terça-feira, 12 de outubro de 2021

Vaivém das Commodities - Problema na agricultura não é de oferta, como pensa Bolsonaro, mas de custos, FSP

 Em poucas semanas, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi contestado duas vezes pelos próprios membros do governo a respeito de eventuais dificuldades de o Brasil continuar fornecendo alimentos ao mundo.

Olhando apenas para a política, o presidente ignora a realidade da agricultura. Na primeira vez, na defesa do marco temporal, disse que a ocupação de terras pelos indígenas poderia impedir o Brasil de manter exportações.

A Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) afirmou que o problema do país não é a ampliação de áreas, mas elevar a produtividade no espaço que já está em uso.

Novamente, na questão dos fertilizantes, o presidente volta a alegar um eventual desabastecimento, o que o próprio Ministério da Agricultura nega. Ao contrário, projeta uma safra recorde de grãos.

O Brasil realmente tem um problema na agricultura, que, no entanto, não é de produção, mas de custos. Esses custos, em boa parte, foram trazidos pela própria política econômica do governo, ao provocar uma elevação do dólar.

O Brasil incorporou 11 milhões de hectares na área de grãos nos últimos cinco anos. Na safra 2021/22, deverá ocupar 71,5 milhões de hectares, segundo a Conab. O cenário para 2022, porém, é bem diferente do das safras anteriores, uma vez que as importações de insumos serão recorde e terão custos elevados.

[ x ]

Além da evolução dos preços dos insumos no mercado internacional, os produtores vão sofrer a pressão do dólar valorizado internamente. A desvalorização do real, que favoreceu as exportações e irrigou o bolso dos produtores nos últimos anos, passa, a partir de agora, a ser uma sangria, devido à alta externa dos insumos.

Em setembro do ano passado, os produtores precisavam de 13,2 sacas de soja para comprar uma tonelada de fertilizante. Neste ano, são 21,9 sacas, segundo a MacroSector Consultores.

Esse custo se espalhou para o cultivo de todas as lavouras: milho, algodão, trigo, feijão e outras. Dois produtos tiveram uma relação de troca mais favorável com os fertilizantes: café e cana-de-açúcar, segundo os analistas da consultoria.

Enquanto os preços dos demais produtos se mantiveram estáveis, ou até caíram, os desses dois sofreram forte elevação. Externamente, houve crescimento da demanda. Internamente, seca e geada reduziram a produção.

As importações de fertilizantes de janeiro a setembro já somam 29,1 milhões de toneladas, 18% a mais do que em igual período do ano passado, conforme dados da Secex (Secretaria de Comércio Exterior).

Em dólares, devido à alta dos preços internacionais, a conta deste ano já atinge US$9,3 bilhões, com evolução de 60% em relação a janeiro e setembro de 2020.

A alta externa do preço do fertilizante se deve à demanda mundial maior, a questões políticas internacionais e ao desajuste de produção em regiões importantes.

Entre os principais fornecedores do Brasil estão a Rússia, a China, o Marrocos, o Canadá e a Belarus. Nos últimos cinco anos, o Brasil já importou 153 milhõesde toneladas de adubo.

Alguns nutrientes, como o superfosfato triplo, dobraram de preço no mercado internacional nos últimos 12 meses, segundo a MacroSector.

O crescimento da área explorada pelo país exige tambémo aumento das compras externas de agroquímicos. Nos nove primeiros meses deste ano, as importações somaram 269 mil toneladas, 12% mais do que no período de janeiro a setembro de 2020. Os gastos foram a US$ 2,4 bilhões, com evolução de 9% no período.

A China, os Estados Unidos e a Índia estão entre os principais exportadores para o Brasil. Na América do Sul, os maiores fornecedores são a Colômbia, a Argentina e o Paraguai. Na Europa, a França, o Reino Unido, a Alemanha e a Espanha.

Com isso, os custos da produção agrícola no país mudaram de patamar. Além da pressão de adubos e agroquímicos, os fretes marítimos encarecem ainda mais as importações de insumos.

Internamente, há uma elevação nos custos das máquinas agrícolas, principalmente devido à falta de componentes e ao aumento das matérias-primas usadas na produção desses equipamentos.

Além disso, a crise hídrica aumenta o custo da energia elétrica no campo e dificulta a irrigação, esta essencial na produção de produtos básicos, entre os quais o feijão.

O problema não é apenas o aumento de custos para os produtores, mas apressão que será repassada para o bolso dos consumidores.


Mapa do potássio no Brasil

Perfuração de poços artesianos se multiplica em São Paulo, FSP

 


SÃO PAULO

O Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica), responsável por liberar a perfuração de poços artesianos no estado de São Paulo, recebeu 412 pedidos de outorga em setembro, ante 255 em abril, quando o crescimento começou a acelerar na esteira da crise hídrica.

Para fins de comparação, em setembro de 2020 foram 269 pedidos, e no ano anterior, 126.

No acumulado de janeiro a setembro deste ano já foram 2.750 solicitações. Limeira, Campinas, São Paulo, São José do Rio Preto e Indaiatuba são as cinco cidades com maior número de requerimentos, segundo o Daee.

O presidente da Abas (Associação Brasileira de Águas Subterrâneas), José Paulo Martins Netto, afirma que a demanda por poços artesianos já vinha subindo nos últimos anos, mas se intensificou. Ele diz que não é possível dimensionar o crescimento exato porque muitos poços são perfurados de maneira irregular, sem autorização dos órgãos competentes.

"Quando você faz uso irregular de recursos hídricos, está ferindo legislações das três esferas, federal, estadual e municipal, além de causar dano a quem está regular e não ter controle de qualidade", diz.

com Mariana Grazini e Andressa Motter

Falas antivacina de Bolsonaro atiçaram hesitação, Hélio Schwartsman. FSP

 O único ponto em que o Brasil se saiu bem na pandemia é a disposição da população para vacinar-se. Considerada só a primeira dose, nossa cobertura já ultrapassou a de países que iniciaram a imunização bem antes. Por aqui, 72% da população já levou a primeira injeção. Em Israel, foram 68%; nos EUA, 65%; na Alemanha, 68%. Também estamos conseguindo uma excelente cobertura entre os mais jovens (18 a 24 anos), coorte em que a hesitação vacinal tende a ser maior.

0
Profissional de saúde prepara vacina contra a Covid-19 - Rivaldo Gomes - 13.set.21/Folhapress


A longa tradição do SUS em promover campanhas universais e gratuitas de imunização contra as mais variadas moléstias em várias faixas etárias decerto tem algo a ver com a alta confiança do brasileiro em vacinas. Houve, porém, um instante em que tivemos motivos para temer que o desfecho seria diferente. Em dezembro passado, o Datafolha registrava que 23% dos brasileiros não pretendiam vacinar-se contra a Covid-19. Em maio (dado mais recente), esse número havia caído para 8%, o mesmo registrado em agosto do ano passado, que podemos considerar uma espécie de taxa basal.

Por que dezembro está tão fora da curva? Tenho minha hipótese: foi entre outubro e janeiro que o presidente Jair Bolsonaro intensificou seus ataques contra as vacinas. É desse período que brotaram pérolas como “o povo brasileiro não será cobaia”, “se tomar e virar um jacaré, é problema seu”. Foi também nesse interstício que o presidente quase celebrou a morte de um voluntário que participava dos testes da Coronavac. Vale lembrar que o Bolsonaro que disse essas “defaecationes” (por pudor, uso o latim) não era um Bolsonaro qualquer, mas o que vivia o auge de sua popularidade, em parte graças ao auxílio emergencial de R$ 600.

Se a hipótese é correta, dá para concluir que as bobagens proferidas pelo primeiro mandatário produzem consequências. O lado bom é que, à medida que seu governo vai se revelando o desastre que é, ele passa a ser menos ouvido.

helio@uol.com.br