sábado, 19 de outubro de 2019

Não será fácil, Juliana Sofia, FSP

Bolsonaro verá aliados se reposicionarem na votação da pauta econômica do governo

Em sua versão original, a reforma da Previdência formulada pela equipe econômica de Jair Bolsonaro não tinha o condão de zerar o déficit do setor, mesmo com a potência fiscal estimada de R$ 1,2 trilhão em um período de dez anos. O propósito era conter a velocidade do aumento das despesas e elevar as receitas previdenciárias.
Pois bem. Já era bola cantada que o Congresso desidrataria a proposta. Na próxima semana, o Senado (espera-se!) deverá concluir a votação das mudanças no sistema de aposentadorias e pensões. Sem a chamada PEC paralela --um puxadinho criado pelos senadores, que terá tramitação arrastada--, o texto final deverá assegurar uma economia de aproximadamente R$ 800 bilhões em uma década.
O Tribunal de Contas da União esquadrinhou os dados e concluiu que, entre 2020 e 2029, essa reforma cobrirá menos de 20% do buraco calculado para os regimes previdenciários. Pelas projeções, seriam necessários R$ 5 trilhões para equilibrar os sistemas no período. Uma sinopse sobre a necessidade futura, e até premente, de nova revisão de regras.
No plano fiscal, o resultado poderia ter sido pior. A base legislativa volátil e a falta de articulação política do Palácio do Planalto foram compensadas pelo parlamentarismo branco instalado no país. Rodrigo Maia, chamado de primeiro-ministro em círculos brasilienses, afirma que muitos setores foram "patrióticos" no debate sobre as aposentadorias pois não eram atingidos pelas mudanças.
O nome do jogo será outro diante da agenda econômica que será enviada pelo Executivo ao Congresso com a liquidação da fatura previdenciária. Temas polêmicos e menos palatáveis, como normas fiscais, pacto federativo e reformas administrativa e tributária, mobilizarão políticos, especialistas e setor produtivo.
Em meio à implosão do PSL, Bolsonaro assistirá ao reposicionamento no campo adversário de aliados que foram importantes na aprovação da nova Previdência. Não será fácil.
Julianna Sofia
Jornalista, secretária de Redação da Sucursal de Brasília.

Antes que acabe, FSP

Em perigo, Amazônia vira destino preferido de visitantes estrangeiros

Uma das obras-primas do escritor Henry James é a novela "A Fera na Selva". Mas quem esteve para valer na selva foi o irmão dele, William James, que aos 23 anos visitou a Amazônia e ficou encantado com a região. Em 1865, ele percorreu o Brasil como membro da expedição Thayer e, em cartas para a família, discordou frontalmente de seu professor racista e escravista, Louis Agassiz, revelando enorme simpatia pelos povos do Alto Solimões:
"Os índios que vi até agora são ótimas pessoas, de uma linda cor acastanhada, com cabelos lindos e finos. Suas peles são secas e limpas, eles transpiram muito pouco. No fim das contas, acredito que eles são mais bem-apessoados que os negros e os brancos", escreveu o futuro filósofo. Adão no Éden, ele chegou a flertar com uma nativa: "Ah, Jesuína, Jesuína, minha rainha da floresta, minha flor do trópico, por que não pude fazer-me a vós inteligível?". 
Lembrei de William James ao saber que a Amazônia está desbancando o Rio, as Cataratas do Iguaçu e as praias do Nordeste (estas agora tomadas por manchas de óleo) como destino preferido dos estrangeiros. Um tipo de visitante interessado na "porra da árvore" (copyright Jair Messias) e que viaja estimulado pelo slogan "venha, antes que acabe".
praia de rio
Praia no rio Negro, no Amazonas - Heloísa Helvécia - 12.mar.2019/Folhapress
No mais, as notícias do setor não são boas. É o que uma reportagem da revista Piauí classifica de "efeito Bolsonaro" (como se a bagunça interna não bastasse). Os turistas, sobretudo estudantes europeus, estão fugindo do país, incomodados com a não preservação do meio ambiente. 
Com tantos e tão prestimosos embaixadores do turismo --o cantor Amado Batista, o pintor Romero Britto, o lutador de jiu-jitsu Renzo Gracie (que chamou Emmanuel Macron, o presidente francês, de "franga"), o apresentador Ratinho e o ex-craque Ronaldinho Gaúcho (que teve o passaporte apreendido por crime ambiental)--, além de um ministro submergido no laranjal, como isso foi acontecer?
Alvaro Costa e Silva
Jornalista, atuou como repórter e editor. É autor de "Dicionário Amoroso do Rio de Janeiro".