sábado, 22 de maio de 2021

Técnica pode acelerar replantio de árvores em área da lama de Brumadinho (MG), FSP

 20.mai.2021 às 23h15

BELO HORIZONTE

Uma técnica desenvolvida pela UFV (Universidade Federal de Viçosa), em Minas Gerais, pode reduzir em até oito vezes o tempo para início da recuperação da área destruída pelo rompimento da barragem da mineradora Vale em Brumadinho, na Grande Belo Horizonte. A técnica prevê a utilização de vegetação que existia na região.

A barragem B1 da mina Córrego do Feijão se rompeu em 25 de janeiro de 2019 e resultou na morte de 270 pessoasOnze vítimas ainda não foram localizadas. A lama que desceu da estrutura atingiu áreas de mata atlântica e chegou ao rio Paraopeba, em um dos maiores desastres ambientais do país.

O Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) calculou em 269,94 hectares a área destruída. A Vale afirma que com o rompimento foram impactados diretamente 132 hectares de floresta.

Três homens com enxadas em meio a vegetação em Brumadinho
Funcionários da Vale plantam muda "copiada" em Brumadinho (MG) - Vale/Divulgação

A primeira etapa do trabalho dos pesquisadores da UFV foi colher amostras do DNA de espécies vegetais na área atingida que sobreviveram ao tsunami de lama.

“Em parceria com a Vale, resgatamos o DNA de espécies importantes na estrutura das florestas da região", afirma oGleison dos Santos, professor do Departamento de Engenharia Florestal da UFV.

Foram coletados DNA de jacarandá, caviúna, ipê amarelo, braúna e jequitibá. A técnica prevê a produção de cópias das plantas para garantir que não haja perda de constituição genética. Ao todo foi recolhido material de dez espécies vegetais.

"Mudas que poderiam levar mais de oito anos para florescer devem iniciar esse processo em entre 6 e 12 meses, o que contribuirá efetivamente para acelerar a recuperação da biodiversidade da região", afirma a mineradora. Segundo a Vale, a técnica já começou a ser utilizada para a reabilitação florestal da área e a previsão é que sejam plantadas 5.000 mudas "copiadas" nos próximos três anos.

Segundo Santos, porém, a recuperação pode ser ainda mais rápida do que a prevista pela Vale. O especialista afirma que os clones das árvores poderão florescer com um ano, ante dez anos de suas matrizes naturais.

A técnica desenvolvida pela Universidade Federal de Viçosa foi criada para salvar espécies com risco de extinção ou, ainda, para recuperação de áreas degradadas por desastres ambientais.

"O primeiro passo é ir à área atingida e identificar as árvores danificadas que correm o risco de morrer. Coletamos um pedaço de mais um menos 20 cm da copa dessa árvore e levamos para o laboratório", relata o professor. A partir desse momento, o DNA da espécie é identificado. O laboratório funciona acoplado a uma estufa.

Uma série de hormônios de crescimento é injetada na planta que, com tempo entre 6 e 8 meses, é levada para a área em que será colocada no solo. "Uma árvore plantada normalmente, para cumprir sua função máxima na natureza, florescendo e deixando semente, levaria até dez anos. Com essa técnica, o tempo é de um ano", afirma o professor.

Segundo o representante da UFV, um percurso de 150 km ao longo do rio Paraopeba, entre Brumadinho e Pompéu, na Região Central de Minas Gerais, área atingida pela lama da Vale, passará por recuperação utilizando o processo desenvolvido pela escola.


Bolsonaro é o grande padrinho do encontro entre FHC e Lula, FSP

 Bruno Boghossian

BRASÍLIA

Às vésperas do segundo turno de 2018, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) conversou por telefone com o então presidenciável Fernando Haddad (PT). O tucano fez uma defesa enfática da democracia, mas não se comprometeu a apoiar publicamente a candidatura do petista. Anos depois, FHC admitiu ter anulado o voto naquela disputa.

Dois anos e meio de Jair Bolsonaro (sem partido) no poder foram o bastante para mudar esse cenário.

Em entrevistas recentes, FHC disse que votaria no PT para evitar a reeleição do atual governo e, na última semana, se reuniu com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, num encontro que foi divulgado com certo orgulho pelo petista.

Bolsonaro é o padrinho involuntário dessa peça de propaganda política. A conduta do presidente fez com que as tímidas ressalvas ao capitão reformado que alguns líderes políticos apresentaram na última campanha se transformassem em rejeição.

Os ex-presidentes FHC e Lula em encontro na casa do ex-ministro Nelson Jobim - Ricardo Stuckert/Divulgação

O encontro carrega sinais importantes sobre a dimensão que o antibolsonarismo pode tomar na corrida de 2022.

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Se essa força foi suficiente para reunir a dupla de ex-presidentes e fazer com que um tucano histórico admita votar no maior símbolo do petismo, ela também pode ganhar carga razoável para barrar a reeleição do presidente.

A reunião Lula-FHC traduz uma convergência em torno do antibolsonarismo e evidencia uma convivência civilizada entre adversários políticos, mas seria ingenuidade interpretá-la como lançamento de uma engenharia eleitoral única para 2022.

Prova disso é a resposta do PSDB, que disse ser preciso "evitar sinais trocados" e pareceu incluir o petista, equivocadamente, numa categoria que chama de "os extremos". O discurso serve a líderes tucanos que temem ser engolidos pela presença resistente do bolsonarismo no eleitorado de direita.

Muitos deles se serviram do antipetismo para chegar ao poder e pegaram carona na força do capitão reformado em 2018 —caso do governador paulista João Doria (PSDB). É natural, portanto, que nomes do partido rejeitem a impressão de que se tornaram aliados de Lula.

O próprio Fernando Henrique apresentou os limites políticos da fotografia com o petista. Após a divulgação do encontro, ele falou em "evitar más interpretações" e declarou que apoiará o candidato do PSDB no primeiro turno. Admitiu votar em qualquer um que se opuser a Bolsonaro no segundo turno, "mesmo o Lula".

Continua, portanto, a ser um devaneio o projeto de uma frente ampla para a largada da corrida de 2022, com o objetivo de derrotar o atual presidente. O que se enxerga, mais do que alianças formais, é uma convergência natural para o segundo turno, movida pelo antibolsonarismo —o que não é pouca coisa.

A reação imediata de aliados de Bolsonaro mostra o caminho que o presidente deve seguir para se opor a concertações desse tipo. O vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos) recorreu a lemas da antipolítica, igualou Lula a FHC e afirmou que os dois fatiam a democracia entre si.

Apesar disso, o repertório bolsonarista, conhecido de 2018, pode não ter o mesmo efeito em 2022. O presidente usará o figurino antissistema contra seus opositores, mas não conseguirá esconder o fato de que se sentou à mesa com o centrão para governar e terá o apoio de parte das siglas do bloco na campanha à reeleição.

A fotografia com FHC é melhor para Lula do que para os tucanos e genéricos que reivindicam o selo da "terceira via". A grande esperança desse grupo era a perspectiva de uma suposta polarização entre o petista e Bolsonaro para levar o eleitorado a buscar um caminho alternativo, mais moderado.

Mas o encontro tem um efeito inicial moderador para Lula. A imagem da conversa com um personagem identificado com a centro-direita não vai descarregar votos simpáticos ao PSDB em sua candidatura já no primeiro turno, mas abre caminho para que ele neutralize parte de sua rejeição entre esses eleitores no segundo turno.

Essa impressão ganha peso se Lula mantiver nas pesquisas um desempenho que o aponte como o candidato mais forte num embate direto com Bolsonaro no segundo turno. O principal desafio do ex-presidente será amenizar o antipetismo e conter a onda de rejeição que provocou uma adesão em massa ao capitão reformado em 2018.

Além do fator simbólico, o encontro Lula-FHC tem peso político porque mexe com dois dos principais sentimentos da política brasileira atual: o antibolsonarismo e o antipetismo. O tamanho de cada um deles deve definir o resultado da próxima eleição.

Hélio Schwartsman Turismo vacinal, FSP

 Façamos um experimento mental. Um laboratório multinacional desenvolveu um novo medicamento que cura um tipo comum de câncer até então letal. O problema é que a farmacêutica cobra US$ 10 milhões pelo tratamento.

O Brasil já quebrou a patente da nova droga. Mas, como não podemos sequestrar e torturar os cientistas estrangeiros para que nos ensinem a produzi-la, ainda levará um tempo até que ela esteja à disposição dos usuários do SUS e de planos de saúde --um tempo que o paciente de câncer não tem.

Seria ético impedir um milionário brasileiro de viajar para fora do país para ter acesso ao remédio? E que tal exigir que ele deposite na conta do SUS o valor de um tratamento para deixá-lo sair do Brasil?

Se você, leitor, classifica como eu o primeiro cenário como violação a direito fundamental e o segundo como chantagem, então deve, como eu, ter ficado chocado com a argumentação dos que afirmam que o chamado turismo vacinal (viajar para fora do país para receber o imunizante alhures) é antiético.

Eu compreendo o sentimento. Todos nós temos um pouco do espírito de justiceiro, que se revolta contra diferenças muito gritantes no acesso a tratamento médico, comida, riquezas etc. Eu não sou exceção e me prontifico a integrar o pelotão de fuzilamento de todos aqueles que furarem a fila da vacina do SUS (atenção, contém ironia: na verdade, não sou a favor de pelotões de fuzilamento). Mas não vejo como estender o instinto de equanimidade para além da jurisdição que lhe é própria, que são as vacinas do Programa Nacional de Imunizações (PNI).

Isso é ainda mais verdade quando se considera que o sujeito que toma a vacina em outro país, ao contrário do milionário que busca o tratamento contra o câncer, dá uma contribuição, ainda que marginal, à saúde pública nacional, já que ele reduz sua probabilidade de espalhar o vírus e deixa de ocupar um lugar na fila do PNI.