quinta-feira, 15 de agosto de 2024

Megálito de 6 toneladas de Stonehenge pode ter viajado ao menos 750 km, FSP

 Franz Lidz

The New York Times

Perto do centro do monumento circular Stonehenge, com cerca de 5.000 anos, está um pedaço retangular de arenito vermelho de seis toneladas. Na lenda arturiana, a chamada pedra do altar fazia parte do anel de pedras gigantes que o mago Merlin transportou magicamente do monte Killaurus, na Irlanda, para a planície de Salisbury, no sul da Inglaterra, uma jornada registrada por volta de 1136 pelo clérigo galês Geoffrey de Monmouth em "Historia Regum Britanniae".

Ao longo dos anos, as teses sobre a origem da pedra do altar mudaram, abrangendo uma série de possíveis locais, entre os quais o leste galês e o norte inglês. Nesta quarta-feira (14), um estudo publicado na revista Nature propõe um caminho muito mais longo do que os cientistas pensavam ser possível.

O monumento Stonehenge na planície de Salisbury, em Wiltshire, no sul da Inglaterra - Will Dunham - 31.ago.22/Reuters

Os pesquisadores analisaram a composição química e as idades dos grãos minerais em dois fragmentos microscópicos da pedra do altar. Isso apontou a origem da pedra para a Bacia Orcadiana no nordeste da Escócia, uma área que abrange a cidade de Inverness e os arquipélagos Órcades e Shetland.

Para chegar ao condado de Wiltshire, em Salisbury, o megálito teria percorrido pelo menos 750 quilômetros por terra (pouco mais que a distância entre as cidades de São Paulo e Florianópolis) ou cerca de mil quilômetros ao longo da costa atual se tivesse vindo pelo mar.

"Esse é um resultado chocante", disse o mineralogista aposentado Rob Ixer. Pesquisador da University College London, ele colaborou no projeto. "O trabalho levanta duas questões importantes: como e por que a pedra viajou por todo o comprimento da Grã-Bretanha?"

Stonehenge reúne dois tipos de rochas.

As maiores são lajes de arenito encontradas naturalmente no sul da Inglaterra. Pesam em média 20 toneladas e foram erguidas em dois arranjos concêntricos. O anel interno é uma ferradura de cinco trílitos (dois verticais cobertos por um lintel horizontal), dos quais três ainda estão de pé.

As menores têm, em sua maioria, de 2 a 4 toneladas e são de arenito e material ígneo. Algumas delas foram arrastadas para Stonehenge de até 225 quilômetros de distância e dispostas em um arco duplo entre as maiores. Algumas das rochas menores restantes caíram; outras são apenas tocos. A maior, com quase cinco metros de comprimento e próximo ao centro, é a pedra do altar.

Os arqueólogos trabalham com a hipótese de que ela foi instalada em Stonehenge durante a segunda fase de construção do monumento, por volta de 2620 a.C. a 2480 a.C.

A imagem mostra uma vista aérea de um círculo de pedras, com várias grandes rochas dispostas em um padrão circular. Algumas pedras estão em pé, enquanto outras estão deitadas no chão. O solo é coberto por grama verde, e há algumas pedras menores espalhadas ao redor. Uma linha azul pontilhada é visível, indicando a pedra do altar no centro do círculo.
Pedra do Altar (em azul na imagem) fica no centro de Stonehenge e, para pesquisadores, pode ter sido transportada da Escócia - Reprodução/Nature

Na Idade da Pedra, durante o solstício de inverno, o Sol se punha em uma fenda estreita entre o trílito mais alto e descia sobre a pedra do altar, que foi colocada ao longo do eixo do solstício. O efeito não é mais visível: metade do trílito desabou e hoje está em um amontoado em cima dela.

No ano passado, uma equipe liderada pelo geólogo Richard Bevins, da Universidade de Aberystwyth (País de Gales) e autor do novo estudo, publicou um artigo demonstrando que a pedra do altar não era galesa, mas muito provavelmente do norte.

Os pesquisadores ficaram intrigados com a presença de alguns zircões extremamente antigos, minerais quimicamente estáveis e altamente resistentes à intempérie e ao calor. Eles recrutaram, então, colegas na Austrália que tinham acesso a instrumentos usados na indústria de mineração para pesquisa e exploração.

A partir de fragmentos da pedra do altar, os australianos analisaram grãos de zircão, apatita e rutilo. "Os três minerais continham urânio, o que os tornava relógios atômicos em miniatura", disse Anthony Clarke, candidato a doutorado em geologia na Universidade de Curtin, em Perth, que conduziu a investigação. "Você pode determinar a idade medindo a proporção de urânio para chumbo e usando a taxa conhecida de decaimento do urânio."

Esse tipo de datação radiométrica levou Clarke e sua equipe a concluir que as fontes do zircão eram em grande parte daEra Mesoproterozoicae do Éon Arqueano, enquanto a apatita e o rutilo eram do período do Ordoviciano médio. "Nós juntamos as idades para criar uma impressão digital da fonte dos grãos minerais", disse ele.

A "impressão digital" foi comparada com as de depósitos sedimentares em milhares de afloramentos de arenito na Grã-Bretanha, Irlanda e no norte da Europa. "Ao juntar os dados, revelou-se uma semelhança marcante com o arenito da Bacia Orcadiana", disse Clarke. "A pedra do altar tem uma assinatura escocesa estatisticamente distinta dos terrenos do sul."

O geoquímico Nick Pearce, da Universidade de Aberystwyth e que também ajudou com o novo estudo, disse que a nova pesquisa derrubou a teoria de que a pedra do altar fosse um bloco errático glacial que chegou ao sul da Inglaterra em uma geleira.

"Durante as duas últimas eras glaciais, as direções do gelo no nordeste da Escócia eram para o norte", disse ele. "A ideia de que a pedra do altar chegou por transporte glacial é quase impossível."

Então, como ela chegou à planície de Salisbury?

"Existem duas opções: terrestre ou marítima", disse Pearce. "Cada uma tem méritos e grandes problemas também."

O transporte marítimo teria envolvido colocar uma rocha de seis toneladas em um barco neolítico, ele disse. A rota terrestre apresentava rios para atravessar, montanhas para contornar e florestas densas para atravessar. "Deixarei essa pergunta para os arqueólogos", disse Clarke.

Desigualdade entre escolas pobres e ricas é de 4 anos ao fim do ensino fundamental, FSP

 Paulo Saldaña

Brasília e São Paulo

Os dados de 2023 do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) 2023 mostram que a desigualdade entre escolas públicas que atendem alunos mais pobres ou mais ricos teve uma leve oscilação ao fim do ensino fundamental com relação a 2021, ano marcado pela pandemia.

Ainda assim, a desigualdade se mantém: as médias de escolas com alunos mais pobres no ano passado apresentam uma diferença equivalente a quatro anos de aprendizado na comparação com escolas mais ricas. E essa é uma distância entre escolas públicas.

O Ideb 2023 foi divulgado nesta quarta-feira (14) pelo MEC (Ministério da Educação). O indicador é calculado a partir de dois componentes: a taxa de aprovação das escolas e as médias de desempenho dos alunos em uma avaliação de matemática e português, o Saeb.

0
Escola Municipal Pequeno Príncipe, em Santana do Mundaú, município do interior de Alagoas que teve destaque no Ideb 2023. - Pedro Ladeira - 4.jun.2022/Folhapress

A cada dois anos, três etapas têm indicadores calculados: os anos iniciais (5º ano) e finais (9º ano) do ensino fundamental e o ensino médio. Há dados por escolas e médias por redes para o país.

As médias escondem desafios particulares de cada escola e rede. Um dos mais relevantes é o nível socioeconômico dos alunos de cada unidade: pesquisas já mostram que é muito mais desafiador alcançar melhores resultados com estudantes de famílias mais pobres.

A reportagem cruzou os dados do Ideb 2023 e 2021 dos anos finais com o INSE (Índice de Nível Socioeconômico) das escolas, instrumento elaborado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), também responsável pelas avaliações.

O indicador socioeconômico, calculado por escola a partir de informações dos alunos, leva em conta dados como renda familiar, escolaridade da mãe, condições de moradia, entre outros fatores.

Em 2023, a média do Ideb dos anos finais varia 1,7 ponto entres os níveis mais baixo e mais alto --em 2021, essa diferença era maior, de 1,77. Como comparação, o Brasil só conseguiu avançar 1,2 ponto no Ideb dos anos finais na rede pública desde 2007, quando o indicador foi criado.

Ao olhar para as disciplinas do Saeb, também há desigualdades consideráveis.

A maior aparece em língua portuguesa: são 45,9 pontos de diferença entre as escolas no grupo de menor nível socioeconômico e unidades escolares da ponta de cima. Essa diferença era de 51,2 pontos em 2021.

Já em matemática, a distância é de 43,9 pontos em 2023. Foi de 52,4 na edição de 2021.

Como a variação de 12 pontos na escala do Saeb representa a progressão de um ano inteiro de ensino, é possível concluir que alunos mais pobres têm um atraso de cerca de 4 anos de aprendizado. Isso é visto tanto em 2023 quanto em 2021.

Em 2021, o fechamento das escolas por causa da pandemia de coronavírus resultou em uma queda de aprendizado dos alunos de escolas em todas as etapas da educação básica. A própria participação na avaliação federal havia sido menor —há mais escolas com resultados divulgados em 2023 (e, para essa análise, também o INSE calculado).

O Inep classificou as escolas brasileiras em sete níveis socioeconômicos, de acordo com indicador divulgado em 2021 (mas que continua a valer para este ano). Como há poucas escolas nos níveis 1 e 7, a reportagem reuniu as escolas em cinco intervalos, agrupando os níveis 1 e 2 e os níveis 6 e 7.

Dessa forma, cada intervalo ficou com um número de escolas mais equilibrado, ainda que os níveis intermediários concentrem mais unidades.

A tabulação mostra que tanto o Ideb quanto as notas do Saeb sobem a cada intervalo de nível socioeconômico. No intervalo das escolas mais pobres, há uma melhora das notas de português e matemática no ano passado com relação a 2021, enquanto ocorre o oposto entre as escolas mais ricas.

"É uma informação que faz sentido porque os mais pobres foram os que mais sofreram com a pandemia, e se vê uma recuperação. Alunos com melhor nível socioeconômico tem maior chance de ter acesso à internet, voltaram antes às aulas presenciais", diz Ernesto Martins Faria, diretor do Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional).

A média do Ideb da rede pública do país para os anos finais do ensino fundamental em 2023 foi de 4,7 pontos, não tendo alcançado a meta de 2021, de 5,2.

As 8.900 escolas nos três níveis socioeconômicos mais baixos ficaram abaixo da média nacional, por exemplo. Já os três níveis mais altos, que reúnem 12 mil escolas, tiveram uma média de Ideb superior, de 5 pontos.

Considerando apenas os dois níveis superiores, que foram agrupados pela reportagem, o país superou a meta de 2021: a média das 3.009 escolas desse grupo foi de 5,6.

Todas essas médias por nível socioeconômico não significam que todas as escolas de cada intervalo tenham tido desempenho igual. Há casos de escolas com alunos pobres e que superaram as médias do país.

Os dados mostram que 60 escolas entre as mais pobres do país alcançaram ou superaram a nota 6,3 nos anos finais do fundamental. Essa é a média das escolas particulares do país nessa etapa.