para os envolvidos no 8 de janeiro, como Débora Rodrigues dos Santos, mais conhecida como a pichadora da estátua "A Justiça".

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Manifestante identificada como Débora Rodrigues dos Santos picha a estátua da Justiça, na praça dos Três Poderes, com a frase 'perdeu, mané' - Gabriela Biló/Folhapress

O deputado Nikolas Ferreira teve a pachorra de comparar a cabeleireira a Rosa Parks. A ativista negra norte-americana é lembrada por não ceder seu lugar no ônibus para um homem branco, ato corajoso de desobediência civil diante da lei segregacionista da época. Um marco na luta contra o racismo nos Estados Unidos. A comparação feita pelo parlamentar do PL é um acinte à história dos direitos humanos, mas alimenta a massa delirante bolsonarista.

A cabeleireira, precisamos repetir mil vezes, não estava sozinha na praça dos Três Poderes e, num ato impensado, subiu na obra de Alfredo Ceschiatti. Ela não é julgada por ter pichado uma estátua. As acusações são as mesmas enfrentadas pelos integrantes do grupo ao qual ela pertencia: abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa armada. Não importa que ela carregasse apenas um batom.

Num passado não tão distante, o cosmético deu nome à articulação feminina no período da Constituinte. Tratado como chacota no início, o "Lobby do Batom", formado por parlamentares e representantes da sociedade, foi estratégico para garantir avanços na igualdade de gênero.

O que a extrema direita faz é mais do mesmo: tenta sequestrar e manchar o símbolo de um movimento democrático para manipular a opinião pública e alçar a mártir mais uma potencial candidata em futuras eleições.

Os incentivos a estados e municípios, FSP Idiana Tomazelli

  

Brasília

Mesmo com o maior crescimento da economia, que impulsiona as receitas tributárias, e a expansão das transferências de recursos da União para os entes subnacionais, o Congresso Nacional aprovou um amplo socorro financeiro para os estados. Parece um paradoxo.

Se os governos regionais estão arrecadando mais —inclusive os mais encalacrados, como Minas Gerais e Rio de Janeiro—, seria natural imaginar que parte da melhora fiscal fosse usada para equilibrar suas finanças, seguindo boas práticas de gestão. A realidade, porém, mostra um quadro distinto.

O plenário do Senado Federal durante votação da renegociação da dívida dos estados; na imagem, os governadores Cláudio Castro (Rio de Janeiro) e Romeu Zema (Minas Gerais), além do então presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) - Pedro Ladeira - 17.dez.24/Folhapress

Nos últimos anos, estados e municípios usaram o reforço extra no caixa para acelerar despesas, que, no agregado, já superam os gastos diretos da União.

Os mais endividados brigam há anos na Justiça para se manter sob a proteção do RRF (Regime de Recuperação Fiscal) e evitar pagar suas dívidas com a União, ao mesmo tempo em que descumprem regras para dar aumentos salariais e gastar mais do que o acertado no plano de ajuste. Ainda assim, conseguiram liminares que reduziram o valor da parcela da dívida, afastaram punições ou proibiram o bloqueio de valores que, por contrato, deveriam ressarcir o Tesouro Nacional.

O próprio governo federal já fez o diagnóstico de que o alívio proporcionado pelo RRF está sendo canalizado por alguns estados para gastos com pessoal, em total contradição com os princípios do programa. Ainda assim, avalizou um novo socorro que não só dispensa contrapartidas efetivas de ajuste, mas beneficia até mesmo estados que estão com o pagamento em dia. É alívio de mão beijada para injeção de despesas na veia.

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O Tesouro nega que haja uma crise dos estados. Se ela não existe, não havia motivo para socorro. O que o passado recente nos ensina é que é preciso ter atenção e cuidado com os incentivos que Executivo, Legislativo e Judiciário dão aos governos subnacionais.