O único ponto em que o Brasil se saiu bem na pandemia é a disposição da população para vacinar-se. Considerada só a primeira dose, nossa cobertura já ultrapassou a de países que iniciaram a imunização bem antes. Por aqui, 72% da população já levou a primeira injeção. Em Israel, foram 68%; nos EUA, 65%; na Alemanha, 68%. Também estamos conseguindo uma excelente cobertura entre os mais jovens (18 a 24 anos), coorte em que a hesitação vacinal tende a ser maior.
A longa tradição do SUS em promover campanhas universais e gratuitas de imunização contra as mais variadas moléstias em várias faixas etárias decerto tem algo a ver com a alta confiança do brasileiro em vacinas. Houve, porém, um instante em que tivemos motivos para temer que o desfecho seria diferente. Em dezembro passado, o Datafolha registrava que 23% dos brasileiros não pretendiam vacinar-se contra a Covid-19. Em maio (dado mais recente), esse número havia caído para 8%, o mesmo registrado em agosto do ano passado, que podemos considerar uma espécie de taxa basal.
Por que dezembro está tão fora da curva? Tenho minha hipótese: foi entre outubro e janeiro que o presidente Jair Bolsonaro intensificou seus ataques contra as vacinas. É desse período que brotaram pérolas como “o povo brasileiro não será cobaia”, “se tomar e virar um jacaré, é problema seu”. Foi também nesse interstício que o presidente quase celebrou a morte de um voluntário que participava dos testes da Coronavac. Vale lembrar que o Bolsonaro que disse essas “defaecationes” (por pudor, uso o latim) não era um Bolsonaro qualquer, mas o que vivia o auge de sua popularidade, em parte graças ao auxílio emergencial de R$ 600.
Se a hipótese é correta, dá para concluir que as bobagens proferidas pelo primeiro mandatário produzem consequências. O lado bom é que, à medida que seu governo vai se revelando o desastre que é, ele passa a ser menos ouvido.
helio@uol.com.br
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