domingo, 12 de janeiro de 2025

Smart Fit exemplifica a dicotomia do varejo, Marcos de Vasconcellos, FSP (definitivo)

 

O Réveillon tem um efeito interessante nos parques de São Paulo. A promessa de começar o ano novo de forma mais saudável leva hordas de atletas amadores a experimentar caminhadas e corridas, em um louvável novo esforço. Nas academias, é a alta temporada de matrículas.

Quem parece ter apostado que os novos atletas seguirão na vida fitness é o gigante do letreiro amarelo, Smart Fit. A marca acaba de divulgar que, em 2024, acrescentou 305 academias à sua rede –uma expansão de 21%. Assim, começa 2025 com 1.743 unidades, sendo 823 no Brasil, 395 no México e 525 em outros países da América Latina.

Unidade da Smart Fit fechada em São Paulo durante pandemia de Covid-19 - Rahel Patrasso - 19.mar.2020/Reuters

Esse tipo de movimento custa caro. E demora a se pagar. Com a fome de crescer, a dívida bruta da empresa atingiu o patamar de R$ 5,2 bilhões no terceiro trimestre de 2024 (último dado disponível). Isso é 45% a mais do que no mesmo período do ano anterior. Só se endivida assim quem confia que vai fazer mais dinheiro com as novas aquisições.

A receita básica para tocar uma academia não tem muita mágica: aparelhos novos, unidades disponíveis, bons pacotes de assinatura e funcionários treinados.

Pelo visto, os investidores não acreditam que isso será o bastante para transformar o aumento do endividamento em aumento dos lucros para a Smart Fit. As ações da empresa, SMFT3, fecharam o ano em queda de quase 35%. Está bem que não foi um ano bom para a Bolsa de forma geral, mas as perdas do Ibovespa foram bem menores que isso, de 10,3%.

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O desabar dos papéis foi a contragosto dos analistas da XP e do BTG Pactual. Os profissionais da corretora afirmaram que os últimos resultados reportados pela rede fitness foram sólidos, destacando que a empresa "parece estar no caminho certo com seu plano de expansão".

Os especialistas do banco de investimentos apontaram o aumento da eficiência da empresa, que reflete no aumento de consideráveis 35% em seu Ebitda (lucros antes dos juros, tributos, depreciação e amortização). Eles recomendam a compra do papel, dizendo que seu preço-alvo é de R$ 28 – 60% acima dos atuais R$ 17,50.

Como pode uma marca em franca expansão, bem vista entre analistas, então, perder 35% de seu valor de mercado em apenas um ano? A rede é um ótimo exemplo para explicar a dicotomia vivida pelo varejo brasileiro neste ano.

Temos um governo que acredita e prega o aumento do consumo, mas não consegue controlar a inflação, reduzindo o poder de compra e aumentando o endividamento de seus cidadãos.

No apagar das luzes de 2024, o número de endividados no Brasil chegou a 73 milhões de pessoas, de acordo com o Serasa. Por mais que o brasileiro seja cada vez mais adepto a um modo de vida saudável, na hora que o calo aperta, a conta da academia não é a primeira a ser paga.

O avanço da inflação, que arrasta consigo o aumento das taxas de juros, não atrapalha só a atração e retenção de clientes. A renegociação de dívidas e dos contratos de locação de imóveis fica cada vez mais difícil para a rede.

Vale lembrar que, em 2023, quando havia perspectiva de cortes nos juros, as ações da Smart Fit se valorizaram cerca de 90%. Com as perdas de 2024, os papéis são vendidos hoje por 55% do preço que tinham quando chegaram à Bolsa, em 2021.

Ao que parece, os investidores querem mais do que promessas de ano novo para voltar a apostar na tese de uma vida saudável.

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