sábado, 5 de setembro de 2020

Accor quer colocar sua marca em hotéis independentes no pós-crise, Painel ,FSP

 SÃO PAULO

O feriado de 7 de Setembro e os últimos finais de semana levaram otimismo à hotelaria, mas a situação ainda é delicada, segundo Patrick Mendes, presidente da Accor América do Sul.

Ele avalia que o setor ainda pode levar 12 meses para superar a pandemia, mas depois terá oportunidades. A ree, que é dona de marcas como Ibis e Mercure, estuda converter hotéis independentes em suas bandeiras nos pós crise.

Patrick Mendes, presidente da rede Accor de hotéis - Marcus Leoni/Folhapress

Como está a retomada do mercado hoteleiro? Agora 80% dos hotéis estão abertos. É uma fase mais otimista. O feriado [7 de Setembro] está dando bons resultados. Muitos hotéis estão chegando na lotação máxima autorizada, que é de mais ou menos 50%.

Por outro lado, ainda estamos cautelosos. Muitos clientes ainda estão na dúvida sobre viajar. Temos nos esforçado para explicar os protocolos de sanitização e mostrar que é seguro se hospedar. Esse protocolo, uma vez que se habitua a ele, é tranquilo.

As pessoas vão ter de se acostumar porque vai demorar. Não vai parar daqui a cinco meses. Temos de aceitar. Vamos ter de conviver com máscaras e distanciamento mesmo que a vacina chegue no fim do ano. Antes de termos todas as pessoas protegidas, vai demorar 12 ou 14 meses.

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Qual área está voltando melhor? A de viagens a lazer ou negócios? O lazer está voltando com mais força e não tem viajante internacional. No Brasil, quase 100% do turismo é local, então, não é dramático. A taxa de internacional no Brasil já é muito baixa.

Eu prefiro estimular os brasileiros que costumavam viajar para fora, Miami e Paris, gastando bastante dinheiro.

Essas pessoas não vão poder viajar para fora, ou porque o câmbio ficou caro ou porque não vão querer correr risco de viajar e ficar bloqueadas em procedimentos por causa do coronavírus. Esse novo lazer pode impulsionar o turismo brasileiro.

E as viagens de negócios? O que não está voltando com força é o corporativo. Esse vai demorar um pouco e vai ser substituído parcialmente por esse lazer que está voltando. Mesmo que em algumas cidades tenhamos agropecuária, óleo e gás já retomando, o volume ainda é mais baixo.

No começo da pandemia vocês lançaram alternativas como o room office. Como foi o desempenho? A pandemia nos obrigou a achar novas alternativas para os nossos hotéis. Retiramos a cama e colocamos mesa de trabalho em alguns dos quartos. Decidimos expandir isso. Hoje, temos mais de 80 hotéis no Brasil com o room office e vamos continuar fazendo.

E a participação disso no faturamento da empresa é relevante? Por enquanto é o início. Só agora estamos reabrindo a maioria dos hotéis. Em um hotel de 200 quartos, dá 5% a 7% do volume transformado em escritório. Mas acho que não é temporário.

Para os próximos anos, podemos imaginar que os hotéis terão, além dos quartos, alguns escritórios e espaços de coworking. Quem sabe, 15% a 20% da receita de um hotel virá de outra coisa que não existia no passado.

Como está a ocupação hoje? Quanto deveria estar nessa época do ano? Está na faixa de 20%. Deveria estar 60% mais ou menos. Alguns hotéis no Nordeste, no Norte, no Rio, no Sul, estão com bons finais de semana. Mas a realidade é que o turismo ainda está em situação delicada e vai precisar, nos próximos 6 a 12 meses, de uma ajuda com isenção de encargos, linhas de crédito facilitadas e desoneração da folha de pagamento.

Vocês estão negociando com os governos para pedir? Estamos com um movimento bastante forte, com as associações que nos representam, e eu próprio estou bastante ativo para explicar que isso está acontecendo no resto do mundo inteiro.

Está se chegando a 30% ou 40% de ocupação e não voltou completamente. Nós somos otimistas. Depois do remédio, da vacina, vai voltar com muita força. Mas para passar a fase mais difícil, vamos precisar de ajuda.

Algum hotel de vocês vai ser fechado definitivamente por causa dessa crise? Alguns hotéis já estavam com dificuldade, no limite de virar apartamentos. A pandemia acelerou o processo. Mas todos os hotéis importantes do grupo continuam. Fechamos, colocamos as pessoas em suspensão, tivemos que desligar, infelizmente, alguns colaboradores, mas estamos reabrindo.

Estamos, aos poucos, recrutando de novo as pessoas. Nos hotéis em construção, tivemos alguns atrasos nas obras, mas eles vão abrir daqui a cinco meses, em vez de abrir agora.

Não tenho hotéis significativos que vão fechar. Pelo contrário. A Accor atrai hotéis independentes, que vão precisar de ajuda. Estamos vendo potenciais conversões de hotéis independentes que vão precisar de uma marca, de um programa de fidelidade, e vão se juntar a nós.

Então a Accor espera converter hotéis que vão sair da crise com dificuldade para colocar suas marcas? Temos 50 marcas no mundo. Aqui temos cerca de 20, que vão de super luxo a supereconômico. E tem muitos hotéis sem marca, que são bons, mas que não têm a distribuição e os protocolos operacionais bem estruturados, nem a capacidade de compra que tem a Accor.

A crise é violenta, mas nós acreditamos que o país tem potencial e vai voltar com força. Já está acontecendo.

Painel S.A.

Jornalista, Joana Cunha é formada em administração de empresas pela FGV-SP. Foi repórter de Mercado e correspondente da Folha em Nova York.

Montes e montes de embalagens, Celso Ming, O Estado de S.Paulo


04 de setembro de 2020 | 19h35

Estamos sendo soterrados por embalagens. Quem não havia se dado conta disso antes passou a se dar depois destes seis meses de confinamento, situação que passou a exigir higienização extra, após cada compra de supermercado.

Como contribuir para o correto descarte dessa montanha de plásticos, de tetra pak, papelão, cartolinas e de recipientes de vidro quando as circunstâncias não ajudam, quando não se pode contar com um mínimo de consciência ambiental e quando se sabe que, desde 2010, quando foi aprovada a Política Nacional de Resíduos Sólidos, a reciclagem do lixo no Brasil – e não só de embalagens – não passa dos 3% ou 4%?

Toda reciclagem passa pela coleta, pela triagem e pelo reprocessamento – o que só marginalmente acontece no Brasil. Para além das embalagens, materiais como papel e papelão têm 52,3% de recuperação, conforme mostram os números da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza e Resíduos Sólidos (Abrelpe). O plástico – existem pelo menos sete tipos diferentes – fica nos 8,2%. Somente o alumínio, utilizado em latinhas de cerveja e refrigerante, alcança bom índice: chega a 87,2%.

A necessidade de conservação dos produtos e, também, as razões de segurança impedem forte redução do uso de embalagens. Com a grande maioria delas, não se pode dar o mesmo tratamento dispensado aos canudinhos e, em menor escala, às sacolas plástico, considerados vilões do meio ambiente, porque têm vida útil curta, mas, se descartados na natureza, têm durabilidade que se conta em séculos.

Cortar excessos, reduzir a gramatura do papel, deixar o produto mais leve ou trocar plástico por outro material são opções sempre lembradas, mas de implementação complicada. A diretora executiva da Associação Brasileira de Embalagens (Abre), Luciana Pellegrino, observa que, em geral, mudanças de embalagem implicam alterar toda a cadeia de logística e substituir os protocolos de segurança. A própria reciclagem produz impacto ambiental. Todo o reprocessamento queima óleo diesel no transporte dos materiais e consome enormes quantidades de água doce e de energia elétrica.

Certas iniciativas vão no caminho correto, mas têm alcance limitado. No final de agosto, a empresa de cosméticos Natura se propôs a atuar no aumento do nível de consciência e na educação pela reciclagem. As lojas do grupo, junto com as da The Body Shop, passaram a dispor de pontos de coleta. Cada conjunto de cinco embalagens dará direito a um produto ainda a ser anunciado. “Educar o cliente é oportunidade de aumentar a reciclabilidade e o descarte responsável”, argumenta Denise Hills, diretora de Sustentabilidade da Natura.

Reciclagem
Trabalhador chinês recicla garrafas de plástico na aldeia de Xiao Dong Kou, nos subúrbios de Beijing. Foto: Fred Dufor / AFP

Mas o processo de educação do consumo é complexo. Como conseguir que pessoas simples consigam distinguir vidros e plásticos recicláveis dos não recicláveis? Como exigir lavagem prévia em famílias que nem dispõem de água encanada em casa?

O processo de revisão da cadeia de logística, por outro lado, envolve pesquisa, custos adicionais e, mais importante, o engajamento do consumidor.

A startup brasileira Eureciclo, fundada em 2016, se propõe a atuar nesse processo. Ao analisar as notas fiscais eletrônicas emitidas pelas empresas, ela certifica as cadeias de logística reversa e inclui o selo “Eu Reciclo” na embalagem para quem está de acordo com as necessidades do Planeta. Para garantir o selo, a startup utiliza a compensação ambiental, similar à adotada no mercado europeu de carbono, para gerar créditos para quem atinge a meta prefixada. A não observância das regras implica necessidade de compra de créditos de outra empresa. No longo prazo, é incentivo para gerar mudanças na cadeia e, ao mesmo tempo, garantir caixa para quem a cumpre. 

“Sobrar embalagem é uma externalidade negativa. Catadores e operadores de triagem, ao reciclarem, geram uma externalidade positiva, por exemplo”, observa Marcos Matos, diretor de marketing da Eureciclo. “Quem gerou a externalidade negativa deve pagar por ela e o elo positivo deve receber uma recompensa em dinheiro, e não só ganhar pelo material que recicla.”

Kin Honda, consultor da Ernst & Young, adverte que só haverá resultados se governo, consumidor e empresas se empenharem em colocar em prática a Política Nacional de Resíduos Sólidos. / COM GUILHERME GUERRA

Aquela mansão em Angra, Por Carlos Alberto Mattos do site Carta Maior

  

Esquecendo - como devemos - José Padilha, eis que a quase falida Lava Jato chega aos cinemas pelas mãos improváveis de Sandra Kogut. A ação de Três Verões se passa entre 2015 e 2017, quando a operação fez prisões e conduções coercitivas espetaculosas. Apesar de negado pela diretora, a inspiração parece ter vindo diretamente do caso Sérgio Cabral.

Em dezembro de 2015, Edgar (Otávio Muller), que tanto pode ser um financista como um político, recebe telefonemas inquietantes em sua mansão de Angra dos Reis. Um ano depois, ele está preso e não pode mais fazer uso de sua lancha nem cuidar do pai idoso (Rogério Fróes). No Natal de 2017, ouve-se dizer que ele vai migrar para a prisão domiciliar. Já então a realidade de sua casa de praia é inteiramente diferente.

No decorrer desses dois anos, a gestão do patrimônio foi assumida pela caseira Madalena (Regina Casé), uma empreendedora nata. Ela o faz à sua maneira, dando corda para transformar o que parecia um drama de classes numa comédia política mordaz. Regina retoma um bocado da verve da Val, de Que Horas Ela Volta, mas numa chave distinta. Seja ao estranhar o valor conferido a uma escultura de Tunga, seja ao guiar um tour pelas casas dos milionários presos em Angra, Madá sustenta um fairplay que a torna superior a todo o seu entorno.



A luta de classes fica no segundo plano, dando lugar a um saboroso deboche popular. Os empregados se apoderam dos bens patronais sem nenhuma intenção revolucionária, mas como um divertido interlúdio em que convertem os valores burgueses ao seu sentido mais prosaico. O contraponto de tudo isso é a relação carinhosa entre a caseira e o velho patriarca, amargurado pela desgraça do filho. Essa ligação reúne dois polos extremos, mas que se encontram numa certa área de inocência perante o circo da corrupção e do lava-jatismo.

Três Verões é naturalmente dominado pela expansividade de Regina Casé, senhora absoluta das minúcias da personagem. O papel é francamente cômico até perto do final, quando Sandra Kogut lhe reserva um solo de grande envergadura dramática. Também aí ela se sai magistralmente, embora não evite o tom um pouco piegas do desnudamento lacrimejante. É uma pena também que roteiro e montagem patinem sem ritmo ou maior interesse no terceiro módulo, quando a casa é usada como cenário de filmes publicitários.

A fotografia de Ivo Lopes Araújo (Campo Grande, Greta e muitos bons filmes de várias regiões do país) capta um litoral fluminense chuvoso e cinzento, pouco condizente com o que se espera dos verões. Nesse tom menor, deixando os eventos mais "quentes" apenas insinuados nas grandes elipses temporais, o filme acaba mostrando, com boa dose de ironia, como a alienação do trabalho pode ser revertida na criação de insuspeitadas oportunidades.