terça-feira, 11 de outubro de 2022
Projeto reforça janela de oportunidade para energia eólica, Revista Controle & Instrumentação, do FB
Lula precisa ser mais radical, não menos, Pedro Fernando Nery, OESP
Lula precisa ser mais radical. Não menos.
Não me refiro à revogação da reforma trabalhista (que ameaçaria o bom momento do mercado de trabalho, com recordes sucessivos de emprego – inclusive, formal). Nem ao desfazimento total do teto (que incentivou o controle do gasto com Previdência e funcionalismo, facilitando a expansão permanente das transferências de renda). Refiro-me ao combate à desigualdade de renda que, por uma ótica, ficou estagnado em seus primeiros governos.
“É verdade. Banqueiro ganhou dinheiro. Empresário ganhou dinheiro. Os produtores rurais ganharam dinheiro”, respondeu Lula a Ciro no último debate. Em outra oportunidade, já havia afirmado: “Eles sabem que nunca na história do Brasil eles ganharam tanto dinheiro como ganharam quando eu fui presidente da República desse País”.
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O que mostram os números? Medida pelo índice de Gini tradicional, a desigualdade caiu em seus governos. Mas o Gini caiu pouquinho quando se consideram dados do Imposto de Renda, que mostram melhor a vida dos mais ricos do que pesquisas domiciliares. A desigualdade cai mais quando se leva em conta “rendas invisíveis” como serviços de saúde e educação (ver os trabalhos de Ricardo Paes de Barros, Laura Machado e Fernando Gaiger).
Especificamente sobre a concentração de renda no 1% de brasileiros mais ricos, não parece ter havido progresso. O 1% concentrou pelo menos de 20% da renda durante todo o período, como já fazia antes – pelo trabalho seminal de Pedro Ferreira de Souza (Ipea). Já Marc Morgan, da Universidade de Genebra, detecta até uma oscilação para cima dessa concentração durante o período Lula, atingindo um pico de quase 30% na passagem de Lula para Dilma.
A ciência tem revelado que a desigualdade é um veneno para o próprio crescimento econômico. Por isso, é importante que se cumpra a promessa de “incluir o rico no Imposto de Renda”. É preciso também controlar os maiores salários do serviço público na ausência do teto de gastos, não retroceder na reforma da Previdência do funcionalismo e conter os impulsos para que o retorno da política industrial não leve a nova rodada de favores a grandes empresários.
É mesmo fundamental, para diminuir a parcela retida pelo topo, avançar na reforma tributária (fazendo mais do que mudanças sobre o consumo). Além de reduzir a desigualdade, a tributação dos mais ricos poderia aliviar a tributação sobre o emprego de um salário mínimo ou compensar eventuais novos gastos – com sorte, em favor dos mais pobres.
A que custo se deu essa melhora na economia?, Bernanrd Appy, OESP
A economia em 2022 está surpreendendo positivamente. O Produto Interno Bruto (PIB) deverá crescer cerca de 2,5%, a inflação está em queda (sobretudo por conta da redução de tributos) e o desemprego também está caindo. A boa performance da economia está se refletindo em uma sensação de bem-estar da população, que ajuda a explicar o desempenho do presidente da República nas eleições.
Mas a que custo se deu essa melhora na economia? A resposta é: ao custo de uma piora relevante das contas públicas via aumento de despesas e redução de receitas.
É verdade que, no curto prazo, essa piora fiscal não aparece, pois estamos em um período de alta conjuntural da arrecadação, sobretudo por conta da forte elevação dos preços do petróleo. Mas essa alta é temporária.
Já as medidas que pioram o resultado fiscal são permanentes. Sabemos que o governo atropelou o teto de gastos em 2022. Mas qual o tamanho do atropelo? Para estimar esse valor comparei o valor real das despesas primárias da União nos primeiros oito meses de 2022 com o mesmo período de 2018, excluindo os gastos com precatórios e as despesas atípicas com a covid e a campanha eleitoral. O resultado é um crescimento real das despesas de 8,5% relativamente a 2018 concentrado em 2022.
Incorporando o aumento do Auxílio Brasil para R$ 600 (que todos os candidatos prometem manter), o crescimento real das despesas chega a 11,8% relativamente a 2018. Em termos anualizados, o adicional de despesa supera em 2% do PIB o que seria observado se a despesa tivesse sido corrigida pela inflação, seguindo o teto dos gastos. Vale notar que esse aumento subestima a real deterioração fiscal do período, por conta da contenção dos reajustes salariais dos servidores, inviável por mais quatro anos.
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Houve também medidas de diminuição permanente de receitas (redução do IPI e do ICMS sobre combustíveis, eletricidade e telecomunicações), que montam a pouco mais de 1% do PIB, além de reduções temporárias de tributos.
Volto a destacar que o aumento de receita de 2022 é temporário e a maioria dos efeitos das medidas recentes, permanente, o que deve resultar em grande piora do resultado fiscal nos próximos anos.
Acho estranho que se cobre Lula da Silva por uma política de responsabilidade fiscal e se deixe passar quase em branco a piora do resultado das contas públicas em 3% do PIB em um único ano. A situação fiscal do País é preocupante e exigirá medidas de ajuste, mas essa é a consequência da irresponsabilidade fiscal do atual governo, ditada essencialmente por motivos eleitorais.