domingo, 18 de agosto de 2024

Programas sociais têm a ganhar em eficiência, editorial FSP

 O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda resiste a adotar medidas estruturais para reduzir o ritmo insustentável de crescimento dos gastos federais, mas ao menos já reconhece que há um problema. Daí a promessa de revisão de programas com o objetivo de economizar R$ 25,9 bilhões em 2025.

A trajetória atual de gastos (alta de 15% acima da inflação nos últimos 12 meses) está muito acima do padrão já temerário observado a partir do Plano Real, de 1994.

Até o impeachment da petista Dilma Rousseff, a despesa federal não financeira cresceu cerca de 6% ao ano, em média, e foi contida apenas com o teto constitucional que vigorou entre 2017 e 2022.

O lento ajuste começou a ser desmontado na gestão de Jair Bolsonaro (PL), em especial com a chamada PEC Kamikaze, que tinha por objetivo sua reeleição.

A medida perdulária e em parte ilegal, por decisão recente do Supremo Tribunal Federal, foi sucedida por outra emenda, patrocinada por Lula, que adicionou R$ 150 bilhões ao Orçamento.

PUBLICIDADE

Depois, em substituição ao teto, adotou-se o novo marco fiscal, que vem se mostrando ineficaz para conter a escalada da dívida pública.

A permissibilidade petista ainda impera, mas o ensaio de maior racionalidade é bem-vindo e abre um necessário debate sobre reformas nos programas sociais.

Um exemplo é o pente-fino no Benefício de Prestação Continuada (BPC), que paga um salário mínimo a 6 milhões de pessoas —1 milhão delas foram incluídas nos últimos dois anos.

Segundo o governo, os cortes poderão suspender 11 de cada 100 pagamentos e economizar R$ 6,6 bilhões, uma evidência da má qualidade da base de dados e das fraudes que permeiam vários programas. Cerca de 1,7 milhão de beneficiários estão com informações desatualizadas há mais de 24 meses.

Outra medida é a revisão do cadastro único que serve de base para o Bolsa Família e outras ações, a primeira em 14 anos. Abarcando 94 milhões de pessoas, quase a metade da população do país, o instrumento baliza desembolsos de R$ 280 bilhões ao ano.

Um exemplo da fragilidade nos critérios de concessão de benefícios é o crescimento anômalo do número de famílias uniparentais, que amplia a clientela e os gastos.

Cumpre aperfeiçoar as bases de dados, inclusive para viabilizar o cashback, mecanismo criado na reforma tributária para a devolução de parte dos impostos para a população de baixa renda.

Há mais a fazer, como a eliminação de programas ineficientes e mal focalizados, para que o portentoso aparato brasileiro de seguridade seja mais eficiente no combate à pobreza e à desigualdade.

editoriais@grupofolha.com.br

sábado, 17 de agosto de 2024

televisão Silvio Santos: Record adia estreia de nova programação aos domingos por causa de morte, FSP

 

Silvio Santos: Record adia estreia de nova programação aos domingos por causa de morte do apresentador - VANESSA CARVALHO/VANESSA CARVALHO/BPP
  • Recurso exclusivo para assinantes

    ASSINE ou FAÇA LOGIN

ARACAJU

Record adiou a estreia de sua nova programação dos domingos, que estrearia neste domingo (18). O motivo foi a morte do apresentador Silvio Santos, 93, na manhã deste sábado (17). A informação foi confirmada ao F5 em nota enviada.

Com isso, os programas Domingo Record, comandado por Rachel Sheherazade; e Acerte ou Caia!, de Tom Cavalcante, irão ao ar a partir do próximo dia 25. O adiamento é uma forma de homenagem à Silvio, que tinha uma história íntima com a Record.

Em 1972, pouco depois de ter renovado contrato por mais cinco anos com a Globo após uma briga, Silvio Santos comprou metade das ações da Record, antes pertencentes ao empresário Pipa Amaral.

Porém, como seu contrato com a Globo lhe impedia de ser acionista de uma emissora concorrente, foi usado um laranja chamado Joaquim Cintra Gordinho, que respondia pela parte do apresentador junto ao sócio Paulo Machado de Carvalho.

A transação só foi revelada em 1976, ano em que Silvio deixou a Globo, gerando uma disputa judicial que deu ganho de causa ao apresentador. Silvio continuou dono da Record até 1989, quando vendeu a emissora para o Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus.

Em nota, a Record ressaltou a boa relação que Silvio Santos tinha com Edir Macedo. "Sempre querido no meio da comunicação, Silvio Santos teve uma relação de respeito e amizade com o líder da Igreja Universal do Reino de Deus, o bispo Edir Macedo. Em 2015, ele fez questão de conhecer o Templo de Salomão, em São Paulo, onde resgatou parte de sua origem judaica", diz o comunicado.

Silvio Santos, dono e apresentador do SBT, morreu neste sábado (17), aos 93 anos. Também empresário, ele estava internado na UTI do hospital Albert Einstein, em São Paulo.

"Hoje o céu está alegre com a chegada do nosso amado Silvio Santos. Ele viveu 93 anos para levar felicidade e amor a todos os brasileiros. A família é muito grata ao Brasil pelos mais de 65 anos de convivência com muita alegria", disse o SBT na nota publicada nas redes sociais.

"Para nós, Senor Abravanel é ainda mais especial e somos muito felizes pelo presente que Deus nos deu e por todos os momentos maravilhosos que tivemos juntos. Aquele sorriso largo e voz tão familiar será para sempre lembrada com muita gratidão. Descansa em paz, que você sempre será eterno em nossos corações", conclui a nota.

Livro mostra relevância de Gérard Lebrun, FSP

 Já se vão 25 desde a morte de Gérard Lebrun (1930-1999), o orientador da pós-graduação em filosofia que eu nunca concluí. Lebrun faz falta.


Dá para saber que um pensador é certeiro quando os textos que ele produziu para consumo imediato continuam relevantes décadas depois. É o que se vê em "A Vingança do Bom Selvagem", uma coletânea de artigos que Lebrun escreveu para publicação em jornais nos anos 1980.

Lebrun gostava de dizer que era de direita, o que o tornava uma singularidade no departamento de filosofia, tanto o da USP como o de Aix-en-Provence, as duas universidades em que lecionava, onde quase todo mundo era de esquerda. Seu posicionamento político, porém, não fez com que ele perdesse o respeito de colegas. Pelo contrário, Lebrun era dos poucos que transitava bem em todos os grupos do departamento. Vemos em "A Vingança..." que suas inclinações ideológicas tampouco o impediam de pensar bem.

A ilustração de Annette Schwartsman, publicada na Folha de São Paulo no dia 18 de agosto de 2024, mostra, sentado, com a mão direita arrumando os óculos e a esquerda manuseando um livro, o filósofo francês Gérard Lebrun.
A ilustração de Annette Schwartsman para a coluna de Hélio Schwartsman de 18 de agosto - Annette Schwartsman

Embora nutrisse verdadeiro horror ao comunismo revolucionário, Lebrun traça um perfil quase elogioso de Che Guevara, sem obviamente deixar de criticá-lo —severamente. O fato de votar em Chirac jamais o afastou de Michel Foucault, uma espécie de pai espiritual da esquerda pós-marxista, com o qual tinha inquebrantável relação de amizade. O livro traz quatro artigos sobre Foucault.

Mais importante, seus pendores políticos não o impediam de criticar pensadores de direita. É o que constatamos nos dois textos sobre Friedrich Hayek. Esse autor é um caso paradigmático porque é tratado como oráculo por seus seguidores à direita e solenemente ignorado pelo pessoal da esquerda. Lebrun mostra que o austríaco tem ideias que merecem ser discutidas seriamente, sem adesão ou rejeição absolutas. Isso é importante nesse período de polarização afetiva que vivemos.

Em tempo, Lebrun foi comunista —até 1956, quando surgiram inegáveis evidências empíricas de que o socialismo real tinha um problema.