terça-feira, 17 de setembro de 2024

Viver -(queimadas, multas) MEIO

 O governo federal adiou para hoje o anúncio de medidas contra as queimadas que assolam o país. O presidente Lula terá uma reunião à tarde com chefes dos demais Poderes para articular medidas de combate à crise climática, incluindo medidas provisórias. Ontem pela manhã, Lula se reuniu com os ministros Marina Silva (Meio Ambiente), Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) e Jorge Messias (Advocacia-Geral da União). Inicialmente, o Palácio do Planalto planejava fechar um pacote de medidas e anunciá-lo ontem mesmo. A crise climática e o aumento dos incêndios vêm dando munição à oposição, especialmente à ala ligada ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), duramente criticado em 2020 pelas queimadas no Pantanal. (Folha)

E com uma política de tolerância zero, a Advocacia-Geral da União acionou ontem a Justiça Federal do Pará para cobrar R$ 635 milhões de cinco fazendeiros como compensação financeira por danos climáticos causados pela destruição do Parque Nacional de Jamanxim em 2023. Essa é a primeira ação apresentada em nome do Instituto Chico Mendes (ICMBio) e o maior valor já pedido pela AGU em uma ação climática. Normalmente, as ações ambientais requerem recuperação da área desmatada e pagamento de danos morais coletivos. Agora, a AGU está identificando individualmente cada infração que resultou em emissões dos gases poluentes que, consequentemente, contribuíram para agravar a emergência climática. Entre junho e agosto deste ano, as queimadas na Amazônia já geraram 31 milhões de toneladas de gás carbônico (CO2) na atmosfera, o equivale a um mês de emissões do Reino Unido. (g1)

O incêndio que atingiu o Parque Nacional de Brasília no domingo se alastrou ontem, cruzando o rio Bananal e se dividindo em quatro frentes diferentes, segundo o ICMBio. O fogo que destruiu 700 hectares pela manhã chegou a 3.000 hectares do parque à tarde. Devido à fumaça, a Universidade de Brasília anunciou a suspensão das atividades. (Folha)

Cadeirada vira caso de polícia e Datena diz que ‘repetiria o gesto’, MEIO

 A cadeirada de José Luiz Datena (PSDB) contra Pablo Marçal (PRTB) durante debate na TV Cultura no domingo saiu da esfera da política e migrou para a policial. Os advogados do ex-coach tentaram classificar o caso como tentativa de homicídio, mas o 78º Distrito Policial (Jardins) o registrou lesão corporal e injúria real. O Ministério Público Eleitoral abriu uma investigação, já que agressões verbais ou vias de fato podem ser enquadradas no artigo 326 do Código Eleitoral. A defesa do candidato tucano pretende processar Marçal por calúnia. O estopim da agressão foi uma referência do candidato do PRTB a um processo contra o apresentador por assédio sexual, extinto por ter sido denunciado fora do prazo legal. Datena perdeu o controle ao ser chamado de “Jack”, gíria para estuprador em presídios. (Estadão)

Datena reconheceu em nota que errou, mas não se arrepende da agressão. “Preferia, sinceramente, que o episódio não tivesse ocorrido. Mas, fossem as mesmas circunstâncias, não deixaria de repetir o gesto, resposta extrema a um histórico de agressões perpetradas a mim e a muitos outros por meu adversário”, disse o apresentador de TV. (CNN Brasil)

E temendo que algo parecido volte a acontecer, a RedeTV! anunciou ontem que vai fixar no chão as banquetas que serão usadas pelos candidatos à Prefeitura de São Paulo durante o debate que realizará hoje às 10h20. Datena e Marçal confirmaram presença, assim como Guilherme Boulos (PSOL), Ricardo Nunes (MDB), Tabata Amaral (PSB) e Marina Helena (Novo). Cada candidato terá um segurança dentro do estúdio. (UOL)

Marçal chegou a gravar um vídeo com uma máscara de oxigênio dentro de uma ambulância, mas uma foto dele já no Hospital Sírio-Libanês o mostrava usando uma pulseira verde, que significa “casos pouco urgentes”.  Em live ainda no hospital, o candidato classificou o ocorrido como deprimente e afirmou que “foi só um esbarrão”. Após sua alta, o Sírio-Libanês informou que ele sofreu traumatismo na região do tórax à direita e em punho direito, sem complicações associadas. (Globo e g1)

Após agredir Marçal, Datena ganhou 40 mil novos seguidores nas redes sociais, segundo levantamento da consultoria digital Bites. Já Marçal, conta a coluna de Malu Gaspar, conquistou 400 mil novos seguidores. Apesar da diferença entre os dois, o crescimento de Datena é significativo, pois ele tem um dos menores índices de popularidade digital entre os candidatos à prefeitura paulistana. (Globo)

Entre 23h do domingo e 11h de ontem, mais de 350 conteúdos circularam em pelo menos 140 grupos públicos de WhatsApp e Telegram, impactando cerca de 800 mil pessoas com mensagens que foram consideradas neutras ou negativas em relação à cadeirada. Confira a edição extra da newsletter Ebulição, da Lupa.

Anna Virginia Balloussier: “Se Donald Trump e Jair Bolsonaro instrumentalizaram atentados que por pouco não lhe custaram a vida para extrair dividendos políticos, por que não ele? Marçal tenta surfar na mesma onda. Mas há boas chances de levar um caixote eleitoral se insistir nessa narrativa. Já dá para dizer que, ao menos em parte da direita, a versão de Marçal não colou. Atores importantes para esse eleitorado concordam que Datena passou e muito do ponto, mas também pintam o nome do PRTB como um Neymar no gramado, forçando quedas para se fazer de vítima.” (Folha)

Meio em vídeo. Trump sofreu o segundo atentado no domingo. No mesmo dia, no debate dos candidatos a prefeito de São Paulo, a maior cidade do país, um dos concorrentes achou razoável a ideia de pegar uma cadeira e sentar nas costas do outro. De alguma forma, o jogo da política está se transformando. A violência ficou normal. Assista a Pedro Doria no Ponto de Partida. (YouTube)

facebookXwhatsapp

segunda-feira, 16 de setembro de 2024

A memória é uma arma contra o negacionismo, José Reinaldo Lopes, FSP

 A esta altura do campeonato, se algum habitante do interior de São Paulo consegue tirar da cabeça o cheiro onipresente de matéria vegetal queimada e a cor perpetuamente baça do céu, a única coisa a fazer é parabenizar a pessoa em questão pela sua capacidade sobre-humana de tapar o Sol com a peneira. Como não tenho esse superpoder, faz algumas semanas que me sinto enlutado. E o medo é que chuva nenhuma, por mais torrencial que seja, consiga dissolver de todo a mortalha que nos cobre.

O cenário de "Mad Max" do interior é só um pedaço de um problema muito maior, lógico. Da capital paulista à Amazônia, de Minas ao pantanal, mais ou menos 60% do país (para não falar de nossos vizinhos sul-americanos) está debaixo da atual pluma de fumaça. E talvez o mais angustiante —excetuando-se, é claro, a dificuldade de respirar— seja a impressão de que a ficha não está caindo. De que as pessoas não estão se dando conta de quão fora da curva é o ponto em que viemos parar.

A imagem mostra uma vista de uma cidade em um dia nublado, com uma densa camada de neblina cobrindo os edifícios. No primeiro plano, há uma estrada vazia e árvores ao lado. Ao fundo, os prédios aparecem em tons de cinza, quase indistinguíveis devido à poluição do ar.
Ribeirão Preto, no interior paulista, encoberta pela fumaça das queimadas que assolam o estado há quase um mês - Joel Silva - 25.ago.24/Folhapress

Pode ser que a culpa caiba, ao menos em parte, a um casamento desastroso entre falta de memória coletiva e desconexão com a terra. Com efeito, o Brasil do século 21 é o filhote de dois processos igualmente brutais: a urbanização vertiginosa e a ocupação da "fronteira agrícola" (releve-se aqui o fato de que a tal ocupação passou e continua passando por cima de quem já estava na dita fronteira).

Combinadas, as duas coisas produziram dezenas e dezenas de milhões de famílias que conhecem o lugar onde vivem há apenas uma geração, ou até menos. É difícil evitar a impressão de que tamanho desenraizamento, operado num piscar de olhos histórico, tem consequências sérias. Um processo tão rápido e impiedoso faz com que muita gente não perceba as dimensões do buraco climático e ambiental em que nos enfiamos.

É por isso que precisamos desesperadamente de um tipo visceral de memória. Não há negacionismo climático que pare de pé diante de quem é capaz de se recordar como era a terra em que seus avós cresceram. Nestes dias de treva, foi esse conselho que me voltou à cabeça.

PUBLICIDADE

Ouvi pela primeira vez a ideia, tão simples e poderosa, conversando certa vez com a oceanógrafa americana Sylvia Earle, hoje com 89 anos. Quando perguntei como ajudar as pessoas a compreenderem, de forma intuitiva, a magnitude do que está acontecendo com os ambientes à nossa volta, eis o que ela disse:

"Eu incentivo todo mundo que conheço a conversar com alguém mais velho, um avô, tia ou tio, e perguntar quais plantas e animais eles costumavam ver sempre quando crianças e quais não são mais vistos por aí. Pergunte a um pescador idoso que peixes ele pega hoje e quais pegava vinte ou trinta anos atrás. Observe fotografias antigas de um lugar e as compare com as de hoje. O ritmo em que as mudanças ocorreram é absurdo."

Talvez a frase tenha calado fundo porque "pescador idoso" é justamente a descrição de ambos os meus finados avôs desde que me entendo por gente —ambos lamentando o sumiço dos peixes que tanto gostavam de fisgar no rio Mogi-Guaçu.

Mas não precisei viver tanto quanto eles para já saber nos meus ossos que este calor, em vários "invernos" seguidos, não é o normal para a terra onde nasci e onde meus filhos nasceram. Que sejamos capazes de ouvir quem é capaz de perceber que algo está muito errado, e de perceber o custo gigantesco da inação.