domingo, 22 de setembro de 2024

Novo acesso a São Sebastião e Ilhabela, no litoral de SP, promete encurtar tempo de viagem, FSP

 Fábio Pescarini

CARAGUATATUBA (SP)

Com sete anos de atraso e um custo final estimado em R$ 3 bilhões, o contorno sul da rodovia dos Tamoios, na encosta da Serra do Mar no litoral norte paulista, deve ser entregue em 17 de novembro —a inauguração ainda não tem data confirmada.

A estrada, com 22,7 km de extensão, está na fase final de acabamento. Ela vai ligar o trevo de Caraguatatuba ao porto de São Sebastião.

A estimativa é que 10,2 mil veículos circulem diariamente pela via, de acordo com o governo estadual, que não informou a perspectiva de trânsito em fins de semana e feriados.

O trecho norte, para quem vai a Ubatuba, foi inaugurado em dezembro do ano passado.

No total, os dois contornos (norte e sul) somam 33,9 km, incluindo acessos.

O contorno sul deverá tirar veículos que passam pelo trecho urbano da SP-055 em direção a Ilhabela e às praias que ficam às margens da rodovia Rio-Santos, a partir de São Sebastião.

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A estimativa é que o trajeto, que termina na região do porto de São Sebastião e no acesso à balsa para Ilhabela, seja feito em até 18 minutos. A velocidade máxima da estrada será de 80 km/h.

A reportagem percorreu 25 km do trecho urbano entre o trevo de Caraguatatuba e o porto no último dia 10, uma terça-feira, e levou 43 minutos. O limite de velocidade oscilou entre 40 km/h e 60 km/h, com semáforos e lombadas. Por duas vezes teve "anda e para" por causa de obras de recapeamento, mas não havia congestionamento.

Segundo a Prefeitura de Caraguatatuba, em feriados, motoristas chegam a levar quatro horas para fazer o trajeto —cerca de 213 mil veículos trafegaram pelo município entre os dias 29 de dezembro de 2023 e 2 de janeiro de 2024, por exemplo. Em São Sebastião, cerca de 45 mil veículos se deslocam, em média, por dia no período de festas.

"O trecho urbano da SP-055 será desafogado, principalmente por caminhões em direção ao porto de São Sebastião, que passarão a utilizar a nova via como rota rápida e curta", diz o prefeito de Caraguatatuba, Aguilar Junior (MDB).

"A atual rodovia tende a ser uma avenida", diz a Prefeitura de São Sebastião, em nota.

A nova estrada também poderá ser usada como alternativa local, pois, além das duas entradas principais, haverá outros dois acessos, nos bairros Pegorelli (Caraguatatuba) e Jaraguá (São Sebastião).

METADE DO NOVO TRECHO TERÁ PISTA SIMPLES

Dos quase 34 km dos contornos norte e sul, metade é em pista simples, com a circulação de apenas um veículo por mão de direção.

De acordo com Allan Tinôco, gerente de engenharia da concessionária Tamoios, responsável pela obra desde 2021 —e pela gestão da via—, o modelo faz parte do projeto original, que a empresa apenas concluiu em uma parceria público-privada.

"Com certeza o fluxo vai fluir melhor que no trecho urbano. E teremos planos de contingência [para dias de trânsito intenso]", diz.

O gerente afirma ser possível fazer alterações no projeto no futuro, se o governo quiser. Em nota, a Secretaria de Parcerias e Investimentos, porém, diz que o conceito de duplicação não se aplica ali.

Haverá cobrança de pedágio nos dois sentidos, de R$ 5 para carros de passeio, pelo sistema free flow —pórticos com câmeras capazes de identificar as placas de veículos ou o sinal das tags e fazer a cobrança automática.

A fatura deverá ser paga no site da concessionária, em um aplicativo que será disponibilizado, ou pela leitura de tag instalada no para-brisa do veículo.

pórtico será instalado no km 13,5 do contorno sul. O equipamento atualmente está em testes (sem cobrança) no km 16 da rodovia dos Tamoios.

Trabalhadores instalam iluminação de um dos três túneis do contorno sul; trecho é totalmente monitorado por câmeras e tem saídas de emergência - Rubens Cavallari/Folhapress

A reportagem percorreu o contorno sul em meio ao fim das obras. A estrada tem trechos com vistas para praias de São Sebastião e Ilhabela ao fundo.

Ao todo, o contorno sul soma 24 viadutos e pontes. São três túneis, sendo que um deles tem quase 3,5 km de extensão.

No total, 450 câmeras fazem a vigilância da estrada que, por enquanto, não terá radares de velocidade.

No percurso de ida e volta, a Folha encontrou animais, como equinos e gado, próximos à mureta do contorno sul, que margeia propriedades rurais. Havia, inclusive, uma vaca em cima de um muro de arrimo.

Em nota, a concessionária afirma ter notificado donos de animais sobre a importância de mantê-los fora das áreas da rodovia e que eles podem ser capturados se estiverem na faixa de rolamento. Em alguns locais serão instaladas cercas.

A Prefeitura de Caraguatatuba diz que o Centro de Controle de Zoonoses pode ser acionado para apoio, se necessário. A de São Sebastião não se posicionou.

Vaca no alto de muro de arrimo no contorno sul da rodovia dos Tamoios; concessionária diz que está alertando donos de animais e vai instalar cercas - Rubens Cavallari/Folhapress

A conclusão da obra, iniciada em outubro de 2013 pelo então governador Geraldo Alckmin (na época no PSDB, hoje no PSB), gera alívio e expectativa para quem depende do turismo no litoral norte.

A previsão era que os contornos ficassem prontos em 2017, mas em meio a atrasos, a obra parou de vez em 2018, devido à rescisão de contrato por parte de empreiteiras, segundo o governo, sendo retomada em 2021, pela atual concessionária.

Heloiza Lacerda Franco, presidente da Associação Comercial de Ilhabela, estima que a ocupação hoteleira cresça cerca 15% e recupere os 20% perdidos com os problemas provocados pelas recentes longas filas da balsa —em julho, a espera chegou a seis horas. "É uma estrada muito aguardada, vai 'jogar' as pessoas aqui dentro", diz.

Procurada, a Prefeitura de Ilhabela não quis falar sobre possíveis impactos no município.

Otimismo tem limite, inclusive legal, Marcos de Vasconcelos, FSP

 Marcos de Vasconcellos

SÃO PAULO

Dívidas impagáveis, inadimplência absurda e incapacidade de levar o próprio negócio adiante. Esse foi o cenário devastador —uma verdadeira Guernica empresarial— pintado no pedido de recuperação judicial da AgroGalaxy, protocolado na semana passada, em sigilo.

A empresa pediu segredo de Justiça para não assustar os credores e evitar uma corrida pela execução antecipada de crédito. O segredo caiu, e a luz do sol mostrou uma inadimplência que chegou a 60% do faturamento total em março; uma dívida líquida acima de R$ 1,5 bilhão; e a impossibilidade de honrar até mesmo o pagamento a investidores que compraram seus títulos em 2022.

Imagem de um painel eletrônico exibindo dados do mercado financeiro. Os números estão em vermelho, indicando quedas. As informações incluem índices como INDU, INDP, NYSE, SPMi, SPX, entre outros, com valores negativos e gráficos de desempenho.
Painel exibe dados do mercado financeiro em queda - Michael M. Santiago - 2.ago.2024/Getty Images via AFP

"Não é verdadeiro assumir que o Grupo AgroGalaxy é solvente: o seu endividamento não está equacionado de modo a caber no seu fluxo de caixa", diz a peça processual. Junto do pedido de recuperação, veio a renúncia do então diretor-presidente, Axel Labourt, e de cinco membros do conselho de administração.

Falei sobre os desafios impostos ao agronegócio pela crise climática na semana passada —e é coisa séria—, mas não dá para fingir que todo esse caos surgiu na AgroGalaxy da noite para o dia. Praticamente um mês antes do pedido de recuperação, o próprio Labourt trombeteou que os números da empresa traziam "sinais claros de recuperação que alimentam nosso otimismo".

Os sinais em questão eram basicamente o aumento da margem bruta de insumos, redução de despesas e ampliação das operações de barter —em que produtores rurais trocam parte de sua produção futura por insumos, como fertilizantes—, o que traria "segurança para toda a cadeia na próxima safra".

Das duas, uma: ou o pedido de recuperação judicial está maquiando a realidade para o Judiciário ou a empresa estava distorcendo a verdade para seus acionistas.

Acontece que, quando abriu seu capital na Bolsa, e levantou R$ 350 milhões, a AgroGalaxy também passou a ser obrigada a seguir o que dita a CVM (Comissão de Valores Mobiliários). E o artigo 15 da resolução CVM 80 é bem claro ao dizer que cabe às empresas com ação em Bolsa "divulgar informações verdadeiras, completas, consistentes e que não induzam o investidor a erro".

Desde a oferta inicial de ações (IPO), em julho de 2021, os papéis AGXY3 já perderam 94% de seu valor. Saindo da casa dos R$ 9,40 para a toca dos R$ 0,50. Sem um choque de transparência real, é difícil que algum investidor ache uma boa ideia começar a comprar, mesmo que por uma pechincha.

Falando em questões judiciais, me espantou que o Santander (SANB4) gaste tempo de seus advogados e dinheiro de seus acionistas para impedir que funkeiros usem camisas e bonés com o logo do banco, como mostrou reportagem.

O gigante espanhol resolveu entrar numa cruzada contra uma dupla de cantores, por citarem sua marca em vídeos e músicas, que provavelmente incomodaram os ouvidos de seus executivos. Na segunda instância, levou R$ 20 mil, mas deve haver recurso (e novos gastos).


Após divergências, governo Lula alinha posição sobre tratado global contra plástico, FSP

 Danielle Brant

BRASÍLIA

Após negociações intensas entre Itamaraty, MMA (Ministério do Meio Ambiente) e MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), o Brasil alinhou uma posição unificada para a reunião na Coreia do Sul, em novembro, que deve avançar no Tratado Global sobre Poluição por Plásticos.

A proposta ainda precisa do aval da Casa Civil, mas as pastas conseguiram costurar pontos que exigiram mais discussões entre as partes, principalmente entre Meio Ambiente e Desenvolvimento —a última, na semana passada, com os secretários-executivos João Paulo Capobianco e Márcio Elias Rosa, respectivamente.

Plástico em meio à natureza
Lixo plástico jogado em área aberta - Getty Images

O Brasil deve defender a adoção de critérios globais para substâncias químicas que despertam preocupação e listas de aplicações específicas para esses produtos, com a possibilidade de cada país fazer salvaguardas próprias.

Por exemplo, no caso do Bisfenol-A, composto químico usado na fabricação de plásticos e que teve a aplicação na fabricação de mamadeiras proibida pela Anvisa em 2012, poderia ser permitido o uso na produção de pás eólicas.

Também será levada a proposta de adoção de critérios globais para identificação de produtos plásticos problemáticos, com a obrigação de definição de listas nacionais para a aplicação de medidas de restrição por cada país.

Outro ponto é o de transição justa para catadores e pessoas que possam perder o emprego na indústria de plástico e também para países em desenvolvimento, com prazos diferenciados e apoio financeiro. No caso do financiamento, a ideia é propor a criação de um fundo novo e liderado pelos países desenvolvidos.

O acordo foi alcançado após a reunião entre os secretários, em meio a divergências em conversas anteriores. Fontes com as quais o Painel conversou afirmam, sob reserva, que dois integrantes do MDIC, Rodrigo Zerbone Loureiro e Washington Bonini, tinham resistência aos termos negociados pelo impacto na indústria.

Parte da dificuldade era atribuída por esses interlocutores ao fato de ambos terem ocupado cargos no governo Jair Bolsonaro.

Fontes do MDIC, no entanto, qualificam essa crítica de "maldade" e dizem que os dois, que são servidores de carreira, apenas refletiam a posição do ministério e do ministro Geraldo Alckmin sobre as negociações do tratado.