quarta-feira, 11 de maio de 2022

Tempo histórico do Brasil é o da tragédia contínua, FSP

 Fernanda Perrin

Editora-adjunta de Mercado e mestre em ciência política pela USP

"Esta infeliz atitude de vestal, tutor e messias, do militar, recrudesceu recentemente gerando os acontecimentos a que todos estamos assistindo. (...) Oxalá os bons militares meditem sobre isso, reconsiderem e retornem, com humildade e patriotismo, para a singela posição que a Constituição lhes aponta."

Eu poderia ter pescado o parágrafo acima de uma coluna recente qualquer, mas foi em uma velha revista Realidade onde o encontrei.

O presidente Jair Bolsonaro (PL) durante manifestação na av. Paulista no 7 de Setembro do ano passado - Danilo Verpa/Folhapress

O texto, assinado pelo contra-almirante Norton D. Boiteux, divide a página com um segundo artigo, de autoria do então deputado Anísio Rocha. Os dois respondem a uma pergunta enviada por um leitor: "É verdade que, no Brasil, todo o poder está na mão dos militares?"

Para bom brasileiro, não causa espanto que a resposta do militar seja sim, e a do deputado, não. O que de fato surpreende é a data da publicação: junho de 1966. O golpe militar já havia sido consumado há dois anos.

Rocha, no entanto, abre seu texto defendendo que "tanto o Poder Judiciário como o Poder Legislativo estão funcionando em toda a sua plenitude, em que pesem os Atos Institucionais surgidos com o advento da Revolução". (Corrigida pela inflação, a frase hoje soaria algo como "as instituições estão funcionando, apesar das ações do presidente".)

Os atos institucionais emitidos até 1966, e minimizados pelo deputado, cassaram mandatos, prenderam opositores, extinguiram partidos e tornaram indiretas as eleições para presidente e governador. Que dúvida poderia restar sobre as mãos que detinham o poder?

Voltemos ao presente. A Folha perguntou a seus leitores, na semana passada, se a democracia brasileira corre risco. Quão pertinente ou absurda essa questão vai soar no futuro, diante de tudo o que estamos vivendo?

Os historiadores dizem que o distanciamento é fundamental para que se compreenda um fenômeno. O problema do Brasil é que o tempo parece não passar: a história nem sequer chega a se repetir como farsa. A tragédia é contínua.


Burocracia renitente, editorial FSP

 

Cartório no Tribunal de Justiça de São Paulo, em 2011 - Moacir Lopes Junior/Folhapress

Enquanto a digitalização avança nos setores público e privado, simplificando procedimentos e dando celeridade à prestação de serviços, os cartórios permanecem como verdadeiros feudos da burocracia analógica.

Atividades simples demandam tempo e recursos preciosos dos brasileiros, por vezes obrigados a um número de visitas muito acima do razoável para a obtenção de documentos e registros de todo tipo.

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Trata-se de realidade prestes a mudar, caso o Congresso Nacional faça a sua parte. Na semana passada, a Câmara dos Deputados aprovou medida provisória que cria o Serviço Eletrônico de Registros Públicos (Serp), além de alterar diversas leis relacionadas aos cartórios.

Pelo texto, essas entidades têm de, até janeiro de 2023, criar uma plataforma unificada para oferecer serviços digitais à população.

Tal sistema, cabe lembrar, já está previsto em lei desde 2009. Entretanto, como a corroborar a máxima de que por aqui há normas que simplesmente "não pegam", a ausência de critérios claros, bem como de regulamentação, fizeram do diploma letra morta.

A nova plataforma deverá centralizar, simplificar e conservar os registros públicos de todo o país, agilizando a vida de pessoas e empresas hoje forçados no cotidiano a estarem presentes ou serem representadas nos mais de 13 mil cartórios nacionais —dos quais cerca da metade não possui nem sequer uma página na internet.

Por meio do Serp será possível receber documentos e títulos, expedir certidões e fornecer informações eletronicamente. Pais, por exemplo, passarão a poder fazer o registro de um recém-nascido diretamente do hospital ou de casa.

O texto ainda estabelece a possibilidade das assinaturas digitais e dispensa o famigerado reconhecimento de firma para registro de títulos e documentos.

Por fim, estabelece prazos máximos para que os cartórios prestem seus serviços, o que deve minorar o tempo de espera do cidadão, e atualiza a lei sobre incorporação imobiliária, reduzindo os custos envolvidos no processo.

Causa espécie que, diante de tantos benefícios, parte dos cartórios ainda resista à modernização proposta pela MP. O lobby tem atrasado a apreciação do texto, editado em dezembro pelo governo federal.

Agora, transposta a etapa da Câmara, o Senado tem até o fim deste mês para mostrar que está do lado do interesse público.

editoriais@grupofolha.com.br


Roterdã quer fornecer 4,6 mi de toneladas de hidrogênio para Europa; maior parte será importada, EPBR

 O porto de Roterdã, na Holanda, disse nesta terça (10/5) que pode fornecer 4,6 milhões de toneladas/ano de hidrogênio para o noroeste da Europa até 2030. A maior parte desse volume deve vir de outros continentes. 


Cerca de 70 empresas e países exportadores endossaram a oferta ao vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, com base em “projetos específicos e planos realistas, nos quais empresas e países exportadores estão trabalhando agora”, disse a Autoridade do Porto de Roterdã.

A estimativa de 4,6 milhões de toneladas de hidrogênio verde representa pouco mais de um quinto dos 20 Mt previstos no REPowerEU para reduzir a dependência do gás natural, especialmente da Rússia.

O foco da iniciativa está nas importações.

O porto é o maior da Europa, e deve ser porta de entrada do hidrogênio e amônia verdes produzidos no Brasil, por exemplo.

“Países de todo o mundo estão se preparando para esses novos fluxos de energia. O hidrogênio produzido na América Latina ou na Austrália, por exemplo, pode ser enviado para Roterdã com eficiência e em larga escala, processado aqui e depois transportado para o interior”, disse o porto em nota.

O custo de produção de hidrogênio verde (eletrólise com energia renovável) na Europa foi avaliado pela Platts a US$ 11,48/kg em 9 de maio. Em comparação, na Austrália, o valor fica em US$ 2,91/kg, de acordo com a S&P Global Commodity Insights.

A localização também é estratégica para as empresas que estão investindo em parcerias no Mar do Norte para produção em larga escala de hidrogênio a partir de eólica offshore. Muitos previstos para começar a abastecer o mercado entre 2024 e 2026. 

Juntos, esses projetos forneceriam 2,5 GW de energia até 2030 e produziriam 0,25 Mt de hidrogênio verde. 

Segundo o documento divulgado hoje pelo porto, um projeto para produzir hidrogênio de baixo carbono a partir de gás natural com captura de carbono também está em andamento. Isso significaria um total de 0,6 Mt de hidrogênio produzido localmente até 2030.