Acabei de assistir aos sete episódios da série "Transatlântico", na Netflix (2023). Duas vezes.
É maravilhosa. Fala sobre um grupo que em 1940 ajudou a sair da França de Vichy pessoas que fugiam dos nazistas, especialmente judeus, como o pintor Marc Chagall e a escritora política Hannah Arendt.
É lindamente escrita, tem um ótimo elenco e excelentes atuações. Usando de muita beleza, combina histórias de amor, política liberal e aventuras aterrorizantes daqueles que buscavam fugir das autoridades francesas e alemãs com a indiferença isolacionista de meu próprio país à ameaça fascista —até que os japoneses, no final de 1941, nos forçaram a lutar.
Comparem, brasileiros, com sua indiferença em relação à ameaça neofascista vinda de Putin e sua guerra na Ucrânia.
Quanto mais vocês souberem sobre as figuras históricas envolvidas naquele evento do século passado, como Walter Benjamin, Max Ernst, Marcel Duchamp, mais vão adorar.
Conheci pessoalmente um de seus heróis, Albert Hirschman (1915-2012).
Albert era um economista judeu alemão extremamente sofisticado, com quem almocei e jantei muitas vezes, junto com Sarah, durante os anos de 1983 e 1984. Ele foi meu anfitrião no Instituto de Estudos Avançados, o "Instituto Einstein", em Princeton. Albert nunca mencionou que havia sido um herói na Guerra Civil Espanhola contra o fascismo, no Exército Francês contra a invasão alemã, na Resistência durante e depois da ação do filme e, finalmente, no Exército dos Estados Unidos.
Ele era assim, um cidadão mundial multilíngue, com especial interesse pela América Latina, um dos grandes economistas —mas sem exibir nenhum dos tentáculos de egoísmo de tantos homens realizados e de algumas poucas mulheres realizadas.
E ele era um defensor do que alguns de nós hoje chamamos de "humanomia", uma economia que usa todos os recursos de nossa cultura, dos números às palavras, da vida à arte. E foi um verdadeiro liberal.
Não no sentido de Bolsonaro, de um Partido Liberal fascista de direita, ou no sentido americano de uma social-democracia de fascismo de esquerda. Ele acreditava na dignidade humana e estava disposto a arriscar a vida em sua missão.
Para vergonha perene do comitê de economistas da Academia Sueca, ele nunca recebeu o Prêmio Nobel. Estatistas antiliberais sim, receberam. Suecos neutros de terceira categoria, certamente. Técnicos em finanças, repetidamente. Mas não Hirschmann, Boulding, Kirzner, Alchian, Gerschenkron. Leia qualquer livro de Albert e você verá.
E assista a "Transatlântico".
Vida, arte, ciência. Humanomia.
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