Franz Lidz
Perto do centro do monumento circular Stonehenge, com cerca de 5.000 anos, está um pedaço retangular de arenito vermelho de seis toneladas. Na lenda arturiana, a chamada pedra do altar fazia parte do anel de pedras gigantes que o mago Merlin transportou magicamente do monte Killaurus, na Irlanda, para a planície de Salisbury, no sul da Inglaterra, uma jornada registrada por volta de 1136 pelo clérigo galês Geoffrey de Monmouth em "Historia Regum Britanniae".
Ao longo dos anos, as teses sobre a origem da pedra do altar mudaram, abrangendo uma série de possíveis locais, entre os quais o leste galês e o norte inglês. Nesta quarta-feira (14), um estudo publicado na revista Nature propõe um caminho muito mais longo do que os cientistas pensavam ser possível.
Os pesquisadores analisaram a composição química e as idades dos grãos minerais em dois fragmentos microscópicos da pedra do altar. Isso apontou a origem da pedra para a Bacia Orcadiana no nordeste da Escócia, uma área que abrange a cidade de Inverness e os arquipélagos Órcades e Shetland.
Para chegar ao condado de Wiltshire, em Salisbury, o megálito teria percorrido pelo menos 750 quilômetros por terra (pouco mais que a distância entre as cidades de São Paulo e Florianópolis) ou cerca de mil quilômetros ao longo da costa atual se tivesse vindo pelo mar.
"Esse é um resultado chocante", disse o mineralogista aposentado Rob Ixer. Pesquisador da University College London, ele colaborou no projeto. "O trabalho levanta duas questões importantes: como e por que a pedra viajou por todo o comprimento da Grã-Bretanha?"
Stonehenge reúne dois tipos de rochas.
As maiores são lajes de arenito encontradas naturalmente no sul da Inglaterra. Pesam em média 20 toneladas e foram erguidas em dois arranjos concêntricos. O anel interno é uma ferradura de cinco trílitos (dois verticais cobertos por um lintel horizontal), dos quais três ainda estão de pé.
As menores têm, em sua maioria, de 2 a 4 toneladas e são de arenito e material ígneo. Algumas delas foram arrastadas para Stonehenge de até 225 quilômetros de distância e dispostas em um arco duplo entre as maiores. Algumas das rochas menores restantes caíram; outras são apenas tocos. A maior, com quase cinco metros de comprimento e próximo ao centro, é a pedra do altar.
Os arqueólogos trabalham com a hipótese de que ela foi instalada em Stonehenge durante a segunda fase de construção do monumento, por volta de 2620 a.C. a 2480 a.C.
Na Idade da Pedra, durante o solstício de inverno, o Sol se punha em uma fenda estreita entre o trílito mais alto e descia sobre a pedra do altar, que foi colocada ao longo do eixo do solstício. O efeito não é mais visível: metade do trílito desabou e hoje está em um amontoado em cima dela.
No ano passado, uma equipe liderada pelo geólogo Richard Bevins, da Universidade de Aberystwyth (País de Gales) e autor do novo estudo, publicou um artigo demonstrando que a pedra do altar não era galesa, mas muito provavelmente do norte.
Os pesquisadores ficaram intrigados com a presença de alguns zircões extremamente antigos, minerais quimicamente estáveis e altamente resistentes à intempérie e ao calor. Eles recrutaram, então, colegas na Austrália que tinham acesso a instrumentos usados na indústria de mineração para pesquisa e exploração.
A partir de fragmentos da pedra do altar, os australianos analisaram grãos de zircão, apatita e rutilo. "Os três minerais continham urânio, o que os tornava relógios atômicos em miniatura", disse Anthony Clarke, candidato a doutorado em geologia na Universidade de Curtin, em Perth, que conduziu a investigação. "Você pode determinar a idade medindo a proporção de urânio para chumbo e usando a taxa conhecida de decaimento do urânio."
Esse tipo de datação radiométrica levou Clarke e sua equipe a concluir que as fontes do zircão eram em grande parte daEra Mesoproterozoicae do Éon Arqueano, enquanto a apatita e o rutilo eram do período do Ordoviciano médio. "Nós juntamos as idades para criar uma impressão digital da fonte dos grãos minerais", disse ele.
A "impressão digital" foi comparada com as de depósitos sedimentares em milhares de afloramentos de arenito na Grã-Bretanha, Irlanda e no norte da Europa. "Ao juntar os dados, revelou-se uma semelhança marcante com o arenito da Bacia Orcadiana", disse Clarke. "A pedra do altar tem uma assinatura escocesa estatisticamente distinta dos terrenos do sul."
O geoquímico Nick Pearce, da Universidade de Aberystwyth e que também ajudou com o novo estudo, disse que a nova pesquisa derrubou a teoria de que a pedra do altar fosse um bloco errático glacial que chegou ao sul da Inglaterra em uma geleira.
"Durante as duas últimas eras glaciais, as direções do gelo no nordeste da Escócia eram para o norte", disse ele. "A ideia de que a pedra do altar chegou por transporte glacial é quase impossível."
Então, como ela chegou à planície de Salisbury?
"Existem duas opções: terrestre ou marítima", disse Pearce. "Cada uma tem méritos e grandes problemas também."
O transporte marítimo teria envolvido colocar uma rocha de seis toneladas em um barco neolítico, ele disse. A rota terrestre apresentava rios para atravessar, montanhas para contornar e florestas densas para atravessar. "Deixarei essa pergunta para os arqueólogos", disse Clarke.
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